A cenoura parece suculenta e deliciosa, mas…, por Fábio de Oliveira Ribeiro

A cenoura parece suculenta e deliciosa, mas…

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Um dos elementos mais importantes da campanha eleitoral de Jair Bolsonaro é a defesa intransigente da Ditadura Militar formalmente encerrada com a promulgação da CF/88. O candidato do PSL chegou a dizer que o Brasil deve voltar a ser como era há 50 anos. Em 1968 a repressão política havia se tornado crescente e impiedosa e já começava a fazer cadáveres. Foi nesse contexto que os tiranos fardados promulgaram o AI-5 escancarando a verdadeira natureza do regime ditatorial que até então havia sido uma “ditadura envergonhada” como disse Elio Gaspari.

Além de contradizer os fundamentos do regime político tolerante que possibilitou a ele se candidatar à presidência, o saudosismo de Jair Bolsonaro ironicamente comprova uma das teses de Marcuse. Afinal, nesse momento a “…sociedade [brasileira] luta contra a possibilidade nela contida de sua libertação.” (Marcuse – Vida e Obra, Francisco Antonio Doria, José Alvaro Editor, São Paulo, 1983, p. 235).

O regime militar foi um produto típico da paranoia da Guerra Fria. Esse fenômeno, que provavelmente presidiu a formação militar de Jair Bolsonaro, foi largamente empregado pelos EUA e pela URSS tanto para mobilizar internamente seus cidadãos quanto para construir alianças externas mediante interferências políticas e/ou militares, diretas ou indiretas, nos países considerados satélites, vassalos ou dependentes.

A dependência externa do Brasil justificou internamente a construção de uma sociedade autoritária. Entretanto, ninguém poderia dizer há 50 anos que o autoritarismo era algo novo na realidade brasileira. Na verdade, não podemos afirmar que ele tenha sido substituído por uma civilidade tolerante e inclusiva após a promulgação da CF/88. Afinal, nas favelas das principais cidades brasileiras o tratamento dispensado pelas PMs aos negros, brancos e mestiços pobres continuou sendo brutal e, inclusive, letal.

Os traços bestiais do arcaísmo colonial que ajudaram a construir a Ditadura Militar e que sobreviveram ao fim dela podem ser encontrados nos discursos de Jair Bolsonaro e dos futuros ministros dele. O general cotado para ser o novo Ministro da Educação quer separar pobres e pretos dos demais estudantes. No imaginário dele o sistema público de educação precisa ser purificado para que a sociedade brasileira possa voltar a funcionar exatamente como era durante o período colonial.

Exclusão racial e econômica programática e definitiva. Hierarquia social rígida e imposta mediante repressão permanente. Os ideólogos do novo regime querem superar os dois fundamentos ideológicos que ajudaram a construir alguma coesão social no século XX: a valorização da miscigenação biológica e cultural (Gilberto Freyre) e o mito da cordialidade brasileira (Sérgio Buarque de Holanda).

Muito mais diversificado, populoso, heterogêneo, globalizado e rico do que em 1968, o Brasil está prestes a dar um salto para o passado. Mas isso não conseguirá transportar nosso país para o futuro como imaginam os defensores de Jair Bolsonaro. O vice dele disse que o Brasil deveria se unir aos EUA e não à mulambada da África e da Ásia. Além de ignorar um fato trivial (os norte-americanos protegem sua agricultura e não precisam importar do nosso país os produtos que nós exportamos para nossos parceiros africanos e asiáticos), o general Mourão é vítima de uma ideologia que não corresponde mais à realidade.

Na década de 1960 a participação do PIB dos EUA no PIB mundial era muito maior do que é hoje. Não só isso, a importância industrial, tecnológica, econômica e comercial da China está crescendo https://infogram.com/share-of-world-gdp-throughout-history-1gjk92e6yjwqm16. Há 50 anos os norte-americanos eram auto-suficientes, hoje eles dependem tecnologicamente da Rússia para colocar foguetes em órbita. O Pentágono comanda uma imensa máquina de guerra, mesmo assim não conseguiu destruir o regime político da Síria. É muito improvável que os norte-americanos tentem usar a força bruta para neutralizar as ambições econômicas da China e da Rússia.

A imprensa internacional isolou o Brasil em razão do golpe de 2016. Jair Bolsonaro tem sido considerado um perigo para a democracia brasileira pelos principais jornais europeus e norte-americanos. A eleição dele não contribuirá nada para melhorar a imagem do nosso país no exterior. Portanto, são ilusórios os lucros que os apoiadores dele imaginam poder auferir com um regime neoliberal autoritário. À medida que a participação do PIB brasileiro no PIB mundial declinar até mesmo os empresários que apoiam Jair Bolsonaro ficarão mais pobres. E isso ocorrerá mesmo que eles se sintam mais ricos em relação aos “outros brasileiros” (aqueles que o novo regime promete excluir do orçamento e reprimir militarmente).

Um asno faminto pode até caminhar tentando devorar a cenoura que o cavaleiro pendurou numa vara em frente aos olhos dele. Mas o resultado desta caminhada será um aumento da fome e não o fim dela. No contexto brasileiro atual é difícil dizer quem será a montaria e quem será o asno, mas o papel da cenoura me parece evidente: o imenso tubérculo transgênico será inevitavelmente enfiado nos rabos dos amigos do candidato a tirano. No futuro eles não conseguirão mais se libertar do passado, nem do incomodo anal que escolheram impor a si mesmos. 

