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O alto custo de negligenciar o fortalecimento das instituições ambientais, por Wallace Lopes

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, afirmou, em entrevista à CNN, que a mobilização dos servidores do Ibama é preocupante.

Ibama – Vincent Kurt

ECONOMIA MÍOPE

O alto custo de negligenciar o fortalecimento das instituições ambientais

por Wallace Rafael Rocha Lopes*

Marcado por uma drástica redução nas atividades essenciais da área ambiental federal, incluindo Ministério do Meio ambiente (MMA), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Serviço Florestal Brasileiro, o início de 2024 revelou um cenário preocupante para o meio ambiente e para o governo brasileiro.

O balanço dos três primeiros meses de 2024, de intensas mobilizações por melhorias nas condições de trabalho e na estrutura de carreira, divulgado nesta semana pela Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA (Ascema Nacional), revela uma drástica redução na emissão de licenças e autorizações, no fluxo de importação de veículos, assim como nos autos de infração relacionados à fiscalização ambiental, especialmente na Amazônia Legal.

Licenciamento Ambiental

De janeiro a março de 2024 o Ibama emitiu apenas 41 licenças e autorizações ambientais, enquanto no mesmo período, em 2023, foram emitidas 476, uma redução de 91,4%. No que concerne às obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), houve uma diminuição de 68 licenças e autorizações emitidas no primeiro trimestre de 2023 para apenas 11 no mesmo período de 2024, todas de empreendimentos que já estavam em funcionamento. No setor de petróleo e gás, a queda foi ainda mais drástica, de 17 em 2023 para apenas uma em 2024.

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, afirmou, em entrevista à CNN, que a mobilização dos servidores do Ibama é preocupante. Isso porque entre os projetos impactados pelo movimento estão quatro novas termelétricas, três parques eólicos, dois gasodutos para distribuição de gás natural, 10 linhas de transmissão de energia, cinco pedidos de pesquisa sísmica e cinco de perfuração de poços de petróleo.

O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) estima a perda de R$ 3,4 bilhões em faturamento pela demora na emissão de licenças. Estimam ainda que R$ 650 milhões deixaram de ser investidos pelo atraso nos processos de licenciamento de pesquisa, além de uma perda de R$ 470 milhões em arrecadação pública por mês com tributos diretos e indiretos. Há também a perda de R$ 485 milhões por mês em royalties e participações especiais que poderiam eventualmente ter sido pagos. Tudo isso apenas no setor de petróleo e gás.

Comércio Exterior

No setor de controle de importações e exportações, estima-se que haja ao menos 60 mil automóveis de várias origens parados em áreas portuárias do Brasil, aguardando a certificação de adequação às exigências ambientais brasileiras por parte do Ibama. Somente a Associação de Fabricantes de Automóveis argentina (Adefa) aponta 18 mil veículos parados em portos brasileiros aguardando a resolução da situação.

A AIMEX, representando as indústrias exportadoras de madeira do Pará, e a FIERO, da indústria rondoniense, expressaram recentemente preocupação quanto ao atraso na liberação de licenças e autorizações para embarque de madeira. Segundo essas associações, a morosidade do processo está causando perdas financeiras, visto que a incapacidade de honrar contratos resulta no cancelamento de pedidos por parte dos importadores.

Fiscalização Ambiental

Na área de fiscalização ambiental, considerando todo o território do país, a emissão de Autos de Infração pelo Ibama reduziu 67,65%. O valor total das multas lavradas pelo Ibama acompanhou essa tendência de queda, reduzindo quase 70%, de R$ 883 milhões no primeiro trimestre de 2023 para R$ 273 milhões no mesmo período de 2024. Nas infrações relacionadas ao combate ao desmatamento ilegal na Amazônia Legal, a redução foi de aproximadamente 82%, caindo de 2.381 no primeiro trimestre de 2023 para apenas 437 em 2024.

