Três semanas na Venezuela II – Diário de uma carioca na República Bolivariana, por Júnia Azevedo

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Três semanas na Venezuela

Diário de uma carioca na República Bolivariana

por Júnia Azevedo

PARTE 2

No dia seguinte, nosso destino era a cidade modelo do projeto socialista venezuelano. Considerada a ‘menina dos olhos’ de Chávez, Cidade Caribia foi concebida como parte dos projetos do programa social “Gran Misión Vivienda Venezuela”. De Caracas, levamos meia hora até lá. A localidade fica a mil metros de altura, cercada por montanhas verdes. Apesar de asfaltadas, as ruas não têm calçada. Novos e simples, os prédios têm de quatro a cinco andares. José Martinez, de 48 anos, de origem colombiana, vive lá, há cinco anos. “Morávamos em uma encosta que desmoronou por conta de uma chuvarada. Fomos para um alojamento do governo até sermos transferidos para cá”, contou. “Gosto de morar aqui. É um pouco longe, mas não troco por nada”, afirmou. Acompanhado de sua mulher, Luz, e um casal de filhos pequenos, José nos levou para conhecer a horta atrás do prédio, com pés de pimentão, cebolinha, coentro e o local onde ia plantar milho. “Chávez foi muito bom, mas a verdade é que Maduro não é Chávez”, disse, sobre os problemas de abastecimento. Em seguida nos convidou para conhecer o apartamento. Enquanto Luz preparava arepas de queijo na cozinha, José orgulhosamente nos mostrava a casa: três quartos, dois banheiros, cozinha e área de serviço. Sobre o processo eleitoral de Maduro, explicou: “As eleições adiadas foram as de prefeito e governador. Para a eleição presidencial, falta um ano. As pessoas deveriam esperar”, disse.

De Caracas, decidimos seguir para Barcelona (cidade venezuelana, no estado de Anzoátegui). Mas viajar sem roteiro é um grande desafio na Venezuela. Na internet há pouquíssima informação sobre transportes. Além de as companhias aéreas não fazerem parte dos sites de busca de passagem, as páginas das companhias aéreas e de ônibus dão pouquíssima informação. Por outro lado, há que se reconhecer: o transporte na Venezuela é muito, muito barato! A passagem aérea para Barcelona, a uma distância de 340 Km, custou apenas oito dólares!

No dia seguinte, acordamos cedo para tomar o avião – nos voos domésticos, a recomendação é chegar com três horas de antecedência para garantir o assento! Viajamos por uma companhia aérea nacional, Laser. Na chegada, ainda no aeroporto, fomos aos balcões nos informar sobre voos disponíveis a partir de Barcelona. No aeroporto também alugamos um carro. Era um Cherry já castigado mas, em comparação com os pré-históricos Oldsmobile, Dogde Dart, Mustangs, Landaus e Mavericks que circulam pelas ruas, era um luxo. Seguimos para Puerto la Cruz, que parecia um pouco melhor para se hospedar do que Barcelona. O calor beirava os 36 graus e a cidade era também feia e inóspita. Pelas grades nos bares, dava para ter ideia do nível de violência do lugar.

Entramos em uma oficina mecânica para perguntar sobre a questão de reposição de peças de carro, um dos inúmeros problemas de abastecimento na Venezuela. O dono não quis entrar em detalhes. Disse que trabalhava para o estado consertando caminhões e não queria arrumar problema. Mas explicou que há muito poucas montadoras de carro na Venezuela atualmente, muitas foram expropriadas e outras deixaram o país. “Quase não se fabrica mais nada. As peças são importadas, e, por isso, caríssimas”, contou. Não por acaso os carros estão caindo aos pedaços pelas ruas. Com criatividade, há quem fabrique os próprios componentes. Comprovamos isso, dias depois, com um senhor que nos mostrou como improvisava uma peça com papelão…

Puerto la Cruz fica à beira mar e termina num calçadão, ao lado de uma praia não convidativa. Era um fim de tarde de sexta-feira e havia um concerto de música ao ar livre, promovido pelo governo. O conjunto era bom, mas todas as letras, eu disse TODAS, eram políticas e exaltavam ora a revolução bolivariana, ora Chávez, ora Maduro, ora Simón Bolívar… Um grupo de 30, 40 pessoas, na frente do palco, uniformizado com camisetas vermelhas, dançava e aplaudia efusivamente. O restante das pessoas passeava indiferente, em meio a barraquinhas de artesanato, arepas, pipoca…

