Estadão defende combate a notícias falsas fazendo comparações rasas

Em editorial, jornal elogia propostas de outros países, deixando de fora críticas e sem se aprofundar nos riscos que medida traz podendo colaborar com o ativismo político mascarado em Justiça  

Mãos de adolescente Foto: Agência Brasil

 
Jornal GGN – No editorial deste domingo (07) o Estadão se manifestou sobre um tema que vem crescendo no Brasil e no mundo: o combate às notícias falsas – ou fake news. O jornal avalia como positivo o aumento de debate sobre o tema ‘na falta de um marco legal’ no Brasil, que deveria aprender com a Alemanha. Entrou em vigor naquele país, desde o dia 1º de janeiro, uma lei que multa em até € 50 milhões empresas caso não retirem de suas plataformas conteúdos impróprios, como discurso de ódio e notícias falsas em até 24 horas após receberem uma notificação da justiça.
 
O Estadão segue a argumentação apontando de forma positiva a proposta anunciada na última semana pelo presidente da França Emmanuel Macron de que irá apresentar ao Parlamento uma nova lei para combater notícias falsas adiantando que seu objetivo é acelerar processos judiciais contra a difusão de fake news. Quanto aqui no Brasil, o editorial lembra que existe o Projeto de Lei (PL) 6.812/2017 que prevê, além de multa, detenção de dois a oito meses para uma pessoa que divulgar ou compartilhar notícia falsa ou “prejudicialmente incompleta” termo este, entre aspas, que o Estadão não observou o quanto torna subjetiva uma acusação. O que seria exatamente uma notícia “prejudicialmente incompleta”?
 
Outra questão não levantada pelo jornal é que na Alemanha a multa recairá sobre as plataformas caso não respondam ao pedido da justiça de retirar a informação em 24h. Portanto, as pessoas, passíveis de cometer erros, são protegidas. No próprio editorial, inclusive, o Estadão retoma uma pesquisa feita pela Ideia Big Data e divulgada pelo Valor Econômico onde todos os entrevistados (homens e mulheres de 30 a 50 anos das classes C e D) admitiram já terem compartilhado inadvertidamente notícias falsas pelo menos uma vez.
 
Já na França, o que o Estadão não comentou é que diversas entidades de direito civil se posicionaram preocupadas com o anúncio de Macron. O jornal Le Monde, por exemplo, publicou em um editorial: “Esse tipo de ambição legislativa, dentro de uma área tão complicada e sobre uma coisa tão crucial como a liberdade de imprensa, é por natureza perigoso”. Já o presidente do Observatório da Deontologia da Informação, entidade que congrega jornalistas e sindicatos, Patrick Eveno escreveu um artigo comparando o arcabouço legal que a França já possui com a proposta de Macron, concluindo que criar uma nova lei seria desnecessária e poderia colocar em risco a liberdade de expressão. Eveno, que também é professor emérito da Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne, propõe que as fake news sejam combatidas com um debate dentro da sociedade e não com mais medidas legais, destacando que a imprensa deve “justificar sua existência social” usando seu papel tanto de vigia quanto de propagador de informações verdadeiras.  
 
O editorial do Estadão também não pontuou que aqui no Brasil está acontecendo um movimento semelhante para combater fake news nas eleições, coordenada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, com um grupo de trabalho envolvendo a Polícia Federal. Segundo publicação do jornal O Globo na última sexta-feira (06), o grupo pretende enfrentar notícias falsas usando a lei de Segurança Nacional, editada em 1983, durante o regime militar. Leia também: PF ameaça usar lei da ditadura contra fake news se outra não for criada
 
O colunista Luis Nassif já vem alertando para o tema, identificando buracos no debate brasileiro:
 
“Nas eleições, haverá várias redes de blogs e perfis de redes sociais disseminando notícias a favor e contra. Haverá notícias falsas e notícias verdadeiras. O Código Penal prevê todo um processo para separar crimes de opinião da liberdade de expressão. Na ofensiva do TSE-PF nada disso será necessário. Bastará um policial ou um procurador dizer que é fake para dar motivo para invasões de domicílio, busca e apreensão e, a partir da quebra de sigilo, o desmantelamento de redes contrárias em pleno período eleitoral. E quem irá definir os alvos? Pessoas e corporações que têm lado político”, conclui. 
 
Leia também: O combate ao fakenews vai oficializar o ativismo político do Judiciário, MPF e PF, por Luis Nassif
 
Veja a seguir o editorial do Estadão na integra:
 
Estadão
 
O combate à notícia falsa
 
Se ainda falta por aqui um marco legal adequado, ao menos cresce a consciência a respeito do tema
 
Editorial
 
Da mesma forma que a evolução tecnológica tornou a informação mais acessível e ampliou os espaços de discussão de ideias – avanços que são especialmente saudáveis para a democracia -, ela também trouxe novos desafios. Caso paradigmático de efeito colateral negativo das redes sociais é a disseminação de notícias falsas que podem, em último termo, colocar em risco o ambiente de liberdade de expressão, fundamental para uma democracia.
 
Sem exagero, deve-se reconhecer que o problema é grave e muito atual. Basta ver o debate, ainda em aberto, a respeito da influência das notícias falsas nas eleições que deram a Donald Trump a presidência dos Estados Unidos. Será que aquilo que é considerado como um dos grandes avanços dos tempos atuais contribuiu para manipular, de alguma forma, a escolha de quem ocuparia um dos cargos políticos mais importantes, se não o mais importante, do planeta?
 
