Os promotores paulistas vistos por um advogado, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Os promotores paulistas vistos por um advogado

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Sou advogado há mais de duas décadas. Em razão da divulgação dos super-salários do MP de São Paulo resolvi narrar três histórias envolvendo promotores paulistas.

A primeira ocorreu em meados da década de 1990, quando eu era um jovem advogado. Eu era advogado de uma mulher carente que havia procurado o Centro de Assistência Jurídica dos Alunos da Faculdade de Osasco. Ela queria o divórcio, o marido dela se recusava a aceitar a separação do casal que havia ocorrido há vários anos. Citado, ele não produziu defesa e o juiz marcou audiência para fazermos a prova da separação de fato há mais de dois anos.

No dia da audiência, o réu compareceu desacompanhado de advogado. Na antesala ele resolveu aceitar o divórcio consensual. Minha cliente chegou acompanhada por uma das três testemunhas que haviam sido arroladas. Entrei na sala do Juiz ele não estava. Então fui conversar com o promotor que oficiava no caso e ele disse que não concordaria com o divórcio consensual porque a oitiva de uma testemunha não era suficiente. Voltei para a antesala e aguardei a audiência ser apregoada.

Após sermos chamados entrei na sala junto com as partes, cumprimentei o Juiz e pedi a palavra.

– Pode falar, senhor advogado.

– As partes pretendem converter o divórcio litigioso em consensual e já negociaram os termos do mesmo, mas há um problema.

– Qual?

– Eu só tenho uma testemunha e o senhor promotor – apontei para o tal – disse que não aceita o divórcio porque só uma testemunha está presente.

-Não tem problema não, senhor advogado. Quem manda aqui sou eu. Traga a sua testemunha e depois eu decidirei se o divórcio será ou não decretado.

O promotor fez cara de quem chupou limão azedo, mas não deu um pio. A testemunha foi ouvida, disse que conhecia o casal e sabia que eles estavam separados de fato há mais de 3 anos.  No momento em que deveria opinar pelo indeferimento do divórcio disse que concordaria com o mesmo.

Numa outra oportunidade – fato ocorrido há uns 8 anos – o divórcio era consensual. Fui pegar o OK da promotora na petição e ele me pediu para falar com o casal.  Durante a entrevista, ela criou uma confusão danada acerca da cláusula que regulava a correção da pensão alimentícia. Ao final, como as partes rejeitaram a sugestão de modificação que ela fez a promotora me devolveu a petição e disse.

– Não concordo com a cláusula da correção da pensão, portanto, o divórcio não será feito.

Calmamente, entreguei novamente a petição para ela.

– Quem decide se o divórcio será ou não decretado não é a senhora, mas a juíza da Vara. A senhora só tem o direito de opinar e sua opinião não vincula a decisão da juíza. Neste caso em especial, se a juíza concordar com a senhora eu vou recorrer e o Tribunal decidirá se as partes podem ou não fixar a correção dos alimentos da forma ajustada. Portanto, emita seu parecer por escrito e fundamente a rejeição da cláusula que eu vou despachar a petição com a juíza.

A promotora disse que não faria isto. Caso encerrado o senhor pode se retirar da minha sala.

– OK. Então eu sairei daqui direto para a Corregedoria do MP, pois a senhora está se recusando a fazer o que lhe compete.

Já estava descendo as escadas quando fui alcançado pela servidora que trabalhava no gabinete da promotora. Ela me pediu para entregar a petição que a promotora cumpria sua obrigação de opinar, por escrito, se concordava ou não com o divórcio explicitando o fundamento.

O terceiro episódio ocorreu há uns 4 anos. Durante a audiência numa ação de alimentos, após longa discussão, as partes chegaram a um acordo sobre o valor mensal a ser pago e a forma de correção. O promotor foi chamado para opinar e não concordou com o valor ajustado.

– Setecentos e cinquenta reais é muito pouco doutor. O seu cliente pode pagar mil reais por mês.

– Quem sabe o que meu cliente pode ou não pagar é ele e eu. Além disto, a mãe da criança já aceitou o valor que foi proposto.

– Sim. Mas eu não concordo. E se a juíza não acolher minha opinião eu vou recorrer da sentença dela homologando este acordo, pois os interesses da criança não estão sendo integralmente satisfeitos.