No dia seguinte, seguimos para Cumaná, capital do estado de Sucre. A estrada de mão dupla margeava a costa caribenha, numa bela região, cortando o Parque Nacional Mochima. No caminho, pelos baques nos quebra-molas, nos demos conta de que a suspensão do carro estava quebrada. Portanto, se decidíssemos seguir depois para Ciudad Guayana, nosso provável destino, era mais seguro trocar de veículo.

No caminho para Cumaná, mais uma vez, a sensação de voltar ao passado. Na estrada, há pouquísima sinalização, restaurantes abandonados e placas de propaganda destruídas pelo tempo lembram filmes de ficção científica. Só as placas com o rosto de Chávez resistem de pé, ainda assim, corroídas. A paisagem é seca, árida, com arbustos espinhosos. O calor de verão é forte, mas chegamos sem sobressaltos. Logo na entrada de Cumaná, uma pichação no viaduto profetiza: “Declaro que o sangue de Jesus tem poder e salvará minha cidade”.

Na cidade, nos hospedamos no que deve ter sido foi um hotel de alto luxo na década de 90. O Venetur Cumaná é gerenciado pela operadora estatal de produtos turísticos, que expropiou hotéis de redes internacionais, como Hilton, no Governo Chávez. Com poucas ressalvas, o hotel é um bom exemplo de uma empresa pública bem administrada, bom preço e boa qualidade. Tudo correu bem, mesmo contabilizando as duas baratas no hall do hotel.

Com o sinal de internet ainda pior, colocamos o trabalho em dia e fomos até o centro da cidade. Estacionamos entre uma igreja e uma escola, local que nos pareceu seguro, já que a recomendação da empresa de aluguel de carros era de que parássemos em estacionamentos privados, de forma que não roubassem pneus ou peças do carro. Numa lanchonete, perguntamos se havia café e o dono nos indagou: “De onde vocês vêm?” Iniciamos uma conversa e ele então, respondeu: “Pra vocês têm café.” Só entendemos a resposta quando, minutos depois, entraram dois rapazes perguntando o mesmo e ele negou. “Não vou acabar com o meu café. Guardo para os meus clientes. Vocês são diferentes. Dá ver que são gente distinta”, nos confidenciou.

Em 2016, Cumaná foi alvo de violentos saques no comércio e um pelotão de soldados armados estava de prontidão contra qualquer guarimba. Mas a cidade era calmíssima e, para nossa alegria, na praça principal a internet era grátis e funcionava bem. Assim como entender a Venezuela, nos demos conta de que se tornava cada vez mais difícil trocar dinheiro. Havia casas de câmbio na cidade, mas a operação era feita somente por meio de depósito em conta, não em efetivo. “O problema é dinheiro vivo. Não há notas suficientes”, disse o cambista, que “quebrou nosso galho”, trocando uma quantidade pequena com dinheiro do seu próprio bolso.

Do centro histórico rumamos para o aeroporto em busca das informações de viagem. Mais uma vez, sem placas de sinalização, nos perdemos pelo caminho até dar de cara com um aeroporto praticamente desativado. “Agora só tem um voo por semana”, explicou o atendente. Na agência de turismo indicada, outra decepção. Muito preguiçosamente, o rapaz logo nos despachou, dizendo que não tinha informação, computador, nada. Fomos, então, até o escritório da empresa de aluguel de automóvel. Explicamos que queríamos trocar de carro para poder fazer uma viagem mais longa e ele disse que não havia veículos disponíveis. Nos guichês da Avis e Budget, a mesma resposta:. “Os carros estão em manutenção”.  

“O melhor e mais novo da música eletrônica, doa a quem doer”. Em que hotel no mundo você seria despertado pela manhã com um DJ berrando no alto falante ao som da melô-chiclete “Despacito”? Era domingo e celebravam o dia das mães. O hotel programara atividades para as famílias e o local estava cheio. Por falar em música, a sensação é de que o reggaeton (uma mistura de reggae, hip hop, salsa e música eletrônica) e o clássico “Pasito a pasito, suave suavecito” é a trilha sonora da Venezuela. Absolutamente onipresente.

