Por que o setor elétrico impacta no pensionista privado?

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Recentemente, o Instituto Acende Brasil, de São Paulo, publicou, em seu sítio eletrônico, o “White Paper n. 13 – Aprimoramentos para o Setor Elétrico: Propostas aos Candidatos (Mandato: 2015-2018)”. Em suas sessenta páginas, observa-se um enorme esforço para colocar em palavras acessíveis as questões mais significativas que estão envolvidas no maltratado setor elétrico brasileiro – e que parece que foram ignoradas nos últimos anos. Para agregar ainda mais um ingrediente à discussão, a Folha de São Paulo noticiou, no último dia 12, que é o consumidor quem vai arcar com o custo da ajuda às distribuidoras de energia elétrica, de R$ 1,2 bilhão, tendo em vista a dificuldade que as distribuidoras estão enfrentando para suportar o custo extra das termelétricas.

O futuro parece antever uma realidade distópica para o setor energético nacional. Mas não é para os consumidores que aqui se chama a atenção do leitor, mas sim aos pequenos investidores no setor elétrico no mercado de capitais, ainda que sejam de forma indireta e sem a ciência desses tempos difíceis que nos aguardam.

Desde seu lançamento, em agosto de 1996, o Índice de Energia Elétrica (IEE), da BM&FBOVESPA, registra, dentre outros dados importantes, a taxa média de crescimento do setor de energia elétrica no mercado de capitais. O gráfico elaborado com os índices de cada ano é autoexplicativo: pode-se notar que, no final do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, houve um rigoroso programa de racionamento a fim de se evitar o colapso do sistema, o qual perdurou até início de 2002. Naquele período (e mais especificamente em 2001 e 2002), os preços das ações componentes do IEE diminuíram, na média, recuperando-se significativamente em 2003. Nova queda pôde ser observada em 2008, em meio à crise internacional, e nos últimos anos, desde 2012. Fato incontestável é que as ações das empresas de energia elétrica, em geral, vêm perdendo o status de seguras ou defensivas desde pelo menos 2012, segundo constatado por André Rocha no Valor Econômico (“Setor elétrico – a queda de um mito”) – coincidindo justamente com o início da reformulação do setor que culminou com a edição da Medida Provisória nº 579 no famigerado 11 de setembro do mesmo ano.

Por essa razão é que o tema interessa aos pequenos investidores, principalmente os locais, dado o impacto que isso terá no futuro próximo. Quem investe em ações de empresas de energia, sobretudo geradoras, não são somente os grandes conglomerados internacionais, com origem em países desenvolvidos, como EUA, Canadá, Austrália e Inglaterra. Claro que há uma boa parte de envolvimento dessas empresas internacionais, que sempre buscam diversificar suas atividades em outros territórios. Mas esses – presumimos – já sabiam dessa tragédia anunciada desde o atentado brasileiro do 11 de setembro de 2012.

Há, por outro lado, os quotistas de fundos de pensão de previdência complementar e de planos geradores de benefícios no Brasil, muitos dos quais pessoas físicas que não estão acostumados à dinâmica do mercado de capitais – e que confiam plenamente a terceiros a tarefa de investir seu capital que deverá servir para proporcionar uma aposentadoria mais tranquila e com maior qualidade de vida. Na busca pela atratividade de investimentos no setor, é comum escutar que “o papel do Grupo Tal paga bons dividendos, o que pode ser um bom investimento para o seu futuro”.

No entanto, esse tipo de argumento não serve a esse tipo de investidor. Isso porque seria um equívoco achar que administradores de grandes ativos tomam decisões sobre investimento e desinvestimento com base em dividendos, exclusivamente. Na verdade, o que se pretende ao investir em ações para rentabilidade de longo prazo é que o capital seja preservado ou, na melhor das hipóteses, incrementado. O pagamento de dividendos pode servir como meio para que ações se valorizem, mas não é necessariamente o fator decisivo. Ao menos não deveria.

