A emergência do Estado palestino

Do Envolverde

17/02/2011 – 10h02
Forçados a mudar a jogada

Por Mel Frykberg, da IPS

Ramala, Cisjordânia, 17/2/2011 – A revolta popular do Egito e o assédio que sofrem outros regimes árabes da região obrigam dirigentes palestinos a mudarem a jogada no tabuleiro político “Não há retorno. Se forja um Estado palestino”, disse à IPS o especialista Samir Awad, da Universidade de Birzeit, perto de Ramala. “Restam poucos meses para o nascimento de um Estado palestino independente. Logo se integrará à Organização das Nações Unidas e será um membro como outro qualquer da comunidade internacional”, acrescentou.

Há algumas semanas, a Autoridade Nacional Palestina treme até a raiz ao ver como vários países árabes, governados por regimes autocráticos e ajudados pelo Ocidente, são sacudidos pelos protestos populares. As capitais vivem revoltas sem precedentes que fazem cambalear os governantes. A ANP se nega, há vários anos, a organizar eleições legislativas apesar das reiteradas promessas de fazê-lo. O mandato do presidente Mahmoud Abbas terminou em janeiro de 2009.

SeugSeu governo, com sede em Ramala, tentou desesperadamente evitar na Cisjordânia protestos de rua em apoio às revoltas na Tunísia e no Egito, e anunciou grandes mudanças democráticas em uma tentativa de melhorar sua credibilidade junto à população. A ANP anunciou, no dia 14, a dissolução de seu gabinete, após a decisão da semana passada de organizar eleições em setembro, mês fixado para a criação do Estado palestino.

O primeiro-ministro, Salaam Fayyad, disse que a ANP apresentará, em setembro, o assunto no Conselho de Segurança da ONU. As autoridades preparam e consolidam há dois anos as instituições estatais. “A ANP está preocupada com os acontecimentos no Egito e na Tunísia e tenta evitar uma situação semelhante na Cisjordânia”, território palestino que controla, explicou Samir. As mudanças no gabinete são uma tentativa de reforçar a imagem de Abbas perante a população palestina, descontente com seu trabalho.

A queda de Hosni Mubarak no Egito significou para a ANP a perda de um aliado contra o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica), que controla o território palestino de Gaza, e a obrigou a reagir. “Em Gaza, sofremos muito sob o regime de Mubarak”, disse Ahmed Yussef, assessor político do dirigente do Hamas, Ismail Hanniyeh. “Um Egito forte, democrático e independente, fortalecerá a unidade árabe”, disse à IPS.

“Não há dúvidas de que é bom para o Hamas a queda do sócio de Israel no bloqueio contra Gaza, e o fortalecimento da Irmandade Muçulmana do Egito, da qual é próximo ideologicamente, após a revolta popular”, disse à IPS o professor Moshe Maoz, da Universidade Hebreia de Jerusalém.

A situação do Egito também supõe uma pressão sobre as próprias autoridades do Hamas em Gaza, que se negaram a participar das eleições previstas pela ANP para setembro, por considerarem que são ilegais e organizadas por um governo vencido e sem representação. A popularidade do Hamas também caiu desde que venceu as eleições legislativas em 2006.

“Ao contrário do Egito, a ANP não sofre uma pressão social e econômica que a obrigue a se reformar, pois Fayyad promoveu o surgimento de uma classe média com recursos econômicos. No entanto, deve realizar mudanças políticas”, explicou Samir. “Por outro lado, o Hamas sofre uma pressão econômica pela extrema pobreza dos moradores de Gaza. O governo teme que o crescente mal-estar pela situação no território possa gerar distúrbios, o que é um grande incentivo para que trabalhe com vistas a uma reconciliação”, acrescentou.

Os acontecimentos na Tunísia e no Egito obrigaram o Fatah, que controla a ANP, e o Hamas a reavaliar suas respectivas posições. Os dois partidos rivais consideram que melhoraram de forma significativa as possibilidades de reconciliação. “As autoridades da Cisjordânia têm um novo discurso. Mubarak foi responsável, em grande parte, pela inflexibilidade de Abbas”, disse Ahmed.

Ghassan Jatib, porta-voz de Abbas, disse à IPS que, sejam quais forem as novas autoridades do Egito, elas apoiarão a unidade palestina, porque a população sempre defendeu suas reclamações. Moshe também acredita que as chances de reconciliação entre Hamas e Fatah melhoraram com a conjuntura nacional. Além disso, os dois partidos palestinos creem que a maior pressão sobre Israel, pois os Estados Unidos se veem obrigados a ouvir a opinião dos árabes, trará benefícios políticos.

Também acreditam que a queda de um regime árabe apoiado por Washington beneficiará a causa palestina. “Os Estados Unidos já não podem contar com apoio árabe”, disse Ahmed à IPS. “Acreditamos que a população árabe apoiará muito mais os palestinos do que fizeram os regimes que caíram, carentes de representação popular”, disse Ghassan à IPS. Porém, os partidos palestinos independentes e de esquerda se mantêm céticos.

Jamil Mezher, da Frente Popular de Libertação da Palestina, acusou Fatah e Hamas de “se entrincheirarem atrás de interesses partidários e não deixarem outra opção aos palestinos que não seja a de fazer a revolução”. As pessoas “reclamam o fim das divisões”, mas os líderes são surdos, disse Jamil. “Milhares de pessoas deram suas vidas, dezenas de milhares foram detidas e ficaram feridas lutando pela liberdade e pela independência. Não aceitaremos o contínuo fracasso de nossos líderes”, acrescentou. Envolverde/IPS

(IPS/Envolverde)

http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=86984&edt=1

Luis Nassif

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