Procuradores fizeram “jogo” de “combinar” e “construir histórias” para fechar delações

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Em grampo, Joesley Batista, delator da JBS, diz que sacou intenções de procuradores do Ministério Público Federal durante as conversas para fechar o acordo de delação premiada, mas fingiu que nada estava sendo “combinado” 
 
 
Foto: Eliária Andrade (O Globo) e Adriano Machado (Época)
 
Jornal GGN – Há uma semana, o advogado foragido da Justiça brasileira Rodrigo Tacla Duran colocou sob suspeita o modo como acordos de delação premiada são feitos em Curitiba, arrastando para o olho do furacão o amigo pessoal de Sergio Moro, Carlos Zucolotto, e procuradores que atuam na capital da Lava Jato em primeira instância. Agora é vez da Procuradoria Geral da República sob Rodrigo Janot ser objeto de um potencial escândalo por causa de uma gravação feita pela delator Joesley Batista. No áudio, o empresário coloca em xeque o modo como o acordo foi negociado em Brasília.
No diálogo, Joesley diz a Saud para não se preocupar porque ele já havia sacado o “jogo” do Ministério Público Federal para fechar um acordo de cooperação.
 
O empresário evitou dizer com todas as letras o que estava pensando, mas deu a entender que o interesse do MPF poderia ser o de ver gente do “andar de cima” implicada. Algo óbvio e já dito por Rodrigo Janot quando concedeu uma entrevista sobre o que seria cobrado de Eduardo Cunha em uma possível delação. 
 
Em meio ao bate-papo com Saud, Joesley tece comentários sobre uma tática bastante vista na Lava Jato: o vazamento de informações impactantes à imprensa. O delator afirma que sempre que conversava com um procurador de nome “Anselmo”, o noticiário era abastecido com dados de operações e, curiosamente, as reportagens não batiam diretamente na JBS.
 
“Para mim, eu tô entendendo o jogo. Pô… Vamos pensar. No dia em que nós ligamos pro Anselmo, toda semana teve um bum, bum, bum, bate. Não teve nada contra nós… Indiretamente… Mas conosco não teve nada”, disse Joesley.
 
Saud respondeu dizendo “eu não concordo” e ruídos na gravação impedem que se entenda a exatidão de suas palavras, mas a intervenção ocorreu no momento em que ainda se falava de como os procuradores usavam as informações antes de fechar acordos de delação. Na sequência, Joesley rebateu dizendo que “é necessário isso. Isso é bom. Faz parte. Faz parte. [Ajuda a] Construir a história.”
 
“Por que não combinar com você então?”, pergunta Saud.
 
Ao longo do diálogo, Joesley e Saud citam 3 nomes que podem se referir aos procuradores Anselmo Lopes, que investigou a JBS nas operações Sepsis, Greenfield e Cui Bono; Marcelo Miller, que deixou o MPF, e Eduardo Pelella.
 
Segundo Saud, o procurador Marcelo chegou a pedir extraoficialmente dados da JBS para avaliar se seriam interessantes para a delação. Joesley, em tom mais exaltado, advertiu Saud que não era para “entregar nada” que não fosse pelos canais oficiais.
 
Em outra passagem, Saud diz que não entende o porquê desse jogo do MPF se todos pareciam “alinhados”. 
 
Joesley responde: “Porque não pode ser combinado. Você não pode entender isso. Eu entendo e não devia estar entendendo. Ninguém está entendendo. Por isso que digo da pretensão, e posso estar completamente errado, mas tenho a pretensão de achar que estou entendendo. Eu acho que entendo o que as pessoas acham. Em condição normal de pressão e temperatura, eles estão fazendo o que era previsível. Pensa no lugar deles. O que eles fariam: ‘Toca pressão nesse povo’. Mas não mexe com eles…”
 
Joesley não explica quem são “eles” que não devem ser incomodados. 
 
Em outro momento, Joesley dá azo à possibilidade de ter feito a delação premiada dizendo apenas coisas que interessariam ao jogo do MPF, que ele não expõe a Saud qual é. “Eu reajo muito mais pelo que acho que você está pensando do que pelo que você está falando”, pontuou.
 
A conversa parece ter sido gravada por Joesley antes de Janot saber do grampo em Michel Temer e, portanto, sem que a delação tivesse sido fechada.
 
Ouça a íntegra:
 
 
Abaixo, alguns trechos selecionados pelo GGN:
 
***
 
Joesley Batista: Eu acho que eu sei o que o Ministério Público está fazendo. Eu acho que sei o que o Anselmo está fazendo. O Anselmo faz as peripécias dele tudo, eu olho para ele e digo: ‘chefe, é o seguinte, eu tô entendendo’. (…) É o seguinte, nós não vamos ser presos. 
 
Ricardo Saud: Então por que você está sofrendo?
 
Joesley: Não tô sofrendo de nada. Eu tô entendendo tudo.
 
Saud: É porque você entende pelo lado positivo, que nós vamos chegar numa delação. Você está entendendo o seguinte: isso tudo [as investigações] está sendo bom, nós toleramos, mas agora chega. Vocês não resolveram o problema de vocês; em 3 anos vocês, não resolveram porra nenhuma. Eu tenho que resolver o meu problema para não quebrar a minha empresa.
 
