Do comportamento de rebanho da sociedade brasileira, por Eduardo Ramos

Vou além: não haveria Lava Jato ou outros eventos "menores" como esse da Prevent Senior, se esse efeito rebanho não fosse tão profundamente arraigado em nós, brasileiros.

Do comportamento de rebanho da sociedade brasileira

por Eduardo Ramos

(sobre o artigo “Xadrez do padrão Lava Jato e o caso Prevent Senior”, por Luis Nassif)

A foto que ilustra esse texto é, certamente, uma das imagens mais emblemáticas da História! Não consigo vê-la sem ficar profundamente emocionado, pela riqueza de signos e símbolos que ela encerra e por mostrar com impiedosa clareza o melhor e o pior que o ser humano pode fazer de sua vida.

A pesquei aqui, no GGN, num post de 01/10/2013 do Paulo Gurgel Castro da Silva.

É uma foto de 1936, Hamburgo, no lançamento de um navio. August Landmesser, um trabalhador do estaleiro, casado com uma judia, recusou-se, SOZINHO, NO MEIO DA MULTIDÃO, a fazer a saudação nazista. Detalhe: por ter “desonrado a raça”, já tinha cumprido dois anos de trabalhos forçados – conhecia na pele, portanto, a violência e a crueldade do movimento nazismo. O que exacerba o nosso olhar de admiração por sua coragem em “ser o que era e acreditava justo e digno na vida” – e não ser o que a maioria das pessoas são, tragicamente: membros de um rebanho humano qualquer, ou mesmo vários deles ao longo de suas existências vazias.

Mas o que pode ter essa imagem, esse texto, os pensamentos aqui expostos, com o artigo objetivo do Nassif sobre a “Lavajatização” de políticos, juízes, mídia em geral, nesse caso da Prevent Senior?

E eu respondo com muita segurança: tudo a ver! Porque em todos esses agentes, mas principalmente na sociedade rasa e irracional que se embriaga e celebra esses processos doentios, a enfermidade principal, a maior deformação do “eu”, do caráter, da personalidade, é esse estado mental, essa prática de vida trágica, de “ter que pertencer a um rebanho” para se sentirem seguros e narcisicamente acolhidos, a boa e velha sensação de conforto do “pertencer ao meu grupo social” – necessidade ávida de nossas elites e da fútil classe média brasileira.

Vou além: não haveria Lava Jato ou outros eventos “menores” como esse da Prevent Senior, se esse efeito rebanho não fosse tão profundamente arraigado em nós, brasileiros. Um exemplo? Quando os desembargadores do TRF4 chafurdaram na lama da mediocridade pessoal e jurídica ao defenderem que “Moro podia cometer os excessos que estava cometendo por se tratar de um momento de exceção”, não o fizeram “apenas” por ideologia, desprezo por Lula e pelo PT e afinamento com Moro, mas muito, também, motivados pelo ambiente de histeria coletiva em que estava mergulhada a sociedade. Apoiar Moro e todo o massacre a Lula era uma certeza natural, confortável, de aplausos da mídia, dos familiares e amigos, de estarem “no rebanho certo, na hora e local certos” – poucas sensações são tão agradáveis ao homem comum, de caráter fraco, sem brilho próprio e sem o amor à verdade que só move os homens que buscam a verdadeira justiça.

O mesmo afirmo dos procuradores da Lava Jato: nada me convence que desde o início da operação eram as mesmas pessoas deslumbradas, cínicas, arrogantes, que a concluíram. O ser humano é “massa de si mesmo e da vida” permanentemente, poucos são aqueles que, sob uma pressão nova e brutal (fama, sucesso e poder incomensurável, por exemplo…), não sucumbem, não se deixam moldar aos fatos novos, aos aplausos fáceis, à embriaguez do poder. Não a toa o comportamento de Moro e dos procuradores empesteou Judiciário e Ministério Público em todo o país, com um festival de notícias de crimes, abusos de poder, sandices, quebras de normas fundamentais do Direito em todo o Brasil. O efeito rebanho pode ser muito perversos para a vida de um país frágil como o nosso.

Lembram de Janot, rindo, feliz como uma criança, segurando o cartaz que o intitulava “a esperança do Brasil”?

Pois é… O mesmo Janot que procuradores insuspeitos, como Eugênio Aragão, afirmam categoricamente, ter sido no passado um homem digno, sério e correto em suas falas e ações. O desejo de fazer parte do “rebanho Moro-Lava Jato” a qualquer custo, devorou-lhe a alma, e tão perturbadora foi a experiência, que todos assistimos seu triste fim, o que restou após a embriaguez do poder e do sucesso.

Prevent Senior, e nisso estou com o Nassif absolutamente, é um “rescaldo” desses tempos, jornalistas, sociedade, políticos, autoridades, agindo como rebanho. Ora, é evidente que há denúncias sérias a serem apuradas, algumas delas, crimes, muito provavelmente. MAS A QUEM INTERESSA UM LINCHAMENTO DESSA MAGNITUDE? De repente, tornam-se “o mal absoluto”, sendo que centenas de Hospitais e médicos, é certo isso, seguiram essa sandice do tratamento precoce, talvez, com um radicalismo muito maior. Não quero para ninguém o que não desejei para Odebrecht e as outras empreiteiras, por corruptos que tenham sido, Não quero para ninguém o que vi Bretas, o hipócrita, fazer com Sérgio Cabral sem necessidade alguma! Quando aprenderemos que o império civilizado de um país é a Lei, a decência, a busca da justiça sem histeria, sem heróis, sem Moros ou Janots ou Joaquins Barbosas?

A justiça, a civilidade, o melhor de um país nasce de homens livres, bem informados, amantes da verdade e da justiça e com coragem para afirmar em atos e palavras esses princípios!

O exemplo de August Landmesser segue sendo para mim um dos mais sublimes da História.

E me lembra a tragédia dos povos que insistem em ser rebanhos.

Nossa herança maldita foi Lava Jato, Temer e agora Bolsonaro.

Será que não é o suficiente…?

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

3 Comentários

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  1. Há sempre que lembrar de nosso “August Landmesser”.

    Na votação do TRF-4 em que os desembargadores defenderam que “Moro podia cometer os excessos que estava cometendo por se tratar de um momento de exceção”, o placar foi de 13×1.

    A única e honrosa exceção foi o desembargador federal Rogério Favreto, um nome a ser sempre lembrado e enaltecido.

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