Tráfico usa clubes de futebol para lavagem de dinheiro

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – Esporte e drogas não combinam. A infeliz associação acontece, no entanto, quando traficantes de drogas passam a utilizar clubes para lavagem do dinheiro obtido nas transações. E antes que se entenda mal são equipes da Europa e da América Latina as vítimas do ilícito. Investigações levam à Sérvia, ao México, à Colômbia e à Bulgária, pode escolher o roteiro pois eles já chegaram antes. O Estadão, em trabalho realizado por Jamil Chade, conseguiu documentos que revelam a sombria realidade do futebol. Leia a matéria a seguir.

do Estadão

Clubes são usados para lavagem de dinheiro do tráfico

JAMIL CHADE / GENEBRA – O ESTADO DE S.PAULO

Investigações apontam que equipes da Europa e da América Latina estão sendo utilizados por traficantes de drogas

Do México à Sérvia, da Colômbia à Bulgária, autoridades e polícias revelam uma realidade sombria do futebol: a transformação de clubes em instrumentos para a lavagem do dinheiro obtido com o tráfico de drogas. Documentos obtidos pelo Estado a partir de investigações na Europa e nos EUA apontam que organizações criminosas e cartéis tem se usado do esporte como um mecanismo para legitimar a renda ilegal.

Em novembro, a Justiça americana colocou o presidente de um clube da primeira divisão da Colômbia, o Envigado, na lista das pessoas procuradas por fazer parte de cartéis da droga. Segundo os documentos, o clube era usado pelo dirigente para lavar o lucro do narcotráfico. Foi no Envigado que James Rodríguez, artilheiro da Copa do Mundo do Brasil, foi revelado em 2007, com apenas 15 anos.

Em 2011, a Justiça da Colômbia revelou como US$ 1,5 bilhão do narcotráfico haviam sido lavados por vários clubes, entre eles o Santa Fé, de Bogotá.

A história do futebol colombiano se confunde com o fortalecimento dos cartéis, principalmente a partir dos anos 80. Na época, o chefe do Cartel de Medellín, Pablo Escobar, investiu milhões no Atlético Nacional. No final daquela década, o time venceria a Copa Libertadores.

O problema também é comum no México. Em fevereiro do ano passado, o cartola Tirsco Martinez foi preso em sua casa em León, usando outro nome. As autoridades americanas chegaram a oferecer US$ 5 milhões para quem desse pistas do paradeiro do traficante. Segundo a investigação, entre 2000 e 2003, Martinez “importou, transportou e distribuiu cerca de 76 toneladas de cocaína no mercado americano”.

Mas ele também era o responsável por “organizar a lavagem e envio de milhões de dólares das drogas ao México. Para isso, ele usava três clubes: Atletico Celaya, o Irapuato FC e o Querétaro, time que contratou Ronaldinho Gaúcho.

Em 2004, a Federação Mexicana tentou limpar o esporte e dissolveu o Querétaro e o Irapuato. Outros clubes que estariam sendo usados pelo narcotráfico, segundo a investigação, são Necaxa, Santos Laguna, Puebla e Salamanca.

Assassinatos. Mas o envolvimento da droga no futebol não se limita à América Latina. Em 2012, uma operação na Itália contra a Máfia revelou que times de divisões inferiores eram usados para lavar dinheiro.

A Ndrangheta, máfia que atua na Calábria, teria usado dois clubes da região de Salerno, no sul da Itália – o Cittanova Interpiana e o Sapri Calcio – para transferir seus recursos da droga. Os times, das divisões inferiores, tiveram todos seus recursos confiscados e tentam recomeçar do zero.

No ano passado, quando a polícia italiano fechou o cerco contra um dos chefes da Máfia, Francesco Pesce, descobriram que ele também controlava o time do Rosarnese e que acabou ficando sem “patrocinador”.

“Chefes da máfia são executivos de clubes, influenciam o esporte e usam o futebol”, declarou Pierpaoli Romani, autor do livro Calcio Criminale. Segundo ele, a Máfia está interessada principalmente nos clubes italianos da Série C e D, onde a visibilidade é menor em termos da imprensa nacional. Mas, ainda assim, garante um ingresso a um mundo legalizado.

Romani, porém, conta como a Lazio e o Palermo foram alvos de uma tentativa da Máfia de entrar na primeira divisão.