– Faça o que achar melhor, senhor promotor. Aliás, se o senhor está tão incomodado com o valor da pensão o senhor pode se comprometer a pagar do seu bolso a diferença entre os setecentos e cinquenta reais propostos e os mil reais. O senhor ganha muito melhor que o meu cliente. Os duzentos e cinquenta reais de diferença significam muito dinheiro para ele, mas para o senhor eles não são nada.

Irritado, o promotor disse que tinha um outro compromisso e pediu para sair da sala. Antes de sair disse a juíza para constar da ata sua usual concordância que depois ele a assinaria.

Após ele sair a juíza sorriu para mim e disse que eu era malvado. Às vezes isto é necessário, respondi.

As histórias narradas refletem as três principais contradições que envolvem a atuação dos membros do MP paulista. A primeira exemplifica a superioridade hierárquica que o promotor é ensinado a demonstrar diante do advogado. Todavia, ele deveria saber que tem a obrigação de saber que a Lei garante ao advogado sua independência e autonomia inclusive para confrontar o membro do MP quando necessário for. Quando é devolvido ao seu devido lugar raramente o promotor desafia a autoridade judicial.

A segunda exemplifica a má vontade do promotor e a crença ilegal que alguns deles querem difundir de que podem decidir os rumos do processo inclusive se recusando a realizar atos que eles tem o dever funcional praticar. Nos processos em que atua, o promotor não tem liberdade para deixar de agir. Ele pode discordar do advogado, pode até recorrer da decisão judicial. Caso se omita de cumprir seu dever funcional para travar o processo, o promotor pode ser punido.

Na terceira hipótese vemos um caso típico de promotor paraquedista que, chegando atrasado na audiência, tenta impor sua personalidade. Metido num terninho bem alinhado e feito sob encomenda, ele desqualifica tudo aquilo que foi tratado pelas partes e pelos advogados na presença do juiz. Ao ser metralhado com ironias ele raramente fica na sala por muito tempo.

Se levarmos em consideração a arrogância, a má vontade e o paraquedismo de vários promotores paulistas é evidente que eles não merecem os super-salários que recebem. Se ganhassem metade do que ganham eles já estariam sendo regiamente pagos.

 
Fábio de Oliveira Ribeiro

15 Comentários

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  1. Um Estado dominado por castas

    Um Estado dominado por castas privilegiadas e uma sociedade fundada no materialismo e no consumismo não poderiam resultar em nada diferete disso. O fato é que estamos presenciando o fim do humanismo.  

  2. Promotor para quê ?

     

    Há muitos anos , compareci, como advogado do casal, a uma audiência de separação consensual . O promotor não compareceu, então o juiz disse: “dada a palavra ao dr. promotor, o mesmo não se opôs”. 

    Promotor para quê ? No cível só para infernizar a vida do advogado.

  3. os promotores….

    O MP/SP é todo afiliado ao Tucanato. Uma aberração de conflitos de interesse. Por que será que processos contra tucanos não prosperam ou não andam? Diversos dos seus representantes em cargos estratégicos do governo. E via de regra atolados em casos de corrupção. Não é mesmo Merendão do Capez? O problema do Brasil nunca foi dinheiro Um país pobre? Escárnio da Elite. O brasileiro não se organiza, não é politizado, nem reage? 2013 assombrou este tal escárnio. Até os anos de 1990, esta era a desculpa perfeita. Alteração Constitucional. Dinheiro em enxurradas ao Judiciário. Resultado? Uma nova elite nacional. Mamatas, salários e pensões nababescas. E o resultado apresentado pelo Poder Judiciário e pela  Justiça? Bem, decapitações ao vivo mostraram para nós e para o Mundo, o nível das nossas instituições. Outro exemplo emblemático, após denúncia de um programa jornalístico sobre mais de 230 mortes em 2 anos em Hospital Psiquiátrico de Sorocaba em 2014, o MP/SP correu para arquivar o processo. O MP Federal tomou o controle e andamento do processo. Representa bem o abismo que existe entre tais Instituições e Governos. 

  4. O funcionalismo está cheio de

    O funcionalismo está cheio de bestas quadradas,

     

    minha mãe foi na caixa receber uma dessas trocentas parcelas do fgts que ficam na história, chegando na agencia o individuo não queria pagar por que ela não tinha um documento da época, de duzentos anos passados, foi embora sem receber, chegou em casa relatou essa idiotice para mim; fui ao site da caixa e imprimi as exigencias para recebimento no qual constava que era só comparecer munido do RG. Minha mãe retornou com a folha, mostrou-a ao cidadão e disse que se ele recussase a pagar iria ao gerente, ao fina,l recebeu o que era de direito; fico imaginando gente simples que batem de frente com um prepotente desse, que precisam do dinheiro, mas não recebem por capricho de um funcionario aloprado e não tem quem os oriente melhor.