Mas o nosso programa do dia era outro. Há cerca de um ano, o New York Times havia noticiado que no hospital de Cumaná bebês eram acomodados em caixas de papelão, por falta de incubadora. Fomos conferir. Encontramos Natalia Ramírez, de 18 anos, deixando apressada o hospital Antonio Patricia de Alcalá em busca de uma farmácia: “Meu pai foi internado com uma gripe mal curada e não tem antibiótico. Vou tentar comprar”. Numa birosca, ao lado do estacionamento, conhecemos Rubén Martínez, de 34 anos, técnico de laboratório: “Aqui falta tudo, de luvas de borracha a seringas, de toalhas de papel a luz elétrica, sem esquecer a maioria dos medicamentos básicos”. Mas não era só. “Temos um surto de malária na região e não fazem dedetização. As pessoas chegam com meningite e não sabemos o que fazer”, disse. Para fechar a tampa, recomendou: “Passem no necrotério, atrás do setor de emergência: não tem refrigeração e, com o calor que faz, às vezes os cadáveres explodem”. Preferimos nos acercar da pediatria. Ali encontramos Solianis González, de 16 anos, que levava sua filha de sete meses para curar uma gripe. Sentada ao lado de uma lata de lixo transbordante que atraía não só uma nuvem de moscas como um gato que ciscava os restos esparramados pelo chão, ela contou: “Não tem seringa. Vou ter que comprar na farmácia, se é que vou encontrar”. Ainda assim, para ela a situação já foi mais caótica: “Fiz meu parto aqui. Na cesariana, eu sangrava muito, mas não tinha agulha para me costurar. Agora parece que está melhor”.

Nessas circunstâncias, alguém ali poderia defender o governo? Atrás do hospital, encontramos uma família acampada próxima à emergência. Eram parentes de Isabel María Vallejo, de 86 anos, internada com pneumonia. Instalados há uma semana no local, juntavam-se 30 pessoas, entre filhos, netos e sobrinhos da matriarca. Alguns cochilavam em redes penduradas em uma árvore, outros preparavam arepas na van. “Realmente falta remédio. O antibiótico da minha mãe nós é que temos que comprar. Mas, os funcionários do hospital são ótimos. Tratam bem das pessoas. Há muitos médicos e todos são muito bons”, disse uma das filhas, Melia Morao, de 40 anos. Para ela, o desabastecimento era uma realidade, mas um problema menor: “Quando Chávez chegou em 1999, não tínhamos luz, apenas velas. Não tinha médico. Não tinha naaada! Agora é diferente. Onde eu moro tem até uma ambulância com dois médicos, um cubano e um venezuelano”. Para provar que a crise não ia abalar sua convicção política, disse: “Somos 100% chavistas, a família inteira. Eu devo tudo ao governo: a minha comida, meu trabalho, minha casa”. Segundo a família acampada, a escassez crônica de medicamentos não é o resultado de má gestão do governo, mas de empresas farmacêuticas e farmácias cúmplices do mercado negro. “Se eu sou da oposição e tenho uma farmácia não vou vender remédio barato no balcão. Existem bachaqueros de medicamentos que pagam mais”, explicou Melia. O grupo vinha de Barbacoa, vilarejo à meia hora de Cumaná.

A mesma opinião tinha Marisela Montaño, médica especializada em saúde pública, que deixava o hospital ao fim do seu turno. “É verdade que a situação é um desastre, com a queda do preço do petróleo e a falta de recursos. Mas tudo isso é agravado pela sabotagem. Os remédios do hospital desaparecem misteriosamente. Some tudo. Semana passada roubaram um computador que havia acabado de chegar. Além disso, as empresas farmacêuticas multinacionais estão limitando a oferta de medicamento. É uma cadeia de problemas. Mas é uma crise induzida”, assegurou.