Joesley: Eu acho… engraçado… nada disso me surpreende. Nada disso me surpreende porque eu acho que estou entendendo exatamente o que eles estão fazendo. E para mim está tudo normal.
 
***
 
Joesley: Eu, para mim, eu tô entendendo o jogo. Pô… Vamos pensar. No dia em que nós ligamos pro Anselmo, toda semana teve um bum, bum, bum, bate. Tamo mas nao tamo. Não teve nada contra nós. Indiretamente… Mas conosco não teve nada. 
 
Saud: Ah, eu não concordo (inaudível)
 
Joesley: Mas é necessário isso. Isso é bom. Faz parte. Faz parte. Construir a história…
 
Saud: Por que não combinar com você então?
 
Joesley: Mas não vai ser. É o subliminar. Tá tudo certo. Ricardo, tá tudo certo. Eu posso estar completamente enganado e acho que eles não estão fazendo isso orquestradamente. Mas acho que eles estão fazendo isso achando que nós não estamos entendendo. Mas eu tô entendendo. (…) Eu posso estar completamente num ‘Lalaland’. Mas eu tô vendo tudo e tô em paz. Tô achando que está tudo certinho. 
 
***
 
Joesley: Seria a reação natural… Pensa você no lugar do Janot. Senta você no lugar do Janot…
 
Ricardo: (inaudível)
 
Joesley: [Faz som de discordância] O Janot sabe tudo… A turma já falou pro Janot.
 
Saud: Parece que o Marcelo leva tudo para ele.
 
Joesley: Não é o Marcelo. Nós falamos para o Anselmo, que falou pro Pelella. Que falou para não sei quem lá, que falou para o Janot. O Janot está sabendo. O que o Janot espertão falou: ‘Bota para foder, bota para foder, põe pressão neles para entregar tudo’. Mas não mexe com eles… Não foder, dar pânico neles…
 
Saud: É isso que não dá para entender. Se nós já estamos combinados, que que esse (inaudível), que que esse (inaudível) ainda precisa combinar com a gente?
 
Joesley: Porque não pode ser combinado! Você não pode entender isso. Eu entendo e não devia estar entendendo. Ninguém está entendendo. Por isso que digo da pretensão, e posso estar completamente errado, mas tenho a pretensão de achar que estou entendendo. Eu acho que entendo o que as pessoas acham. Em condição normal de pressão e temperatura, eles estão fazendo o que era previsível. Pensa no lugar deles. O que eles fariam: ‘Toca pressão nesse povo’. Mas não mexe com eles…
 
***
 
A partir sos 6 minutos e 10 segundos, Saud diz que Marcelo lhe pediu informações extraoficialmente e diante da resposta, disse que aquilo não servia para nada. “Não vou passar para o Marcelo tudo que eu tenho”, disse Saud.
 
Joesley sobe o tom e responde: “Não é para passar nada!”
 
Saud diz que levantou números no Tribunal Superior Eleitoral e passou para Marcelo, que respondeu que já tinha aqueles dados. O empresário afirma que se sentiu “testado” pelo procurador.
 
***
 
 
Em outro áudio, Joesley diz que o MPF sabe que a delação da JBS é a “jóia da coroa” e que tudo será feito de modo que a empresa não vai quebrar, os delatores não serão presos e não perderão seus “amigos”.
 
A gravação é a mesma em que Joesley explica porque uma advogada da empresa entrou em “pânico” quando entendeu que nomes do Supremo Tribunal Federal poderiam ser arrastados para a delação.
 
 
 
 
 

 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. Historia muito mal contada!!!!

    Pra mim ainda esta muito estranho o fato do Joesley entregar delações que o prejudicariam, ele sempre foi muito bem acessorado como essas gravações e todas as noticias a respeito do caso mostram.

    Não acho que o advogados entregariam as gravações erroneamente por incompetencia ou engano.

    Acho que é alguma manobra pra enconbrir algo que vai estourar e a midia precisa de uma cortina de fumaças pra esconder a verdadeira bomba  ou é uma preparação para que a população inconformada apoie uma intervenção militar que esta em vias de acontecer. 

    Houve diversos jornalistas, cienteistas politicos e alguns ditos intelectuais, até mesmo de esquerda, que nos ultimos dias estão considerando que seria bom uma intervenção militar.

    Até agora, as tais gravações foram só blá blá blá, nem contra os Ministros do STF surgiu algo além de fofocas como havia sido dito por Janot

    Quanto a serem uma cortina de fumaça, oq seria tão importante que valeria o Joesley arriscar sua delação premiada.

    Poderia ter no escandalo das novas investigações da Olimpiadas  aparecido a participação da Globo na tal comprar dos jogos no RIo?

    Poderia ser pra livrar Moro e a lava jato de uma possivel investigação pelas denuncias do Advogado foragido?

    ou algo que ainda não foi noticiado e passará despercebido?

    De qualquer forma há muito mais duvidas do que o simples conteudo das gravações!

     

  2. procuradores….

    Descobrimos, depois de tudo, que quem arrombou o INPS foi Jorgina de Freitas. Aqui é o Brasil, duas quadras depois do País de Oz,  acusarão que malas de milhões para Senador e Presidente, assim como os milhões escondidos no bunker do Ministro foi invenção do MP e do Empresário. O Brasil se explica. 

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