As perguntas não feitas pelo Fantástico no especial da Cracolândia, por Ana Trigo

Uma operação da polícia, que apreendeu 111 gramas de crack (sim, você leu certo GRAMAS), é apontada como bem sucedida.

As perguntas não feitas pelo Fantástico no especial da Cracolândia

por Ana Trigo

Ontem, prestes a completar 50 anos, o Fantástico – O Show da Vida, veiculou uma reportagem anunciando imagens inéditas de como funciona o tráfico na cracolândia. Uma reportagem que me deixou profundamente triste como jornalista e pesquisadora acadêmica pela apuração rasa e cheia de estigmas contra os dependentes químicos. Uma operação da polícia, que apreendeu 111 gramas de crack (sim, você leu certo GRAMAS), é apontada como bem sucedida. A imagem acima mostra, segundo o repórter, um “traficante”: um homem sem camisa, esquálido, trocando drogas por um agasalho de lã. Outras imagens mostram os “traficantes” no escambo que acontece nos fluxos: as drogas são trocadas por coisas, sem dinheiro envolvido. Também conversa com comerciantes, desesperados por verem o inferno se aproximando de seus negócios. O prefeito e o delegado são entrevistados. E quantas perguntas deixaram de ser feitas! Aponto aqui algumas:

1) Se o tráfico acontece à vista de todos, por que não é coibido?

2) Um “traficante” foi preso (outra imagem mostra um homem de bermuda e camiseta em frente ao prédio de fachada simples onde morava): ele comprava drogas em Santos. Onde ele comprava droga? O fornecedor foi preso? O centro de distribuição na cidade do litoral paulista foi desmontado? E os centros de distribuição que existem aqui em São Paulo? O crack não brota nas calçadas da cidade.

3) Por que o poder público insiste em empurrar os dependentes químicos de um lado para o outro, em um êxodo macabro, espalhando o inferno pela cidade?

4) Por que não existe um protocolo de prevenção que acolha o dependente e sua família nas inúmeras vezes que buscaram ajuda antes de cair nos fluxos, abandonando essas pessoas em um caminho de solidão e desesperança?

Desalentador!

Fantástico #Fant50 #dependênciaquímica #estigma #cracolândia

Ana Trigo – Doutora em Ciência da Religião na PUCSP

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2 Comentários

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  1. As perguntas mais difíceis que ninguém faz são, por exemplo: Quem domina os portos de Santos há mais de 30 anos (dica, é um político) ? Por que os pontos de venda de droga são tão próximos de postos físicos e móveis de polícia e tem sempre viaturas próximas? Por que quando um bairro começa a ficar interessante traficantes e viciados começam a se aglomerar em torno dele? Por quê que depois que viciados e traficantes de um local são expulsos, imóveis detonados pelo tráfico são demolidos e novas construções aparecem vendendo unidades a preços exorbitantes?

  2. Esse tipo de reportagem é só mais uma agitação. Pra ver se a sociedade se selvageriza ainda mais e “clama” pela “solução final”: A MATANÇA, tão a gosto de certo numeroso segmento da elite brazurca. Resolver, consoante a lei? Nada! “Dá um trabalho!” Além de prejudicar os grandolas do sistema.

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