Qualquer movimento que se dobre a um pedido sobre intervenção militar se desmoraliza, por Paulo Endo

do Psicanalistas pela Democracia

Qualquer movimento que se dobre a um pedido sobre intervenção militar se desmoraliza, se enfraquece e não reconhece a história de lutas recente do país

por Paulo Endo

Essa greve representa um Brasil aos pedaços. A princípio muito parecida com a greve que antecedeu e apoiou o impeachment de Dilma Roussef, os caminhoneiros voltaram a bloquear às estradas para desafiar o presidente ilegítimo que ajudaram a colocar no poder. Misturados estão os empresários de transportadoras e movimentos de ultradireita, como ‘vai prá rua’ e ‘mbl’, que são cobrados por seus seguidores em suas redes sociais, por não apoiarem clara e prontamente a manifestação dos caminhoneiros.

Manifestações do candidatos à esquerda e a greve anunciada dos petroleiros parece dar a entender que a greve tem um objetivo mais amplo. Globo, folha, estado continuam seu trabalho de gastar muita saliva para dar a entender que o Brasil está sendo invadido por marcianos. E a grande maioria da população está interessadíssima apenas em quando a greve vai acabar e quando será possível voltar aos postos de gasolina sem fila. Afinal o feriado vem aí.

O roteiro é conhecido: uma mobilização politicamente ambígua que se coloca refém de agenciamentos de todo tipo, porque não se manifesta claramente a respeito de seus objetivos nacionais de médios e longo prazos.

Queriam parar o país? Porque? Para que? Para quem?

Um fenômeno de impacto nacional ocorre há sete dias, mas não há discurso coerente, nem pautas claras além da queda dos preços do diesel. Que o ilegítimo presidente já concedeu ontem.

Querem a queda de Temer? A privatização total da Petrobrás-e de tudo o que for possível-, como defende o MBL? A demissão de Pedro Parente? Privilégios fiscais para os proprietários das transportadoras? A intervenção militar?

Quais objetivos nacionais defende o movimento dos caminhoneiros?

Uma coisa é certa, quando movimentos se deixam capturar por grupelhos que defendem a intervenção militar eles abandonam suas pautas originais, mesmo as mais imediatas, e passam a envergonhar todo a história dos movimentos dos trabalhadores barbaramente atacados pelas forças que apoiaram o golpe militar de 1964, e todos os que lutaram e resistiram depois nas fábricas e nas escolas e nas ruas contra os sequestros, as perseguições as torturas e os assassinatos cometidos pelo regime militar contra trabalhadores em todo o país.

Se esse movimento, ou qualquer outro, não souber como rechaçar esses grupos atrasados e oportunistas, endereçando claramente seu movimento rumo à institucionalidade democrática, sua força será sua fraqueza e sua motivação será vista como um ataque frontal aos trabalhadores que supõem defender e à toda história de lutas, sacrifícios e vitórias que um dia conquistaram através da Consolidação das leis do trabalho, da Constituição de 1988 e dos direitos previdenciários às trabalhadoras e trabalhadores brasileiros. Todos sob ataque e sem tréguas pelo atual governo.

Se as lideranças do movimento são populares e autônomas, elas devem se manifestar com maior clareza, porque muitos querem cooptar suas motivações e denegrir suas estratégias descontextualizando-a do movimento e da história das lutas dos trabalhadores brasileiros. Permitir isso é deixar um potente movimento como esse ao léu e à deriva. Não basta paralisar e cruzar os braços é preciso conferir um sentido à essa desobediência que contribua para o esclarecimento da sociedade em geral e dos trabalhadores de transporte em particular. É necessário confessar em alto e bom som quais são suas intenções políticas, esclarecendo a todos os que são afetados ao que o movimento se dirige e permitindo o apoio ou não dos que se reconhecem em suas causas.

De todo modo é sempre bom lembrar que num regime militar uma greve de caminhoneiros sequer seria pensável, porque seus supostos líderes já estariam presos, perseguidos, desempregados enquanto outros, provavelmente, estariam sendo torturados e mortos pelos militares que, em geral, não simpatizam muito com movimentos de oposição.