Deixamos o hospital e fomos conferir o problema da venda de remédios. Segundo o farmacêutico Jesús Guerra, gerente da Farmácia Popular, no Centro, apenas um em cada dez clientes encontra o que precisa. “Antes todas essas prateleiras estavam cheias”, disse, apontando para as estantes meio vazias. “Agora só tem poeira.” Segundo Jesús, não há dinheiro comprar produtos importados e os preços regulados são baixos demais para incentivar a produção de remédio no país. De repente, na fila da padaria do outro lado da rua, começa uma confusão. Uma mulher negra corpulenta sai na porrada com uma menina franzina de seus 16 anos e começa a golpeá-la na cabeça. O farmacêutico fecha a porta correndo e a multidão exaltada começa a gritar e a tomar partido. Parece que a garota roubou o lugar da mulher na fila do pão e elas se estapeavam ali, caídas na calçada. A menina consegue se desvencilhar e sai com a testa sangrando. “Lutam por migalhas. É todo dia isso”, resumiu o farmacêutico.

O próximo destino era Ciudad Guayana, no estado de Bolívar, cidade portuária na Faixa do Orinoco (sim, o famoso Rio Orinoco, que nasce próximo à fronteira do Brasil). A ideia era conhecer a vida na principal zona petroleira da Venezuela, onde se encontram quase 75% das reservas do país e vários poços de petróleo. Do avião observamos vários pontos de fogo no solo, que pareciam ser refinarias. Chegamos no fim da tarde e, com o taxista, conseguimos fazer contato com um dono de posto de gasolina que queria comprar dólares. Depois do jantar, ele apareceu no hotel com outra caixa de dinheiro. Contamos os fardos discretamente no próprio bar do hotel. Joel, o jovem empresário, contou que era inviável ganhar a vida vendendo gasolina. Segundo ele, com o preço tabelado (em dólar o litro custa algo como US$ 0.02), não se tem lucro. Ele se sustentava apenas com o retorno da loja de conveniência no posto e disse que tinha muitos amigos que tinham deixado o país. Ele não queria ir, mas achava que não tinha outro remédio.

Por força das circunstâncias, os venezuelanos acabam levando uma vida bem mais sustentável que nós. Ao contrário do Brasil, onde em qualquer comprinha metem logo um saco plástico, na Venezuela isso é raridade. Copos plásticos, papel toalha e papel higiênico também são itens escassos. Por outro lado, as cidades cheiram a fumaça de carro, talvez pela idade e estado dos automóveis em circulação.

Ciudad Guayana é uma cidade nova, industrial e planejada, que também oferece opções turísticas. Além de um famoso parque natural, outra atração é o encontro das águas de dois rios, como em Manaus. Ali também, as águas azuis do Caroni e as marrons do Orinoco seguem quilômetros sem se mesclar. Colocamos o trabalho em dia e fomos nos informar sobre transportes.

Descobrimos que era muito complicado viajar até os campos de petróleo (o deslocamento era demorado e custoso) e teríamos que mudar de plano. Decidimos, então, seguir por terra em direção ao Brasil, entrando por Roraima. Segundo um guia que havíamos comprado, o caminho prometia belas recompensas em termos de paisagem e ainda passaríamos por reservas indígenas, outra pauta da viagem. Pensamos em alugar um carro, o que logo se mostrou impossível. Já os ônibus só fazem a viagem durante a noite – o que não nos interessava. A outra opção eram os táxis que fazem lotação. Você chega na própria rodoviária com as malas e espera até juntar um grupo. Decidimos ir de táxi e pagamos pelos quatro lugares para ter mais conforto e liberdade.

Embora pouco conservada, a estrada estava melhor do que imagináramos. Atravessamos várias cidades pequenas sem qualquer expressividade ou atrativo. Vez por outra víamos pessoas colocando fogo no piche para consertar buracos no asfalto. “É gente daqui mesmo, que faz isso para tirar um trocado. Os motoristas param e dão uma gorjeta”, explicou o taxista. Por ser uma via de ligação com a fronteira, há muitos postos policiais. O taxista diminuía a velocidade e abria os vidros. A guarda bolivariana é tranquila e educada. É incrível nos darmos conta de que nas regiões que consideramos mais inóspitas e longínquas tem sempre uma vida acontecendo. Pensei que fosse encontrar uma zona pouco habitada, pouco movimentada, quase deserta. E, no entanto, naquela lonjura toda, quanta gente leva a vida, numa rotina absolutamente normal…

