Native advertising, o novo “publieditorial”, ganha força no exterior

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Nelson de Sá, na Folha

Publicidade nativa ganha força entre jornais no exterior

O que é “native advertising”? A tradução é publicidade nativa ou natural. É um anúncio que surge nos sites jornalísticos supostamente de forma natural, como se fosse do ambiente, a exemplo do conteúdo editorial.

Costuma-se acrescentar que é um novo nome para “advertorial”. Em português, “publieditorial”.

Até meados de 2013, havia muita resistência ao formato, ainda que já fosse usado amplamente por sites como “Huffington Post”. O caso do “New York Times”, que estreou no formato em janeiro, ajuda a compreender como ele acabou sendo adotado afinal pelo jornalismo.

Um ano atrás, a editora-chefe do “New York Times”, Jill Abramson, foi questionada sobre “native advertising” e lamentou que ele tivesse se tornado moda no debate sobre novos modelos de negócio para o jornalismo.

“O que me preocupa é confundir o leitor sobre a origem do conteúdo, fazendo anúncio parecer com reportagem.”

Meses depois, o novo presidente-executivo da New York Times Company, anunciou a adoção do recurso.

“Não existe razão para, no contexto do ‘NYT’, não dar ao anunciante a oportunidade de levar mensagens longas e sofisticadas ao usuário”, disse Mark Thompson, prometendo “transparência absoluta” e “confusão zero” entre conteúdo publicitário e editorial.

Abramson declarou então à ombudsman do jornal que estaria “vigiando como um falcão” para garantir que os leitores nunca fossem confundidos.

No dia 8 de janeiro, entraram no ar os primeiros posts pagos pela Dell, linkados por um anúncio da empresa e, internamente, com URL específica (paidpost.nytimes.com). A página tinha moldura colorida e registros destacados de que se tratava de conteúdo patrocinado.

O tema dos textos havia sido selecionado pela empresa a partir de sugestões de um “estúdio” ligado ao departamento comercial, sem vínculo com a Redação. As pautas foram comissionadas para “free-lancers”, que receberam crédito no alto dos posts.

Thompson, ao apresentar os resultados do quarto trimestre da NYT Company, declarou que 2014 é “um ano crítico na história da publicidade na empresa” e que “esse esforço já está trazendo maior receita”. A prioridade para “inovação publicitária” prosseguirá, ao longo do ano, com novos produtos digitais.

CONTEÚDO

Diretora editorial do semanário “Meio & Mensagem”, Regina Augusto diz não haver ainda exemplos brasileiros, mas acredita que o formato se estabelecerá também no país. “Não vejo publicidade nativa como salvação da lavoura, mas é um caminho. Para acessar aquele conteúdo, relevante, você entra em contato com uma marca.”

Embora enxergue publicidade nativa como evolução do “publieditorial”, ela destaca a característica de não ser, como antes, “uma coisa autopromocional, mas um conteúdo bacana”.
No caso do “NYT”, foram textos sobre tecnologia e mulheres executivas, sem relação direta com a Dell.

Sergio Gordilho, copresidente e diretor-geral de criação da agência Africa, ressalta o significado da publicidade nativa num cenário em que “os jornais seguem veículos fundamentais para a comunicação”, sendo “a principal matriz de qualidade em qualquer plataforma”.

“Por isso, marcas, empresas e organizações procuram visibilidade e legitimidade nesses veículos. O ‘native ad’ usa as novas tecnologias para, sem ser intrusivo, oferecer aos anunciantes um público superqualificado e, aos leitores, conteúdos de alto interesse”, afirma.

Luiz Lara, presidente do grupo TBWA no Brasil, diz que “vai ser uma experiência nova no país e um aprendizado para todos”. Ele vê avanços no modelo por não ter como objetivo “falar do produto”, vinculando-se mais à marca. Lara também não acredita que possa “afetar a separação entre Igreja e Estado”, referência à autonomia entre Redação e comercial.

MATÉRIA PAGA

Rosental Calmon Alves, diretor do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, da Universidade do Texas, enfatiza os riscos na generalização do formato. “Quando vê que alguns dos mais rigorosos meios de comunicação do mundo estão se rendendo a esse tipo de publicidade, você sente que é inevitável.”

Ele afirma que, “em momentos históricos anteriores, quando isso foi tentado, houve muitos problemas éticos”.

Para funcionar agora, “é preciso regras claras, não só para a empresa, mas na percepção do consumidor”. Do contrário, esse “pode acabar sendo enganado e isso vai prejudicar a credibilidade do meio de comunicação”.

Dois meses depois do “NYT”, o “Wall Street Journal” deu início ao seu programa de publicidade nativa (veja quadro). Segundo Raju Narisetti, vice-presidente de Estratégia da News Corp., que publica o jornal, é conteúdo “claramente rotulado”, mas “tão relevante quanto o jornalismo ao seu redor”.

Também o britânico “The Guardian” acaba de criar seu estúdio, contratando 133 profissionais. O lançamento já incluiu um contrato de mais de £ 1 milhão (R$ 3,7 milhões) com a Unilever, para postar “conteúdo editorial” na seção Life & Style.

O próprio jornal britânico publicou logo em seguida, na coluna de mídia de Bob Garfield, uma crítica à publicidade nativa, questionando: “Se é tão inofensiva, por que depende de enganar os leitores?”. No enunciado, “É difícil ler o mais recente artifício para pôr dinheiro num setor moribundo como algo diferente do que o jornalismo vender a sua alma”.
 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. Aqui no Brasil os jornais

    Aqui no Brasil os jornais publicam tanta mentira que um anúncio de automóvel travestido de matéria jornalística não vai fazer diferença alguma. Que aumentem a esculhambação. O fim está próximo mesmo.

  2. Novidade?

    “Regina Augusto diz não haver ainda exemplos brasileiros, mas acredita que o formato se estabelecerá também no país.”

    Essa Regina Augusto do Meio & Mensagem nunca ouviu falar da Revista Manchete? O que mais tinha era matéria paga.

    1. Nem na revista Veja

      A Veja, então, nem se fala, André. E o pior é que faz, há anos, disfarçada de reportagens sobre saúde, publicidade de remédios, clínicas etc.

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