A Guerra dos Mundos começou – quem diria! – dentro do nosso quintal
por Sebastião Nunes
O marciano verde de cabeça grande não apareceu.
As imensas naves do distante mundo exterior nunca chegaram até aqui.
Nenhum monstro disforme desceu em naves colossais.
Durante mais de dois séculos a ficção científica criou histórias de extraterrestres de todos os tamanhos, origens, cores e maneiras de se comunicar.
- G. Wells, Ray Bradbury, Júlio Verne, Isaac Asimov, Arthur C. Clarke, Philip K. Dick, Stanislaw Lem, Karel Capek e tantos outros quebraram a cara.
Os Estados Unidos – a maior potência da Terra – arrotaram grandeza durante mais de um século, atacando, matando e roubando onde e quando queriam.
Exatamente como o Império Romano, há dois mil anos.
Roma sucumbiu pela indolência de sua elite dirigente, de seus exércitos ociosos, e por inúmeros conflitos internos e externos. Os arrogantes e poderosos EUA desabam corroídos de dentro pela extrema direita republicana e pelo mais ignorante de todos os seus presidentes, Donald Trump. De fora, por um minúsculo ser, quando, pela primeira vez na história, o todo-poderoso se viu indefeso diante de um inimigo mais forte.
No lugar de marcianos verdes, naves imensas e monstros disformes, em vez de impérios colonialistas e implacáveis vindos de outras galáxias, temos de nos contentar com minúsculos seres, invisíveis a olho nu, reproduzindo-se com rapidez em proporções inacreditáveis e atacando com uma ferocidade inconcebível.
BEM QUE AS GAROTAS AVISARAM
Pelo menos durante os últimos cinquenta anos, cientistas preocupados tentaram convencer os governantes da Terra a refrear a ganância, o egoísmo e o instinto predador de seus povos.
Todos foram surdos a seus apelos, exceto os mais esclarecidos.
Há pelo menos vinte anos, um punhado de garotas e garotos resolveram berrar bem alto pelos direitos da vida contra a morte.
Com a exceção de pequenos grupos, todos foram surdos a seu berreiro.
Desde o início do século XXI, a violência contra a natureza cresceu em níveis assustadores, dizimando habitats e espécies.
O turismo passou a degradar e a humilhar todos os países, em todas as latitudes, numa escala impossível de controlar, ou mesmo de civilizar, porque todos os países se tornaram reféns dos dólares e dos euros despejados pelos visitantes predadores.
O mar está atulhado de lixo, as montanhas estão saturadas de lixo, a atmosfera se torna mais cinzenta a cada dia por conta do lixo acumulado.
E, assim, a classe média estava cavando a própria e a nossa sepultura quando, no fim do túnel, surgiu um minúsculo ser, se propondo fazer por ela esse trabalho, mas decidido a fazê-lo de cima abaixo, não deixando pedra sobre pedra.
Propondo-se, enfim, a uma faxina de cabo a rabo na espécie humana.
POR ENQUANTO É SÓ O COMEÇO
Porque tinha de começar em algum lugar, o minúsculo ser começou pela China, como poderia ter começado pelos EUA, pela Inglaterra ou pelo Brasil.
E dali se expandiu com apetite inacreditável.
Quem disse que a Terra seria, no futuro, colonizada pelas baratas?
O futuro chegou e a Terra está sendo colonizada, mas pelo minúsculo ser.
Depois dele virão outros, tão minúsculos quanto ele e, seguindo suas trilhas pelo corpo de cada ser humano, consolidarão a conquista.
Além do pipocar de epidemias, por enquanto apenas lidas nas entrelinhas, outros desastres acontecerão, inesperadamente. Ou não.
Pelo andar da carruagem, serão catástrofes ambientais em sequência: terremotos, maremotos, degelo em larga escala, secas implacáveis e enchentes monstruosas.
Surgirão novos desertos e multidões famintas e desesperadas perderão o controle e invadirão com facas nos dentes os países mais próximos.
A Europa que se prepare para a avalanche de africanos em fúria.
Os Estados Unidos que se preparem para a invasão de mexicanos, antilhanos e seus próprios miseráveis raivosos.
A América Latina se devorará a si mesma.
A Ásia, com seus bilhões de habitantes e suas contradições religiosas, sociais e políticas, ficará enredada em mil teias de incontrolável autofagia.
Profetas de todas as crenças, aliados a profetas sem crença, percorrerão a Terra e em cada esquina entoarão (já estão entoando) seu triunfante canto de guerra: o mundo como o conhecemos nunca mais será o mesmo.
E terão razão.
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