De repente, de uma paisagem bucólica e aborrecida, entramos subitamente numa zona densamente povoada. A estrada asfaltada virou uma rua de terra, esburacada, com um amontoado de lojas, biroscas, lixo, motocicletas, prostitutas, caminhonetes… “Aqui é Las Claritas, cidade mineradora”, explicou o taxista. “Há muito ouro e diamante na região”, afirmou. E do jeito que entramos, saímos. Num susto. Por conta da proximidade com a fronteira do Brasil, os postos de gasolina na região têm filas imensas. 

Algumas horas depois, estávamos na Grande Savana, lindo parque natural, no planalto das Guianas. A região é de uma beleza impressionante, cercada de cachoeiras e paisagens espetaculares. Depois de presenteados com a vista do Monte Roraima, chegamos a Santa Elena de Uairén, cidade pequena e tumultuada, com cara de subúrbio do Rio. Passamos duas noites ali, para ver com calma a região e conversar com os índios locais. A ideia era entender por que eles estão cruzando a fronteira do Brasil com destino a Manaus.

Descobrimos que os índios que vivem na Grande Savana vão muito bem, obrigado. Satisfeitos com suas vidas e suas terras repletas de ouro e diamante, não são eles que estão cruzando a fronteira. Um pai de família nos contou que os que deixam a Venezuela são da etnia Guarao, procedentes do delta do Rio Orinoco. “De vez em quando, vemos um grupo passar por aqui. Vêm muita gente. Mas aqui eles não param”, disse o índio da etnia Pemón. Em Santa Elena de Uairén, conversamos também com outra indígena que vendia um molho picante feito de bachaco (a tal formiga, que eles comem). Ela espetou: “Os Guarao não gostam de trabalhar, de roçar a terra, querem viver com as esmolas do governo. Como o dinheiro acabou, agora eles estão indo embora”.

Soubemos que há um périplo de brasileiros que cruzam a fronteira para cuidar da saúde no país de Maduro. Alguns vão em busca de um médico venezuelano que trata de hérnia de disco com aplicação de ozônio, em Santa Elena. Outros vão fazer cirurgia plástica na Venezuela, pois o país tem tradição em tratamentos de beleza e os procedimentos são muito baratos. Há excursões que saem de diversos estados do Brasil, cujos pacotes incluem hotel e transporte até Ciudad Guayana.

De Santa Elena, tomamos um táxi para Paracaima, do lado brasileiro. Atravessamos com tranquilidade a fronteira. Ao lado da rodoviária de Paracaima, encontramos um grupo de índios Guarao, acampados em condições precárias. Marcelino, com seus trinta anos, contou seu drama. “Vivíamos bem até 2013. Mas agora estamos passando fome. O CLAP vem com dois quilos de arroz e dois pacotes de macarrão. Não é suficiente”. O problema é que “o governador do nosso estado e os prefeitos de nossos municípios não nos ajudam em nada”, disse. Marcelino contou também que a ideia é voltar: “Vamos passar um tempo em Manaus até as coisas melhorarem”. E para dar um nó ainda maior na nossa cabeça, assegurou: “Nós somos 100% chavistas, somos revolucionários”.

Mas não é apenas cruzando a fronteira que se deixa o país. Em Boa Vista, encontramos vários venezuelanos: um ganhava a vida lavando carros em uma oficina, outros limpavam vidros no sinal de trânsito, mãe e filhas pediam comida na frente de um mercado e outras ganhavam a vida como prostitutas. Só em Manaus, após passar por outro grupo Guarao, acampado embaixo de um viaduto, é que sentimos que deixamos realmente o país de Maduro.