 

Redação

14 Comentários

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  1. Rapaz em todos os pontos de

    Rapaz em todos os pontos de manifestação, por esse Brasil afora, tem cartazes, faixas e outdoors com a frase: INTERVENÇÃO MILITAR JÁ – ou alguma coisa parecida. Mas não se vê isso nas matérias jornalísticas das redes de televisão, ao menos não vi até o momento. Alguma coisa estranha há.

  2. Ai, o perigo das generalizaçoes

    Ainda nao deu para entender que o movimento NAO É UNIFICADO, e que nao tem um significado único nem lideranças que possam falar por ele? Cada ponto de barragem tem atores diferentes com discursos diferentes, é simplesmente ingovernável. Vai acabar, quando acabar, por exaustao, por que os atores irao querendo parar aos poucos.

    1. AnaLú. Isto se chama greve selvagem!

      AnaLú, uma greve selvagem é produto de situações de desespero em que a massa não pode esperar a criação de lideranças.

      Ficou claro que esta greve é bem mais do que um movimento criado por alguém, é o mesmo que jogar um fósforo em palha seca, já terorizei várias vezes aqui no blog sobre o equilíbrio de sistemas dinâmicos, e mostrei nestas teorizações que há um ponto que qualquer perturbação infinitesimal desencadeia um grande movimento aleatório.

      O que está acontecendo é isto, e parece que os imbecis do governo e alguns pseudo intelectuais de esquerda tentam entender algo mas não entendem nada.

      1. É o que tentei dizer por outras palavras

        Qualquer generalizaçao nesse caso é tola, nem o movimento em si pede intervençao militar, como alguns tontos ficam dizendo (embora haja no movimento quem a peça) nem tem sentido libertador como um todo — a nao ser como consequência nao prevista dos acontecimentos.

    1. Calma meu caro, uma greve selvagem não chega …….

      Calma meu caro, uma greve selvagem não chega com uma pauta pronta, o movimento que a cria.

  3. Critica meramente acadêmica.

    O cenário proposto pelo autor do texto mostra que o mesmo não entende muito de política e menos ainda de história. Por mais que desejamos que não ocorra um golpe militar a possibilidade do mesmo não é remota nem muito menos deve ser excluída das análises.

    Surpreende-me muito que um psicanalista confunda desejo com a realidade, pois uma coisa é não desejarmos um governo militar e outra é não termos um governo militar.

    As razões apresentadas pelo caro psicanalista, são fracas e mostram que o mesmo não entende como ocorre os golpes militares, pois se entendesse não escreveria o que escreveu.

    Primeira coisa, dentro do consciente ou inconsciente (neste ponto aceito sugestões de psicanalistas) de grande parte de pequena burguesia é a segurança mesmo que relativa não da sua liberdade descrita sobre o ponto de Hegeliano, que incluiria o direito como a totalização da própria liberdade, o novo conceito de liberdade imposto pela ideologia dominante é a possibilidade de consumir de acordo com as opções que lhe são apresentadas, ou seja, a liberdade fica uma mera eleições de alternativas e não uma autoconstrução da personalidade.

    Dentro deste novo conceito de liberdade, a liberdade de consumir que é a mais importante para determinados setores da burguesia, se esta liberdade é garantida, a liberdade sobre o ponto de vista Hegeliano não é satisfeita, pois o homem não se torna sujeito e o todo não é respeitado.

    As perguntas propostas pelo autor são totalmente respondidas por simples constatações, quer dizer, perguntar queriam parar o país, o porquê da greve, para quem e para que, chegam ao ponto da histeria. Querem parar simplesmente porque estão mal das pernas, se continua como está perdem tudo. O porque e para quem são questões auto respondidas pela primeira resposta, que só não entende quem nunca teve que fazer uma greve.