Economia Míope

Estes são apenas alguns exemplos de como esse impasse entre governo e servidores vai muito além de uma mera discussão trabalhista. Com os órgãos ambientais em marcha lenta, os prejuízos de ordem financeira, política, ecológica e social são certos como o amanhecer e claros como a luz do sol. Estamos falando aqui da imagem do país, de perdas bilionárias em faturamento, de investimentos não realizados, e de uma diminuição significativa na arrecadação de tributos e royalties. É o desenvolvimento sustentável de um país inteiro que anseia por geração de emprego e renda, que depende de instituições ambientais realmente estruturadas e fortalecidas. Essa é a principal luta dos servidores.

Esse vácuo na proteção ambiental do país está comprometendo esforços nacionais e internacionais de conservação e certamente prejudicará a reconstrução da imagem do Brasil como liderança climática no cenário internacional. Portanto, desconsiderar o fortalecimento das instituições ambientais é um equívoco que tem um custo elevadíssimo, muito maior que o eventual impacto financeiro de acolher integralmente as reivindicações dos servidores.

Da Insensibilidade à Insensatez

No último governo, é importante lembrar, os servidores da área ambiental federal desempenharam um papel heroico de resistência contra os retrocessos ambientais, enfrentando inúmeros casos de assédio moral, institucional e perseguições. Em 2023, já com o novo governo, os servidores reconstruíram a agenda ambiental brasileira, arregaçaram as mangas e, com a mesma estrutura herdada do governo anterior, colocaram as botas na lama e entregaram um dos melhores resultados do ano de 2023 do governo Lula: uma redução de 50% no desmatamento na Amazônia. Só no Ibama foram instaurados 15.529 processos de infração ambiental em 2023, totalizando mais de R$ 4 bilhões em multas. A arrecadação no órgão aumentou 12% em 2023 em relação ao ano anterior, totalizando mais de um bilhão de reais.

Por esse contexto, tudo o que os servidores NÃO esperavam era um processo de negociação que beira o absurdo, tanto pela sua demora quanto pelo conteúdo das propostas apresentadas até o momento que, em determinadas situações, impõem até retrocessos como a redução do salário de entrada na carreira, que já é um dos mais baixos do serviço público federal.

A valorização dos servidores ambientais é imperativa, e o Brasil não pode se dar ao luxo de negligenciar todo esse potencial humano que desempenha um papel central na gestão e proteção do meio ambiente. A história mostra que a eficácia na proteção ambiental e o cumprimento de compromissos internacionais dependem diretamente da capacidade, da motivação e do reconhecimento desses profissionais.

O impasse atual é sintoma de uma visão obtusa de curto prazo que desconsidera o investimento no fortalecimento das instituições ambientais como essencial para o bem-estar econômico, ecológico e social do Brasil e do mundo. Nesse jogo, enquanto estão rolando os dados, todos perdem, inclusive você.

* Wallace Rafael Rocha Lopes é analista ambiental do Ibama desde 2009, diretor adjunto da Ascema Nacional; compõe o quadro de agentes ambientais federais e coordenadores de operações de fiscalização ambiental no Cerrado e na Amazônia; e membro da FADS. É mestre em Engenharia Ambiental (UFT) e doutorando em Desenvolvimento Sustentável (UnB).

Para saber mais, assista ao FALA FADS – Cuidar de quem cuida do ambiente: valorização dos servidores é urgente – que foi ao ar em 03/04/2024,

Ameaças como reforma administrativa e arrocho salarial pairam sobre o funcionalismo público brasileiro desde 2016. A volta de um governo progressista ao comando do país não representa céu de brigadeiro para servidoras e servidores. Que o digam as categorias ligadas aos órgãos ambientais, que reivindicam melhorias na carreira, como gratificação por atividade de risco, concurso público para recompor os quadros e reajuste salarial, uma vez que a inflação acumulada é de cerca de 50%, entre outras demandas. Se no governo federal o momento é de mobilização, servidores estaduais Brasil afora também estão se mobilizando. Alguém acha que o governador carioca de São Paulo, por exemplo, abriu a caixa de bondades para o funcionalismo dos órgãos ambientais?