Formos à Venezuela com a missão de tentar entender o país. Mas a verdade é que talvez tenhamos saído mais confusos do que entramos. Entretanto, uma coisa é possível afirmar: não é honesto falar de Venezuela sem levar em conta de que se trata de um país profundamente divivido, cindido em dois polos opostos. É natural explicar o mundo segundo nossas próprias convicções. É muito fácil encontrarmos as evidências necessárias para corroborar uma ou outra ideologia política. Ainda mais em circunstâncias tão extremas. Os exemplos são inúmeros e contundentes de ambos os lados, seja para a direita ou para a esquerda. Se Maduro vai cair, se o país sofrerá um golpe, se as eleições presidenciais serão antecipadas, não tenho ideia. Mas, seja quem for o próximo presidente da Venezuela terá pela frente o desafio de construir uma ponte sobre uma falha abissal ou será impossível governar.

Leia o relato inicial – Parte I

Júnia Azevedo é jornalista e publicitária formada pela PUC-RJ. Atuou por 11 anos na parte de redação em agências de publicidade. Atualmente, além de jornalista freelancer, trabalha com comunicação corporativa, redação e assessoria de imprensa na área de cultura. É autora do romance “O Ser-se” (https://oserse.wordpress.com/).

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

5 Comentários

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  1. Vou escrever “Diário de um Mineiro nas Favelas Cariocas!”

    Parabéns pela Iniciativa!

    Só vi agora e serve como um modelo jornalístico e etnográfico. Vale a pena tentar o mesmo aqui no Rio. As favelas são muito invibilizadas, a classe média passa longe e as notcias são sempre para mostrar “violencia e domínio pelo crime”. Morando em algumas aqui pr algum tempo, percebi que as narrativas são construidas assim como a narrativa feita da Venezuela pelos grandes meios de comunicação como a Globo. Assim como fazem com as favelas.

  2. Três semanas na Venezuela II – Diário de uma carioca

    ótima reportagem, tanto a parte I quanto esta II. uma reportagem não é uma pesquisa, uma tese ou um panfleto. são impressões subjetivas, relato de experiências de vida. a realidade é sempre muito mais complexa do que qualquer abordagem reducionista. entre os dados e suas análises estatísticas e fatos narrados por quem os viveu, são estes últimos que tem o poder de nos transportar para sentir um pouco do que está sendo reportado.

    muito além da grande mídia de Direita e também da propaganda Chavista, fica um gosto de quero mais.

    .

  3. Me lembra de TODO E QUALQUER

    Me lembra de TODO E QUALQUER “coxinha” dos anos 70 que ia visitar Cuba pra dar suas “impressoes”…  E os “coxinhas” sequer existiam ainda nos anos 70…

    Detestei o item, francamente.

  4. oi Nassif, aguardo a publicação do meu comentário
    Nassif e/ou plantonista (rs),

    onde está o meu comentário deste artigo?

    se os artigos internacionais são repetidamente ruins, por que não posso fazer comentários repetidamente pertinentes em 3 artigos diferentes?

    >>> se o tal “romulus” pode emporcalhar o blog do Nassif repostando 20 VEZES NUM MESMO DIA UM MESMO TEXTO DELE (e sempre com imagens!!!) em diversos artigos do Blog, por que eu não posso repetir 3 comentários para 3 diferentes artigos tendenciosos? o tal “romulus” é parente de alguém do blog?

    (aparte para assunto importante, mas diferente)
    ——————————————————————-

    falando no tal “romulus”, Nassif e webmaster, vcs nunca se perguntaram como o cara (“romulus”) posta MONTES daqueles panfletos de tamanho exagerado, com imagem e 5 linhas escritas ocupando um espaço equivalente a 30 linhas, e quase que imediatamente aparece “excelente” ou “nota 5” EM TODOS ELES?

    vcs (ADMIN. DO BLOG) sabem que o WordPress tem montes de bugs, não? Acho que já li sobre isso (sobre dar nota a si mesmo, com algum caracter alterado ou script oculto). Essa coisa de dar nota a si mesmo deve ser uma dessas falhas.
    VCS ATUALIZAM AS VERSÕES E PATCHS DO WORDPRESS?
    Já tentei duas vezes, por curiosidade, mudar a nota desse “panfleteiro sugismundo” do blog, com dois métodos diferentes, mas não consegui…
    1) tentei mudar a nota, muitas vezes, com grandes intervalos de tempo entre tentativas, com o mesmo ip e não consegui mudar a nota.
    2) tentei mudar a nota, muitas vezes, com grandes intervalos de tempo entre tentativas, com ips diferentes, e não consegui mudar a nota. Isso (de não conseguir alterar a nota de alguém) é normal?