Um pequeno investidor que vislumbra um contexto em que as ações da Eletrobrás despencam vertiginosamente, como noticiado amplamente na última semana, talvez se arrependa do investimento que está sendo realizado com os seus recursos – e daí começam as pressões aos fundos para a diversificação dos investimentos. E o “efeito manada” no mercado de capitais decorrente desse contexto acaba se refletindo ainda mais na dinâmica das ações do setor energético, sem que o pequeno investidor, quotista dos fundos de pensão, possa fazer nada a respeito. Consequência: agrava-se o problema da previsibilidade de sua aposentadoria. Logo, a falta de um planejamento coerente de médio e longo prazo no setor elétrico pode trazer severos impactos para a previdência complementar, o que, no limite, trará severos prejuízos para a qualidade de vida de uma população que, em geral, muito ou pouco poderá contar com o sistema de previdência estatal, independente de serem também, em muitos casos, consumidores de energia (caso em que seriam duplamente penalizados se a conta deles for majorada, como sugerem as notícias veiculadas na imprensa).

Urgente, pois, que se atente para as recomendações feitas pelo Instituto Acende Brasil, inclusive aquelas com relação a uma revisão urgente de todos os projetos em trâmite no Congresso Nacional que tenham impactos no setor – e que, por derradeiro, construa-se, de fato, um marco regulatório mais sólido ao setor energético para o longo prazo. Afinal, quem pagará essa conta seremos todos nós – e não será somente a conta de luz.

Roberto di Cillo – Graduado em Direito pela Universidade de São Paulo, LLM pela University of Notre Dame

André Castro Carvalho – Bacharel, mestre e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. Setor Elétrico

    Até hoje não vi nenhum dos especialistas que diariamente aparecem na imprensa responder a questão crucial. Vai ou não faltar energia? A razão disto é que geração e distribuição de energia é um pouco mais complicado do que trocar a lâmpada do abajur. O ONS tem um site onde são atualizados diariamente os dados do setor elétrico. Entendê-los é outra história, pois precisa, por exemplo, prever quanto de energia os brasileiros vão consumir amanhã(o pessoal que trabalha e entende de energia elétrica tem que fazer isto todos os dias, chama-se Curva de Carga), o nível dos reservatórios, qual a taxa de ocupação da usinas térmicas e nucleares, o quanto de chuva vai cair, quanta energia pode ser importada dos países vizinhos(sim isto é possível) e por aí vai. As notícias jogadas no ar fazem o que o artigo diz, trazer prejuízo para alguns aplicadores na bolsa, mas faz o que o artigo não diz que é gerar lucro para outros no mercado financeiro(sim, se pode ganhar com ações tanto na alta quanto na baixa), pois notícias levianas fazem as ações despencar artificialmente, mas quem as compra espera um pouco e tem um lucro razoável quando elas retornam ao seu patamar normal.

  2. Meu amigo se alguém algum dia
    Meu amigo se alguém algum dia souber quanto vai chover e onde, pode entregar o Nobel.
    Vc pode esperar determinado volume de acordo com séries históricas mas…Bom , deu pra entender.

    A reportagem não é leviana apesar de 100% incorreta.
    Se as ações do setor estão em baixa, cobre a administração destas empresas.
    Esse é o risco do negócio.
    Quer o que? Ficar com o lucro e dividir as perdas?

    Sabe o que é isso? Só mais um advogado especialista em energia, rsrsrsrs.
    Ele é parte do problema desde que resolveram mudar o acordo de acionistas de Furnas, que dizia que cargo de diretoria só podia ser ocupado por engenheiros.
    Tá cheio de advogados lá, Rsrsrs.
    E depois não sabem porque Furnas gera a mesma coisa há 20 anos

  3. Sobre o pensionista privado

    Roberto/Andre, parabens pelo artigo. Descreve em breves linha sobre um grupo importante que tem sido expropriado pelas diversas intervencoes deste governo sobre as empresas. Esquecem que existem milhoes de pequenos investidores, poupadores, futuros pensionistas, titulares de acoes (FGTS) que puseram seu dinheiro “conscientemente” e apostando na boa-fe e competencia de profissionais do setor privado e das empresas estatais do setor eletrico. Ocorre que ao fazer populismo barato com as tarifas de energia e com as renovacoes das concessoes, o atual governo dizimou a capacidade de investimento das empresas e de obtencao de retorno. Um futuro sombria aguarda esses investidores nos proximos anos. Infelizmente.

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