Insper estuda concessão bolsas a alunos de baixa renda

Por Toni

“Precisamos de engenheiros com cabeça mais aberta”, diz presidente do Insper

ÉRICA FRAGA

DE SÃO PAULO, Folha de S.Paulo

O economista Claudio Haddad se orgulha de ter erguido o Insper, respeitada instituição de ensino superior em economia e administração, mas não gosta do rótulo de “escola só para ricos”.

“Não é. E a gente nem quer que seja”, afirma.

Apesar da mensalidade cara (R$ 3.050), o Insper tem um abrangente fundo para conceder bolsas restituíveis, de até 100%. O problema, diz Haddad, é que a demanda por parte dos estudantes de renda menor é baixa.

Para aumentar a diversificação do campus do Insper –que não tem fins lucrativos–, Haddad estuda reservar parte das vagas para alunos de escolas públicas, classificados com base em notas do Enem. A ideia, no entanto, ainda está em gestação.

Enquanto não atinge esse objetivo, Haddad amplia o escopo do ensino do Insper. A partir de 2015, oferecerá cursos de engenharia, com foco em empreendedorismo. “O mundo atual precisa de pessoas com cabeça multidisciplinar e aberta. Hoje, um engenheiro não é só quem dá uma opinião técnica.”

Para viabilizar o projeto, o economista levantou R$ 84,5 milhões junto à iniciativa privada, superando a previsão.

Sobre a economia, vê risco de que as incertezas provocadas por ações do governo condenem o país a taxas de crescimento entre 2% e 3%.

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Folha – O que atraiu o sr. para a área de educação?

Claudio Haddad – Sempre achei a educação muito importante. Eu sou filho de professores. Estudei engenharia, mas tenho um doutorado em economia e foi à economia que eu dediquei minhas atividades. Também sou preocupado com o desenvolvimento econômico da sociedade.

A educação é sem dúvida um dos principais fatores que aumentam a produtividade e tornam os cidadãos mais eficazes e, consequentemente, melhoram as instituições e uma série de outras coisas que também resultam em um maior crescimento e desenvolvimento econômico.

Por que o sr. transformou o Insper em uma instituição sem fins lucrativos?

Achava importante deixar um legado para o país. Os dois modelos [com fins lucrativos e sem fim lucrativos] são válidos. Mas há diferenças. Nas instituições com fins lucrativos o foco tem de ser em algo que dê rentabilidade, ao passo que o sem fins lucrativos busca rentabilidade social.

Qual será o modelo dos cursos de engenharia do Insper?

A ideia é trazer a tecnologia para complementar toda nossa área de gestão, economia, liderança, empreendedorismo. Achamos que essa combinação é muito interessante. Acho que, para a cidade de São Paulo, seria muito importante esse projeto. O nosso objetivo é formar engenheiros empreendedores.

Como se diferenciar do curso tradicional de engenharia?

Primeiro, é um novo modelo de ensino de engenharia, que segue o modelo de uma faculdade nova nos EUA, chamada Olin, em que o engenheiro se envolve em projetos desde o início, tem curso de empreendedorismo.

Esse é um modelo que falta no Brasil. O curso de engenharia hoje é bastante teórico. Há um alto grau de abandono durante o curso e poucos engenheiros trabalham com engenharia após se formar.

O mundo atual precisa de pessoas com cabeça multidisciplinar e aberta. Hoje, um engenheiro não é só quem dá uma opinião técnica. Precisa entender o que é importante para a sociedade.

A captação de recursos privados para viabilizar esses novos cursos já terminou?

Precisávamos de R$ 80 milhões e arrecadamos R$ 84,5 milhões. Agora, vamos entrar em uma nova fase, em que podemos aceitar novas doações, como de equipamentos para montagem de laboratório, e de recursos para o fundo de bolsas.

Como funcionam as bolsas?

Hoje temos uns 110 alunos com bolsa, de cerca de 1.500 [na graduação]. As bolsas variam de 30% a 100%. A bolsa média é em torno de 65%. Hoje, nenhum aluno deixa de estudar no Insper por problema financeiro.