    eu não acho que o “romulus” seria tão sem-noção de ficar clicando (ou pedir para seus parentes ficarem fazendo isso) e dando nota “excelente” a si mesmo montes de vezes, nem um beócio narcisista ficaria fazendo isso…
    por isso acho q ele deve explorar um bug do Wordpres para atribuir nota a si mesmo em um comentário enviado para uma versão do WordPress não atualizada ou corrigida.

    fora isso, esse “romulus” é parente do Nassif?
    tipo… filho da cunhada, filho da prima, filho da vizinha, namorado da filha?
    é que todo texto dele tem perto de 7 links para desviar tráfego do blog do Nassif para os links do “romulus”, seja o site, facebook, twitter ou qquer coisa desse tipo ligada a ele.
    Todo mundo sabe que dá para ganhar uma boa graninha somente com acessos, pois o tráfego para certo endereço pode ser bem remunerado.
    Uma pessoa ética, idônea, não faria uma rapinagem de leitores desse jeito.

    Por que outro comentarista frequente, por ex. o AA, não coloca links para um blog dele ou coisa semelhante, já que ele escreve mais tempo e textos bem mais densos (eu disse densos, não que sejam todos bons) que as frivolidades do “romulus” para puxar tráfego dos leitores do GGN e do Nassif.
    Outra coisa que define personalidade… o AA coloca um texto inteiro, sem ficar pulando linhas a cada duas palavras, sem links para “desviar” tráfego do Nassif, e não posta somente uma parte do texto para usar “leia mais” e “forçar” os leitores ingênuos a ir pro blog dele (romulus).
    Se o tal “romulus” quer desviar tráfego do blog do Nassif, ele que pague anúncio no cabeçalho ou lateral do Blog do Nassif para o blog dele (faceburro e twitter inclusos) e aí estaria tudo bem… desviaria tráfego, mas pagaria por isso ao Nassif.
    Mas não… o cara desvia tráfego do Nassif DE GRAÇA e ainda sai com fama de “bacana”.
    Como costumo repetir… brasileiro é muito créduto, facilmente “enrolado” pelos “espertos” como esse tal “romulus”.
    (e tem um monte de tolinhos que acham que os indutores de vícios — maconha, cocaina, crack —, geralmente traficante bons de lábia, pessoas legais, “gente boa”, né não?)

    Se esse cara (romulus) quer escrever no Blog no Nassf, que abra um blog no GGN, que escreva um artigo inteiro (sem essa porcaria de “leia mais” e sem ficar pulando linhas a cada duas palavras!!!) E NÃO COLOQUE LINKS além do link da fotinha, que necessariamente, remete ao blog do romulus dentro do GGN.
    Isso é o comportamento de uma pessoa ética.

    E, por favor, romulus, PARE DE EMPESTEAR O BLOG COM O MESMO ARTIGO VÁRIAS VEZES NUM DIA para desviar tráfego do Blog do Nassf.
    Caso queira comentar mais de uma vez, comente, sem problemas, mas com textos inéditos (cada comentário, um texto novo, como eu faço), sem imagens (também sei usar imagens, mas ocupa muito espaço e é desleal com outros comentaristas que não sabem usar este recurso para “chamar atenção”).
    Além disso, escolha se seu “artigo ou comentário” é “CLIPPING” ou “FORA DE PAUTA” e POSTE UMA VEZ SÓ, POR FAVOR!