 
Fábio de Oliveira Ribeiro

7 Comentários

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  1. Pro andar de baixo da

    Pro andar de baixo da sociedade, nunca houve a ideia de igualdade. É só ver como um policial trata um jovem pego usando drogas em perdizes e jovem pego usando drogas no Campo Limpo. O que uma parte da elite faz é usar esse tratamento dados aos pobres aos seus inimigos políticos da ocasião. Durante o regime militar, a tortura costumeira usado contra os pobres pegos pela polícia passou a ser usado contra jovens, grande parte de classe média, que foram presos como inimigos políticos. Hoje quem faz esse serviço é o judiciário = usam as arbitrariedades que os pobres conhecem de cor e salteado ( como boa parte dos presos pobres que ficam anos nas masmorras chamadas presídeos) e aplicam aos que têm uma visão de país oposta a deles. O caso mais terrível é o de Lula – preso antes de chegar a última instância do judiciário. 

  2. Noves fora… nada…
    Texto cheio de incorreções graves:
    Regimes autoritários, que nunca podem ser considerados unicamente militares, mas sim civis militares, não são resultado ou invenção da chamada guerra fria, se entendermos aquele processo de atrito geopolítico global a partir das tensões pós II Guerra.
    A Europa já os tinha experimentado com Franco, Hitler e Mussolini… assim como o Brasil de Vargas.
    Já o desentendimento sobre a obra de Freire e Holanda dá até vergonha alheia…
    O primeiro já foi suficientemente destroçado por tentar dar cores amenas e consensuais ao processo de estupro racial que ele chama candidamente de miscigenação e que isso seria um fator positivo de nossa “democracia racial”, como se a relação entre donos de escravos e escravas ou de patrões e domésticas se dessem em condições simétricas e onde a subordinada fosse dada alguma escolha…
    No caso de Holanda é mais grave… mas sejamos justos… até hoje muita gente não entendeu que a cordialidade (derivado do francês couer) nada tem a ver (apenas) com gentileza… mas sim com nossa incapacidade de maturar formalidades e instituições que dão sentido a vida em sociedade… escolhemos a relação privada e hierarquizada a formalidade isonomica…

    O resto nem merece atenção… é só mais lenga lenga…

    1. A ditadura militar iniciada

      A ditadura militar iniciada em 1964 não foi identica aos regimes nazifascista dos anos 1930. A Guerra Fria posterior a II Guerra Mundial não existia antes dela. Portanto, você confunde uma doença com outra e o dignóstico que você fez está inevitavelmente errado. 

      Quem disse que Gilberte Freyre e Sérgio Buarque de Holanda estabeleceram as bases teóricas que possibilitaram a coesão social no Brasil durante o século XX foi Jessé Souza. Você obviamente ignora a tese central da obra “A tolice da inteligência brasileira”. Sua tolice evidente é amplificada por sua incapacidade de interpretar textos.

      Lenga, lenga, meu caro, é uma expressão que poderia ser usada para descrever seu comentário. Entretanto, para escrever uma lenga lenga é preciso duas coisas: capacidade de argumentar e estilo.

      Sua capacidade de argumentar é limitada; seu estilo é mediocre. A única coisa que você sabe fazer é cacarrejar. 

      Continue cacarejando. No país das abobrinhas bolsonarianas as galinhas a serviço do candidato a ditador são absolutamente livres. Em algum momento elas serão depenadas, mas esse é um assunto que não me interessa nesse momento.

       

       

      1. Bem… bem… bem… mas onde
        Bem… bem… bem… mas onde está escrito por mim que tais regimes são idênticos? Isso seria uma impossibilidade histórica!
        Mas eles comungam o cerne ou seja: o rompimento da chamada farsa liberal (que você gosta de se auto enganar e chamar de democracia) com a instituição de regimes autocráticos.
        Daí a impropriedade (histórica ) de dizer que a guerra fria eu azo a regimes militares…
        A desculpa ideológica da luta anticomunista (como a tolice atual do anti petismo) foi só cortina de fumaça para uma disputa dentro do ventre capitalista… ou seja, impedir na época, como em 2011, que surgissem novos blocos de nações que quesionassem o eixo Europa EUA…
        Em resumo:manter a periferia onde ela sempre esteve…

        Quanto a Jessé de Souza eu esperava que você fosse usar esse tipo de Leandro Karnak da sociologia como muleta…
        Ora… se arrume meu caro… Jessé é no bonzinho… mas cedo ou tarde vamos entender que ele não está muito longe da piada Roberto damatta…embora esse ultimovseha (argh) antropólogo…

        Use alguma coisa sua… citar orelhas de livro que nem leu (e se leu nada entendeu) não vai te conferir erudição.. assim como fazer ameaças e xingamentos não vai fazer parecer um macho alfa intelectualizado…

        Esse é o adevogado que esperava conseguir um hc para Lula…. rsrsrs… será que é por isso que ele ainda tá preso?

        Desculpe… mas você é muito fraquinho…

          1. Noves fora… nada…
            Tens razão… diante da sua falta de argumentos, quem sabe temos mais sucessos com as galinhas…?

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