No Leste da Europa, nos anos 90, em plena guerra nos Bálcãs, paramilitares sérvios usavam o futebol para lavar dinheiro da droga. O que as investigações hoje apontam é que o fenômeno ainda perdura e atinge toda a região. Clubes da Albânia, Montenegro e Bósnia tem sido alvo de frequentes investigações.

Na Bulgária, 15 cartolas da primeira divisão foram assassinados em dez anos, muitos deles em acertos de contas por disputas do controle do tráfico.

Na Ucrânia, as autoridades apontam que dois clubes servem de base como “sede de gangues do crime organizado”. Um deles é o Zakarpattya que, numa ação da polícia, encontrou 36 homens armados dentro da dependência do clube e relacionados com o tráfico de drogas.

Um documento da Financial Action Task Force, entidade ligada à OCDE em Paris, confirma a suspeita das polícias: “o futebol é usado como veículo para perpetuar outras atividades criminais”, entre elas o comércio ilegal de drogas.

Segundo o estudo, a falta de controle sobre clubes, a falta de exigência de resultados, a falta de transparência e o dinheiro movimentado pelas equipes são elementos fundamentais para entender os motivos pelos quais cartéis escolheram o futebol para lavar dinheiro.

Mas o futebol não seria apenas usado por traficantes para fins financeiros. Para muitos, se transformar em cartola seria também um meio de entrada na sociedade de forma legítima.

“O esporte pode ser um caminho para que criminosos se transformem em celebridades ao associar com pessoas famosas e entrando em círculos poderosos dentro da sociedade estabelecida”, indica a OCDE. Um ingresso à sociedade com um elevado preço para o futebol e, principalmente, para a guerra contra as drogas.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

9 Comentários

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  1. o  esporte  isso  nao me

    o  esporte  isso  nao me causa  espanto, ja que  dirigentes de  clubes  adoram o dinheiro  facil, venha  de onde  vier,para  eles o que importa  é  ganhar,  Talvez se  houver  maior  investigaçao  pode-se  chegar  ate  a tal da  fifa  ja que  aqui no Brasil  ela  foi  desmascarada  e por  fim nao  deu em nada.  mais  pelo menos  seu manto  caiu. 

  2. Panis Et Circenses

     

    Bom Senso FC pede veto a MP que perdoa dívidas

    Band UOL | 18/12/2014

    “(Perdoar as dívidas dos clubes) distancia cada vez mais o futebol brasileiro do profissionalismo e da modernização”, diz movimento de jogadores

    O Bom Senso FC se pronunciou nesta quinta-feira, por meio seu perfil no Facebook, reivindicando um veto presidencial à Medida Provisória 656/2014 – por conta de uma emenda de autoria do deputado federal Jovair Arantes (PTB-GO) e do senador Romero Jucá (PMDB-RR), que inclui o refinanciamento das dívidas dos clubes de futebol em seu texto, porém, “sem exigir nenhum tipo de contrapartida por parte dos dirigentes” – como reclama o movimento de jogadores.

    “Parcelar as dívidas dos clubes sem contrapartidas não significa salvá-los; muito pelo contrário, uma medida como essa continua pavimentando o caminho para o abismo, distanciando cada vez mais o futebol brasileiro do profissionalismo e da modernização”, diz o Bom Senso FC, em nota oficial.

    A MP 656/2014 já tem a aprovação dos deputados e, agora, o texto vai para o Senado. Para que vire lei, o projeto depende de uma sanção da presidente Dilma Rousseff.

    Confira a nota do Bom Senso FC sobre o tema:

    “Veto presidencial contra o golpe armado pela bancada da bola.

    Após mais uma rodada de reuniões em Brasília, realizada nos dias 9 e 10 de dezembro, chegamos a um bom termo de acordo entre as partes envolvidas na discussão do projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE). Como amplamente divulgado, o Bom Senso FC defende a democracia e a transparência na gestão do futebol, nas diretrizes e nas medidas concretas do projeto de lei.

    Entretanto, às costas da mesa de negociação, uma manobra vergonhosa do deputado Jovair Arantes (PTB-GO) e do senador Romero Jucá (PMDB-RR) incluiu o refinanciamento dos clubes, sem nenhum tipo de contrapartida, através de uma emenda à Medida Provisória 656/2014, que trata de incentivos fiscais à importação de peças para aerogeradores. Isso é conhecido no Congresso Nacional como “contrabando legislativo”, quando uma questão é aprovada junto a outro que não tem absolutamente nenhuma relação. Como sabemos, a dívida dos clubes não contribui em nada para a importação de aerogeradores no Brasil.