    Seria ético o, por ex., Altamiro Borges vir “pescar” tráfego (isto é, leitores) no Blog do Nassif?
    TIPO… o Altarmiro colocar imagens, usar “leia mais” e deixar 7 links para puxar tráfego para si mesmo?
    Então, por que o “romulus” faz isso já um bom tempo e ninguém fala nada? Ninguém mais sabe o que é desviar tráfego ou o que é comportamento ético?
    Outros comentaristas acostumaram com panfletagem desleal no Blog do Nassif e ficou tudo bem?
    —————————————————————————
    (fim do aparte importante e voltando ao meu pedido de publicação)

    RESUMINDO, por favor, publiquem o meu comentário.

    só para lembrar, é este o texto que postei 3 vezes:
    https://jornalggn.com.br/comment/1124750#comment-1124750

  5. chega de artigos fingidos de neutros para eclipsar o perpetrador
    Nassif, Editoria Internacional e demais colegas,

    Nassa, sua Editoria Internacional está te sabotando… Ponto!
    (esta deve ser a 5a. ou 6a. vez que estou te alertando sobre isso)

    Ou esse povo da Edit. Inten. é de uma “lucidez” intelectual acachapante (beirando a boçalidade) ou é declaradamente mal intencionado… não há meio termo nas bobagens que a Edit. Intern. está fazendo com notícias internacionais no seu blog… está beirando a perigosa certeza ignorante do “sei o que estou fazendo” na escolha de artigos ou está fazendo propositalmente um trabalho “sujo” para o inimigo.

    A colombia está uma caca, com massifcação da pobreza, prostituição desenfreada, incluindo pré adolescentes, 7 bases dos “amigos” estadunidenses para(?), produção de drogas à todo vapor (as bases, lembram?), continuidade das milícias pró governo, além dos assassinatos frequentes de líderes defensores de direitos sociais, civis e de minorias; a argentina está indo pelo mesmo caminho… montes de problemas…

    Só para mais um exemplo de pauta para sua Edit. Intern., a ucrânia já teve sua “primavera” (maidan) e agora parece uma mistura de haiti, colombia e méxico, temperados com ascensão desenfreada do nazi-sionismo (miséria, violência, medo, proliferação de milícias muito violentas patrocinadas pelos ratos oligarcas e extorquindo a população civil, censura, privatizações criminosas, rebaixamento de TODOS direitos sociais e exploração econômica cruel da população).

    E cadê sua Edit. Intern. ou as(os) intrépidos reporteres coxinhas da “pública” para nos interar sobre os graves problemas da guiana, guiana francesa, haiti, colombia, argentina e ucrânia?

    Não bastando os exemplos da Am. do Sul, temos os reizinhos fakes das arábias, junto a NAT0 e com a entidade sionista tocando fogo no Or. Médio e sua Edit. Intern. (bem como a tal “pública”) fazendo papel de Poliana…

    “Escolhe” artigos não sobre a vilania dos perpetradores, mas sobre a culpa das vítimas, como Síria, Iraque e Venezuela (ou seja, vamos analisar a vítima e culpá-la por ter sido atacada).
    Estou esperando a “pública” fazer uma reportagem sobre israHell abordando tráfico de órgãos, massacre antissemita do governo khazar contra palestinos semitas, discriminação oficial descarada dos judeus saarianos, apoio militar e logístico às 200 franquias de mercenários moderamente terroristas na Síria e Iraque, interferência de lobistas da kabbalah e da aipac nas eleições de USraHell (united slaves of israHell).

    Pô, Nassa, essa parcialidade do Blog no noticiário internacional (seja ingênua ou proposital) já torrou o saco e está enfatizando uma imagem de “colaboracionista” do blog (seria um cripto colaborador dos “ratos da kabbalah” ou apenas “sem-noção” na escolha das notícias internacionais? Acho que nenhuma das duas opções seria elogiável… A melhor reputação seria de um Blog que dá NOME AOS BOIS, deixar claro quem é o perpetrador e quem é a vítima).

    Não bastando a péssima escolha dos artigos intern. aqui no Blog, além dos já previsíveis comentaristas neocons “experts” (pff…!) doutrinados mal e porcamente pela máfia midiática, ainda vem uns pseudo intelectuais “progressistas” querendo parecer “cabeça”, “descolado”, “intelectualizado” e entram na mesma barca furada de críticas às vítimas, não aos perpetradores.
    Prezados comentaristas esquerdo-progressitas mal informados, além da vossa já percebida falta de leitura em blogs internacionais minimamente qualificados, como essa tal “agência pública” pode receber algum vosso elogio, ou ser isenta nos seus artigos para tê-los reproduzidos em blogs de qualidade (como no Nassa), se tem patrocínios suspeitíssimos desse naipe:

    Fundação Ford

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