A projeção da violência televisiva

Por Antonio C.

Comentário ao post “A influência da TV aberta na violência difusa

É preciso que se faça uma economia política do crime.
 
A lógica discursiva não mudou muito desde Afanásio Jazadji e Amaral Netto. No primeiro caso, são “míticas” as “entrevistas” de pés-de-chinelo que matam por motivos banais ou roubos pequenos. Claro, não há histórico pessoal, é apenas o “canalha”, “vagabundo”, comentários esses cortados por um trecho de gravação e outro. O segundo caso é decorrência do primeiro, com a defesa incondicional da pena de morte para um país em que o acesso à Justiça é o desafio.
 
Não entendo (artifício retórico) os motivos pelos quais estes mesmos “telejornais” não dedicam o mesmo tempo aos crimes de colarinho branco, que dependem de mais pormenores. Gravações, escutas, chantagem; é emocionante, um romance de Agatha Christie; dada a complexidade, a lembrança dos últimos fatos podem levar ao esquecimento dos primeiros. Logo, a escolha dos crimes é pela simplicidade da ação e pelo impacto que eles possam causar.
 
Bem, ontem, eu fui quase fui atropelado duas vezes – e olhem que tomo o máximo de cuidado (acho que nesse caso todo o cuidado não deu certo) por causa das pessoas entretidas com seus celulares, andando com a cabeça colada ao corpo apenas ou gente folgada. Estou falando de gente “normal”, “de bem”. Eu repito, não tenho medo de bandido; eu tenho medo de gente de bem.

 
Eu “chuto” que grande parte da violência televisiva é projeção. A “gente de bem” não se considera violenta. Dada que a infelicidade pode ser acobertada por uma infinidade de sobrecompensações (que vai desde levar vantagem sobre coisas banais que também poderiam estar num programa do Afanásio até seduzir uma mulher e possui-la com inconsciente desprezo – “como ela é idiota por se deixar levar por uma lábia como a minha!”), quem se declara infeliz é um poeta, doente ou derrotado. Com pessoas tão endurecidas, as “camadas” de agressividade vão ficando cada vez mais difusas, difíceis de conter. Olha-se na tela aquela violência que está dentro de si. Pode ser que o crime mostrado seja horrível; mas ele também espelha aquele fascínio pelo fato de o “violento” ter extrapolado; ele tem tudo o que eu nego. A expiação do crime é um dos diferentes modos de a “gente de bem” não olhar para o próprio umbigo.
 
Acho que as pessoas deveriam ficar felizes. Dizem que não é pelo motivo de alguém ser pobre que se mata e rouba. Porém, também é surpreendente que poucas pessoas declaradamente façam isso. Ou sejam reconhecidas enquanto tal. Dentro de um grande museu paulistano estão escondidas diversas chantagens; mas o quadro é tão lindo.
Redação

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