Para ouvir as reivindicações dos servidores ambientais, convidamos:

Mariano Maudet é associado fundador da Associação dos Especialistas Ambientais do Estado de São Paulo (AEAESP www.aeaesp.org.br), tendo sido presidente-diretor da gestão 2022-2023 e atualmente é vice-diretor de Políticas Profissionais da AEAESP na gestão 2024-2025. Bacharel e licenciado em biologia pela USP. Mestre em Conservação de Fauna pela UFSCar e Fundação Parque Zoológico de São Paulo. Especialista em Gestão Ambiental pela UFSCar. Especialista Ambiental da Secretária de Infraestrutura, Meio Ambiente e Logística do Estado de São Paulo. Atuou no Comitê de Bacia Hidrográfica do Tietê Jacaré (CBH-TJ);

Nilto Tatto é ambientalista e deputado federal pelo PT/SP, coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista e premiado como melhor parlamentar na categoria “Clima e Sustentabilidade” no Prêmio Congresso em Foco.

Tania Maria de Souza é socióloga e analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima;

Wallace Rafael Rocha Lopes é diretor adjunto da Ascema Nacional, sendo analista ambiental do Ibama desde 2009, onde já atuou em diversas áreas. Compõe o quadro de Agentes Ambientais Federais e Coordenadores de Operações de Fiscalização Ambiental no Cerrado e na Amazônia. É bacharel e mestre em Engenharia Ambiental (UFT) e doutorando em Desenvolvimento Sustentável (UnB);

A mediação por Edna Della Nina, jornalista, feminista e dirigente do PT em Paulínia (SP) e membra da FADS.

Fala FADS – Toda quarta, das 18hs às 20hs, na TV GGN.

#ASCEMANacional #ASCEMA #Ibama #Ibama35anos #ReestruturaçãoJá #10anosdeabandono 

#FrenteAmplaDemocráticaSocioambiental #FADS #Socioambiental #MeioAmbiente #TvGGn #GGn #RodaFADS #FalaFADS #FrenteAmplaDemocráticaSocioambiental #FADS

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7 Comentários

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  1. No alvo! Completa e excelente análise. Não há política ambiental que funcione sem o reconhecimento daqueles que trabalham diariamente na defesa de um meio ambiente saudável a todos.

  2. Não tem Floresta, não tem Cerrado sem servidor Valorizado! @LulaOficial @edweck_rj @Haddad_Fernando @gestaogovbr @govbr #ibama #meioambiente #icmbio #reparaçãohistórica #reestruturação #10anosdeabandono

  3. Os servidores da carreira ambiental, Ibama, ICMBio, MMA, SFB, são responsáveis por atividades que possibilitam o desenvolvimento racional da economia do Brasil. Produção de petróleo e gás, mineração, geração e distribuição de energia elétrica, silvicultura, pesca e comercialização de recursos marinhos, fabricação e importação de veículos etc., tudo isso depende da atuação dos servidores da carreira ambiental, sem contar com o combate ao desmatamento e tráfico de animais. Para poderem atuar em todas essas áreas, com eficiência e segurança, os servidores precisam ser valorizados e reconhecidos, o que ainda não está acontecendo!

  4. Parabéns pela reportagem! No último governo, os servidores ambientais federais desempenharam um papel heróico de resistência contra os retrocessos ambientais. Agora é momento de reestruturar minimamente a carreia ambiental para que os órgãos não se esvaziem ainda mais.

  5. Parabéns pela matéria e parabéns Wallace pela clareza na exposição da importância do servidor ambiental para nosso país. Para nossa soberania!

  6. Excelente matéria! Parabéns, Wallace Lopes! Imediatismo não constrói nação. E sem servidor público qualificado não há boa execução de políticas públicas. Já passou da hora da sociedade, seus representantes e dirigentes entenderem o papel central do art. 225 da Constituição Federal como protetor de TODAS as riquezas do país, não somente do meio ambiente!

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