    A MP 656 já foi aprovada na Câmara e no Senado, com essa emenda idealizada pelo deputado Jovair. Isso representa uma virada de mesa vexatória nos debates da LRFE.

    Reiteramos que parcelar as dívidas dos clubes sem contrapartidas não significa salvá-los; muito pelo contrário, uma medida como essa continua pavimentando o caminho para o abismo, distanciando cada vez mais o futebol brasileiro do profissionalismo e da modernização.

    Diante dessa situação, o veto presidencial é a única medida coerente ao compromisso assumido publicamente pela presidenta Dilma Rousseff e pelo ministro Aloizio Mercadante com a modernização e democratização do futebol brasileiro.

    Bom Senso Futebol Clube

    Por um futebol melhor para todos”

    Fonte:

    http://esporte.band.uol.com.br/futebol/noticia/100000726409/bom-senso-fc-pede-veto-de-dilma-a-mp-que-perdoa-divida-dos-clubes.html

  3. A bola está murcha, mas o bolso está cheio

     

    Futebol é usado para lavagem de dinheiro e tráfico humano, diz estudo

    BBC | 01/07/2009

    Uma investigação em mais de 20 países divulgada nesta quarta-feira conclui que a indústria do futebol está sedo usada por quadrilhas criminosas para lavagem de dinheiro e tráfico de pessoas.

    image

    Os altos valores nas transferências atraem dinheiro de fontes ilícitas

    A Força-Tarefa Financeira – uma agência intergovernamental responsável por rastrear recursos provenientes do crime – afirma que a importância econômica cada vez maior do futebol transformou o esporte em alvo preferencial de quadrilhas de lavagem de dinheiro.

    “O fluxo de muito dinheiro nos esportes tem efeitos positivos, mas também há consequências negativas”, diz o documento. “Há um risco mais alto de fraude e corrupção, dada a quantidade de recursos em jogo.”

    De acordo com a investigação, criminosos em busca de “legitimação” de seus recursos ilícitos cada vez mais compram clubes e financiam a transferência de jogadores e atividades de apostas.

    A força-tarefa conclui que o futebol é especialmente atraente para quadrilhas criminosas porque a estrutura do setor facilita a entrada de recém-chegados. Segundo a investigação, há muitos envolvidos, diversos órgãos legais e muitas vezes falta profissionalismo na administração dos clubes.

    Cultura

    Outra característica que, de acordo com os investigadores, facilita a exploração do setor por criminosos é a enorme necessidade financeira dos clubes, sempre envolvidos em transferências milionárias, nas quais a origem e o destino do dinheiro investido é pouco conhecida ou mesmo desconhecida.

    Por último, o documento aponta características “culturais” do futebol, como a “vulnerabilidade” de alguns jogadores, principalmente os mais novos, a dificuldade de “quebrar a ilusão de inocência do esporte” com investigações profundas, e a “oportunidade de adquirir posições sociais na comunidade” de forma a ganhar credibilidade.

    Além das práticas já citadas, o relatório também levanta casos em que o futebol é usado para levantar dinheiro ilicitamente, com tráfico de pessoas, corrupção, tráfico de drogas e evasão fiscal.

    Os investigadores descobriram que várias técnicas de lavagem de dinheiro são usadas, como pagamento em dinheiro vivo, uso de paraísos fiscais e de “laranjas” e transferências internacionais. Além disso, as operações ilícitas estariam conectadas a outras redes de lavagem de dinheiro, através do setor de segurança, imóveis e apostas online.

    Em suas conclusões, a força-tarefa sugere que os riscos de infiltração de criminosos na indústria futebolística sejam mais divulgados entre os profissionais da área e que mudanças que levem a uma maior transparência sejam implementadas no sistema de transferência de jogadores.

    O relatório também recomenda uma maior colaboração intergovernamental para detectar abusos e práticas ilícitas, além de sugerir que as regulamentações da indústria do futebol sejam mais unificadas, para reduzir as diferenças em regras que atraem criminosos.