O Insper poderia então oferecer mais bolsas?

Poderia. Eles só precisam passar no vestibular.

E por que o número de bolsistas não é maior, então?

Infelizmente, o modelo brasileiro é muito concentrador. As melhores escolas são privadas e algumas cobram uma mensalidade que não é muito distante da nossa.

Por isso muitos alunos desconhecem a existência do programa de bolsas. Acham que o Insper é escola só para ricos. Não é. E a gente nem quer que seja. Justamente por isso temos esse programa, que já deu muitas bolsas, inclusive de 100%.

Estamos de portas abertas para qualquer aluno que mostre capacidade para entrar, independentemente de sua situação financeira.

O problema é que você tem uma quantidade pequena. Se houvesse mais alunos mais bem preparados, talvez houvesse um número maior de candidatos. Também há alunos bons de outros Estados que, por causa do vestibular, precisam vir até aqui. Isso torna o custo maior.

Existe alguma iniciativa para ampliar a fatia de bolsistas?

Estamos considerando reservar um percentual das vagas com base nas notas no Enem. Mas é uma ideia em estudo. O problema é que o Enem, hoje, é pouco prático para nós, porque seu resultado sai muito tarde.

É verdade que o sr. tem aversão a recursos públicos?

[risos] Não, isso é mito. Acho que a coisa funciona mais com o dinheiro privado.

Se as pessoas estão botando dinheiro naquele projeto, é porque o projeto é realmente importante. Não que o governo não faça coisas importantes. Mas é diferente. Você no governo está gastando o dinheiro de outras pessoas. Então, você tem considerações políticas que não levam em conta apenas a eficiência daquele projeto.

Agora, em certas áreas –como verbas para pesquisa–o dinheiro público é importante, e nós pegamos.

O sr. acha que a economia brasileira vai mal?

Acho que o diagnóstico está muito voltado para a demanda. Mas o problema maior do Brasil hoje é oferta.

Há uma série de gargalos que precisariam ser enfrentados. Estamos ainda sendo beneficiados pelo bônus demográfico, mas isso vai acabar em umas duas décadas. Então, mais do que nunca é importante continuarmos com aquele processo de reformas.

Isso, infelizmente, no segundo mandato do governo Lula, deu uma parada. Agora, aparentemente, o governo está com boas intenções. Mas, na prática, os resultados ainda não têm acontecido.

E a ênfase grande em demanda se provou, até agora, errada e pode gerar problemas para o futuro. A combinação de políticas macroeconômicas que nos deu estabilidade é uma coisa muito importante, que deveria ser mantida.

O chamado tripé macroeconômico está sendo abandonado?

Não acho que esteja sendo abandonado, mas as decisões do governo têm provocado muita incerteza no mercado e nos investidores.

Está havendo uma flexibilização excessiva do tripé, principalmente na área fiscal, em função dessas manobras contábeis para garantir um superavit. Isso tem gerado muito ruído. Na prática, a inflação continua muito controlada. As contas públicas ainda parecem em ordem. Mas é uma tendência não muito encorajadora.

A prioridade deveria ser melhorar a produtividade. As condições de oferta são melhoradas com reformas e melhoras em infraestrutura, ambiente de negócios favorável, menos incerteza regulatória. A educação também é fundamental. Precisamos de gente capaz.

O que poderá ocorrer se essas reformas não forem feitas?

Acho que tem muita coisa boa andando no Brasil. A economia não vai entrar em colapso. Mas acho que talvez a gente continue com crescimento baixo, em torno de 2%, 3%. Para o Brasil, é muito baixo. Acho que o Brasil pode ter perfeitamente uma taxa de crescimento em torno de 5%.

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IDADE

66 anos

FORMAÇÃO
Ph.D em economia pela Universidade de Chicago

CARREIRA
Sócio e diretor superintendente do Banco Garantia (1983-98). Diretor do Banco Central (1980-82). Atualmente, presidente do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa (antigo Ibmec São Paulo)

Luis Nassif

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