    Como professor universitário, na época da hiperinflação um colega matemático chegou a uma fórmula interessante que dizia quando haveria greve! Simplesmente quando o salário de uma das categorias de professores universitários baixava de US$300,00 a categoria entrava em greve. Toda a história de melhoria do ensino estava baseada na barriga dos professores, e toda a greve como a dos caminhoneiros está baseada no mesmo princípio.

    As dúvidas de quem começou, se os incentivadores eram privatistas, foram deixadas para as calendas gregas, a intensidade do movimento, a determinação dos mesmos que com greve estão deixando de ganhar as merrecas que ganhavam eliminam qualquer preocupação sobre as origens ocultas e os apoiadores oportunistas.

    Quanto ao resgate de grupos pró intervenção militar e os apelos a estes grupos, já escrevi um texto que não foi elevado do meu blog por contrariar a linha editorial do GGN, deixo claro a origem, os acertos e os erros do mesmo, quem quiser saber que leia no “Intervenção militar: Tem sentido a reivindicação dos caminhoneiros? Tem, mas…..”lá vão achar uma explicação real e de acordo não com o que desejo, mas como é.

     

  4. esse movimento de intervenção militar é uma praga…

    e deve ser muito bem paga, porque já se tornou serial

    está em todas e só para atrapalhar e confundir

    1. 1986, primeira greve nacional…

      1999, com FHC fazendo praticamente o mesmo que o Temer

      e estes merdas desse movimento de intervenção militar não deram as caras, não pediram nada

      pelegada que não presta pra porra nenhuma, a não ser atrapalhar

  5. Desmoralização diante de quem?

    Como bom psicanalista, o autor sabe que quem se desmoraliza se desmoraliza diante de algum outro.

    Que outro? O governo? a “categoria”? a esquerda? a população em geral?

    Um psicanalista deveria explicitar esse outro, diante do qual o movimento se desmoraliza (desmoralizou? desmoralizaria?)

    Em vez disso, parece que o movimento se desmoraliza diante de forças abstratas (que, sendo abstratas, não se pautam por questões morais). E aí o discurso parece discurso rançoso de esquerda tradicional e reformista: o movimento se desmoraliza diante da “história dos movimentos dos trabalhadores barbaramente atacados pelas forças que apoiaram o golpe militar de 1964, e todos os que lutaram e resistiram depois nas fábricas e nas escolas e nas ruas contra os sequestros, as perseguições as torturas e os assassinatos cometidos pelo regime militar contra trabalhadores em todo o país”. Os seres humanos concretos se desmoralizam diante de um mito – que sequer é o mito deles. Isso não existe, e é por que não existe que o fascismo é uma coisa possível: matam-se judeus, comunistas, socialdemocratas, psicanalistas, e dane-se “a história dos movimentos dos trabalhadores barbaramente atacados pelas forças que apoiaram o golpe militar de 1964, e todos os que lutaram e resistiram depois nas fábricas e nas escolas e nas ruas contra os sequestros, as perseguições as torturas e os assassinatos cometidos pelo regime militar contra trabalhadores em todo o país”.

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    Independente disso, esse movimento tem pelo menos um mérito: começou a fazer as pessoas desconfiarem que uma “intervenção militar” não vai fazer o que elas acham que uma “intervenção militar” tem de fazer, e sim o que o comando militar acha que deve ser feito. Ou seja, uma intervenção militar pode ser para prendem, multar, dispersar pela força, e até mesmo massacrar caminhoneiros.

    Uma vez estabelecido que os militares “não nos representam”, talvez seja hora de agitar outra coisa. Que tal INTERVENÇÃO POPULAR JÁ?

  6. O trabalho a ser realizado

    Dar sentido, profundidade e alguma unidade a esse imenso movimento. É o que a banca, no fundo sempre ela, está fazendo, sem nada e ninguém a fazer oposição. 

    Golpear por aqui é roubar doce de criança.

  7. OK.

    A não ser que eu tenha entendido mal a mensagem do colega… bem… estas mensagens existem. E vai simplesmente negá-las? Por princípio formal?

    Não é esta a lógica das coisas.

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