De forma pioneira, a Alemanha apresentou uma possível solução para o problema das fake news. No dia 1.º de janeiro, entrou em vigor uma lei, aprovada em junho do ano passado, que obriga as redes sociais a removerem conteúdos impróprios, como discurso de ódio e notícias falsas, de suas plataformas em até 24 horas após terem sido legalmente notificadas. As empresas que não cumprirem as novas normas poderão ser multadas em até € 50 milhões.
 
A nova lei aplica-se aos sites e redes sociais com mais de 2 milhões de membros. Facebook, Twitter e YouTube serão os principais afetados, mas a regra também poderá ser aplicada ao Reddit, Tumblr, Vimeo e Flickr.
 
Com a entrada da lei em vigor, o governo alemão anunciou que oferecerá formulários digitais para que os cidadãos possam denunciar quando as redes sociais não removerem o conteúdo denunciado dentro do prazo estipulado. Recentemente, o Facebook informou que contratou centenas de novos funcionários na Alemanha para lidar com as denúncias no país dentro do novo marco legal. É um primeiro passo.
 
A França também se mobiliza para combater a disseminação de notícias falsas. Emmanuel Macron, presidente francês, anunciou que irá apresentar um projeto de lei ao Parlamento para dar mais eficiência e rapidez aos processos judiciais relativos à difusão de fake news. O objetivo é aumentar a transparência do conteúdo publicado nas plataformas digitais, obrigando os sites a prestarem informações à Justiça com maior celeridade.
 
No Brasil, há o Projeto de Lei (PL) 6.812/2017, que prevê detenção de dois a oito meses, além do pagamento de multa, para quem divulgar ou compartilhar notícia falsa ou “prejudicialmente incompleta” por meio da internet. No momento, o projeto está na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara.
 
Se ainda falta por aqui um marco legal adequado, ao menos cresce a consciência a respeito do tema. Recentemente, foi divulgada pelo jornal Valor Econômico pesquisa qualitativa, feita pela empresa Ideia Big Data, que detectou entre eleitores brasileiros de diferentes preferências partidárias uma preocupação com a proliferação de notícias falsas e o receio de eles próprios compartilharem inadvertidamente informações inverídicas.
 
Realizada em São Paulo e no Recife, a pesquisa tinha o objetivo de apurar expectativas em relação às eleições de 2018. Foram feitos dois grupos com homens e mulheres de 30 a 50 anos das classes C e D. Nos dois grupos constatou-se um sentimento generalizado de reprovação à disseminação de notícias falsas. Ao mesmo tempo, diversos participantes da pesquisa reconheceram que já compartilharam inadvertidamente notícias falsas pelo menos uma vez.
 
É, portanto, um problema ardiloso: é possível ter consciência dele e mesmo assim contribuir para a sua propagação. Por isso, pode ser útil aprender com a Alemanha, já que uma boa multa é, muitas vezes, o estímulo mais eficaz para que se adote a conduta correta.
 
 
Redação

6 Comentários

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  1. Prezado Mouro
    Bom dia
    A

    Prezado Mouro

    Bom dia

    A judicialização da Fake News fere gravemente a liberdade de expressão !!!

    Concordo com a regulação, porem tem que haver participação popular nesse debate !!!

    Como no Brasil estamos carentes de democracia, estou cético !!!

    Abração

  2. Quem mais mente e manipula
    Quem mais mente e manipula tolos e desavisados de boa-fé é a grande imprensa. Dê a isso o nome que quiser. De forma estratégica usam do berrante para tanger bois alegres vestidos de verde e amarelo.

  3. Sugestão
    Um post permanente para que se possa registrar diariamente as “jogadas” da velha imprensa (e suas filiais) travestidas de notícias.
    Com o início da corrida eleitoral vai ser uma festa.
    Se não for assim vai sobrar para os blogs e sites alternativos.
    Alguém duvida quem é o alvo dessa marmelada?

  4. Nem precisa de tanto.
    É só se

    Nem precisa de tanto.

    É só se debruçar sobre os comentaristas de jornal a soldo, que tomam o espaço das matérias e reportagens, essas coisas aí que pegam qualquer coisa torta e ficam girando, girando, vociferando.

    O cara das ruas repete o comentário.

    E como disse um amigo meu, o fato é diferente do comentário sobre o fato. Simples.

    Simples?

     

     

  5. O estadão foi editor de uma das tralhas mais levianas da imprens

    o jornal da tarde, em que pese alguns suplementos, editorialmente foi um dos períodicos mais levianos e exagerados. Como sua venda era quase toda direcionada para bancas, dava impressão que concorriam com o notícias populares (grupo folha). Apesar do NP ser conhecido como “espreme sai sangue” o JP muitas vezes tratava o noticiário política/polícia com doses demagógicas e levianas. Lembro bem à época da escola Base (SP) nos anos 90 onde a globo teve de pagar multa milionária, mas jornais como o JP que diariamente massacravam os donos da escola, apenas afundou um pouco mais no caminho que o levou ao ocaso e posterior encerramento. O mal maior estava feito: ajudou a abrir caminho para a maledicência e leviandade na imprensa brasileira moderna, este sim um dos pais do fake news.

  6. Era PT

    Durante os governos Petistas qualquer regulação da mídia, os Jornalistas gritavam que era “Comunismo”. Agora querem eliminar as supostas “Fake News”, com punições extremamentes sumárias. Isto não é regulamentar a mída?

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