  5. Tenho outra versão. Tirando

    Tenho outra versão. Tirando algumas excelentes exceções a maioria do judiciário é composto por sujeitos que não merecem ganhar 10% do que ganham. Prepotência e preconceito abundam. Conhecimento e humildade são mais escassas do que água no deserto.

    Mas fazer o que, né? Este é um país imperfeito, com muita gente imperfeita e com mais gente ainda com uma especial predileção por aceitar tudo que vem do poder público e ser humilhada. Não somos uma sociedade. Somos um amontoado de gente que pouco se tolera.

  6. Exemplos do “monstro” de Sepúlveda Pertence

    Três exemplos simples, rápidos, diretos, do “monstro” que se tornou o Ministério Público. E tenho certeza que, se olharmos em outros Estados, não vai ser tão diferente assim. É que o MP-SP resolveu se assumir como casta de tal maneira que não precisa ser minimamente transparente…

  7. Picuinhas

    Essas são picuinhas típicas e corriqueiras que ocorrem entre advogados e promotores de justiça (?) em todas as comarcas, não só do estado de São Paulo, mas em todos os Brasis.

  8. Quando o Brasil retomar a
    Quando o Brasil retomar a normalidade democrática e sair do Estado de Exceção uma primeira medida será apertar os arreios sobre o poder judiciário, cortar salários e benefícios dos marajás e prender meia dúzia de promotores como exemplo. Motivos e materialidade, como se vê, não faltam.

  9. Me lembrou

    o amigo de traficante, sendo estupido e grosseiro com os advogados do Lula, que lhe passaram um belo corretivo.

    aproveitando, ele já devolveu os objetos furtados da casa do Lula ?

     

    bandido bom é bandido morto

  10. Os marajás do ministério público de São Paulo

    Os 20 membros mais bem pagos do Ministério Púbico de SP

    Postado em 18 de fevereiro de 2017 às 10:55 am     in

    Co

    Conforme apuração da Agência Pública, as informações sobre os rendimentos dos membros do MP estão disponíveis no Portal da Transparência:

    tabela-rendimentos

     

     

  11. Está na hora de fixar cotas

    Está na hora de fixar cotas sociais nos tais concursos para as promotorias, procuradorias e o judiciário. Chega de aguentar esses concurseiros filhinhos disso e daquilo. Aliás, também já passou da hora de acabarem com as tais provas/entrevistas orais, em que colocados no final da classificação, por obra “divina” são guindados aos primeiros lugares. Mas, sobre isso, nem as corregedorias, muito menos os tais “conselhos” de apaniguados se pronunciam.

  12. As causas

    Isto tem várias causas. Em primeiro lugar, a maioria que  chega a promotor, procurador, juiz, é de classe média alta pra cima. São os filhos da elite, que mima e estraga seus descendentes.

    Estes jovens desde crianças foram criados ouvindo os ensinamentos reaças de seus pais ” bandido bom é bandido morto ” , ” bolsa família é pra vagabundo ” , e outras ” pérolas ” que eles incluem na lavagem cerebral de seus filhos. Na maioria dos casos os jovens filhos da elite crescem arrogantes, prepotentes, sem noções de limites, sem educação, sem sabedoria alguma. A riqueza é só material, como seres humanos são bem pobres.

    E muitos dos filhos da elite acabam virando ” órfãos de pais vivos “, os pais dão dinheiro a rodo a seus filhos, mas nenhuma orientação conselho ou sabedoria, pois estão muito ocupados trabalhando fora para ganhar dinheiro, que na opinião deles é tudo.

    Então os jovens filhos da elite, vão para as escolas particulares e depois para a faculdade, lugares onde a lavagem crebral reaça continua. Nada a estranhar que depois fiquem reacionários arrogantes.

    Finalmente o golpe de misericórdia vem do concurso público, que avalia se o candidato sabe bem português e matemática, mas não avalia se ele é um bom ser humano.

    ————

    Nos EUA não há concurso, nem para polícia, nem nada. Em compensação fazem 3 entrevistas, mais uma série de testes e vasculham a vida do candidato, vasculham o facebook e tudo o mais. Se o candidato tiver uma frase do tipo ‘ bandido bom é bandido morto ‘ escrito no facebook, eles excluem o candidato.

     

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