    A Força-Tarefa Financeira afirma ainda que a prática de apostas pela internet em esportes merece uma investigação em separado, para que sejam levantadas possíveis irregularidades.

    http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2009/07/090701_futebollavagemebc.shtml

  4. Do tráfico de drogas,do caixa

    Do tráfico de drogas,do caixa dois das empresas,das pirâmides financeiras,tambem conhecidas como “planos de saúde”,do jogo ilegal,das concessões criminosas de canais de TV e por aí vai…Amém?

  5. Grandes cartéis

    Nassif,

    Considero impossível, qualquer ação policial que consiga interromper com o tráfico de drogas e/ou bloquear a influência daqueles grandes cartéis em alguns ramos de negócio, por exemplo o imobiliário, esporte, bancário / financeiro e outros.

    Os grandes traficantes conhecem perfeitamente o caminho das pedras que os levam aos paraísos fiscais, são estruturas de negócio bastante profissionais e com altíssima capacidade de corrupção.

  6. Crime organizado é modus operandi do capitalismo atual

    O crime organizado comanda o capitalismo contemporâneo, este que o jornalista e escritor Roberto Saviano chama de “narcocapitalismo” em seu novo livro ZeroZeroZero (1a. ed, Cia das Letras, 2014). Depois de jogar luz sobre as vísceras da máfia napolitana, da sua Nápoles, no primeiro livro Gomorra (Bertrand Brasil, 2008) – best-seller internacional que já vendeu mais de dez milhões de cópias e foi vertido para o cinema – Saviano tornou-se um homem procurado pelas máfias e, por esta razão, vive clandestinamente e protegido por uma escolta de carabiniere.

    Neste novo livro Saviano – apoiado nas investigações extensas de várias polícias do mundo – amplia o campo de visão, radiografando os percursos da principal mercdoria do narcotráfico, a cocaína; e traça um painel assustador das relações entre drogas, finanças e violência, mergulhando no mundo dos cartéis da Colombia e do México e de suas relações com  máfias da Europa, da África, dos EUA, da Rússia, da Ucrânia, da Ásia, enfim, nenhum país está a salvo das máfias e das suas gangues cada vez mais numerosas e ferozes.

    A ferocidade se aprende, para aprendê-la há cursos de adestramento fornecidos, p. ex. pelo Exército da Guatemala para a formação dos kaibiles, que fizeram a guerra contra os insurgentes revolucionários; e que depois ajudariam a fortalecer organizações criminosas, como Los Zetas, sanguinário braço armado do cartel do Golfo do México; apenas um deles entre centenas de gangues em ação, algumas com milhares de membros, como as Maras, gangues salvadorenhas.

    A lavagem de dinheiro é um desses assuntos que atravessa todo o livro e comprova a audácia, criatividade e capacidade dos barões das drogas e, particularmente, a conivência do sistema financeiro internacional. São muitas as investigações movidas por relações próximas entre bancos e crime organizado em várias partes do mundo, inclusive na City londrina e nos EUA. É como se vivéssemos sob o império do mal – e o pior, por estranha ironia, cada vez mais parece que isto é verdadeiro. Qual a saída? Conhecendo as entranhas do tráfico de drogas, e vendo o tamanho do abismo que temos diante de nós, Saviano – em poucas linhas no final do livro – deixa escapar o inelutável: o único modo de ter algum controle sobre o tráfico de drogas é legalizar.

    Qualquer outra saída é mera ilusão. E o pior é que esta ilusão comanda toda a lógica perversa das polícias militares como a do Brasil e toda a devastadora loucura da violência das gangues, deixando-nos a todos cidadãos – sobretudo os mais vulneráveis – como reféns do crime que, ao fim e ao cabo, comanda o capitalismo. Que nos digam as relações estabelecidas entre ricos empresários brasileiros, políticos e outros criminosos para roubar o patrimônio público – que sempre foi a lógica de largas parcelas das elites do país, desde os primeiros séculos da colonização.

     

  7. Para mim,

    a anedota mais surreal é aquela segundo o qual o presidente de um grande clube brasileiro carioca foi assaltado na saía do estádio, logo ao final do jogo, o que culminou com os larápios levando toda a renda do evento! 

    Dirigentes de clube de futebol se parecem com dirigentes de entes da federação: estão nem aí para o puchero, já que adminstram dinheiro dos outros!

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