Que Brasil seria revelado caso houvesse um Data-Imbecis?, por Álvaro Miranda

Se houvesse uma espécie de pesquisa tipo Data-Imbecis, ficaria difícil separar os estratos sociais pelo indicador de imbecilidade.

(Foto: Silvia Izquierdo)

Que Brasil seria revelado caso houvesse um Data-Imbecis?

por Álvaro Miranda

Bolsonaro só falta cuspir na cara dos eleitores e dizer: você merece isso por uma questão moral, em defesa da família e da pátria. E muitos, certamente, vão concordar em ficar com a gosma presidencial no rosto.

Nem todos os eleitores de Bolsonaro são imbecis, é verdade. Além dos fascistas, há os calculistas, os oportunistas e os que ignoram a complexidade e as contradições do processo de políticas públicas, guiando-se mais pelos símbolos da ‘doxa’ do que pelo difícil caminho da ‘episteme’.

O imbecil típico é aquele que acredita que, se não houvesse ricos, não haveria emprego e trabalho para os pobres. Imbecil completo, pois reúne a ignorância e a estupidez. Sua ‘cultura’ é feita só de imagens velozes da internet e dos aplicativos, além dos risinhos e dancinhas das redes sociais.   

Em meio a mentiras, trapalhadas do desgoverno e diante dos comícios gigantescos de Lula, além do empate técnico no maior colégio eleitoral do país, circula pelas redes sociais a informação de que a campanha bolsonarista andou pagando para as pessoas participarem de aglomerações em alguns locais do Nordeste. Porém, não pagou o que prometeu, e as pessoas chiaram levantando a mão num “L” incisivo, viralizado pelo Twuitter.

Depois do anúncio de que o salário-mínimo não teria aumento e que, portanto, as aposentadorias iriam diminuir, a campanha do desgoverno anti-Lula teve que fazer um programa no horário gratuito para inverter as coisas e dizer que a corrupção na Petrobras foi a responsável pela queda no valor das aposentadorias. Fizeram o dito pelo não dito e ainda mandaram um embuste na cara do telespectador.

A mixórdia de mentiras vai na maior cara de pau – pior: muita gente acredita. Assim como muita gente acha normal o presidente ter mandado o ministro da Justiça negociar a prisão do fascista tresloucado Roberto Jefferson, tendo ainda a participação daquele farsante que se veste de padre.

Um lado obscuro do Brasil se transformou nesse lodaçal de imbecilidades em que muita gente adulta e dita esclarecida acha que a questão do armamento da sociedade faz parte da democracia – que liberar as armas faz parte da grande liberdade de optar por ter ou não um fuzil, uma pistola ou, quem sabe, até uma ou duas granadas. Querem ser como nos Estados Unidos, aquela sociedade doente e neurótica. Para não dizer psicopata!

Por falar em granada, a trapalhada vem de hoje. O ministro da Fazenda, com seu dinheiro guardado em paraíso fiscal, é o mesmo que chegou a dizer, em reunião ministerial de altíssimo nível, que a estratégia era fazer o funcionário público não perceber a ‘granada’ que estava sendo colocada no seu bolso – metáfora bem ao estilo dessa gente tosca, carregada de ódio, para se referir à ausência de reajuste salarial nos próximos dois anos. Essa gente que detesta funcionário público, intelectuais, cultura, diversidade, arte e educação

Se houvesse uma espécie de pesquisa tipo Data-Imbecis, ficaria difícil separar os estratos sociais pelo indicador de imbecilidade. Ficaria difícil radiografar com precisão o maior número de néscios entre empresários salafrários, altos burocratas com suas esposas dondocas montadas em joias caras e os ingênuos de vários segmentos que acreditam na mudança do Brasil através de um cavalo de pau messiânico e ‘imbroxável’. Tanto faz com ‘x’ ou ‘ch’.

E falam no tal cavalo de pau há quatro anos. Uma eleitora de Bolsonaro veio dizer que ele não conseguiu governar porque ‘não deixaram’, e que agora ele iria poder deslanchar seu governo. Que todo mundo estava contra ele, governadores, STF etc.

Ou seja, todo mundo quer um Brasil atrasado, menos Bolsonaro, com seus mantras hipócritas e vazios, explorando a fé religiosa das pessoas humildes. Quatro anos, Cacilda!

Atestado próprio de imbecilidade, admitindo que o governo não fez nada e, mesmo assim, apoia o sujeito. Outro argumento esdrúxulo é, em tom lamentoso e conformado do suposto mal menor – qual seja, de que Bolsonaro foi o “inseticida” necessário para acabar com a corrupção na lavoura. Só que, além de corrupto, o cara está destruindo a lavoura.

O programa de televisão do candidato ainda se refere ao presidente candidato ‘capitão do povo’, embora ele, praticamente, não apareça nos braços do povo, a não ser em imagens montadas e bem editadas. Muito diferente dos gigantescos comícios da campanha de Lula país afora.

O telespectador vê Bolsonaro numa igreja lotada e pensa que o povo estava lá por causa dele. Ora, em Aparecida, ele apareceu tentando pegar carona numa situação em que o povo tinha ido lá como vai tradicionalmente todos os anos no feriado. Assim aconteceu no último domingo em outra igreja.

Cheguei a escrever aqui, há uns dois anos atrás, que era infrutífera a estratégia de amaldiçoar os eleitores de Bolsonaro em geral. Que, na verdade, era preciso saber os motivos de sua preferência eleitoral etc. Que muitos eram iludidos, pessoas honestas e trabalhadoras e aquela lenga-lenga toda de tentar enxergar o ‘poliedro’ imprevisível que é o ser humano etc.

Passados quatro anos da última eleição, fica difícil não associar o eleitor de Bolsonaro a imbecis, oportunistas e fascistas, embora sejamos justos, repito: há ingênuos ignorantes que ignoram a própria ignorância. Nada de mal ser ignorante. O pior é ignorar a própria ignorância. E digo isso sem ironia alguma, pois todos somos ignorantes em muitas coisas. Não é possível sabermos de tudo.

Porém, ignorância em excesso tem limites flagrantes no bom senso, digamos. Não precisa estudar muito para não ser imbecil. Muitos sem escola longe de serem imbecis.

O que espanta é a situação na qual muitos outros que tiveram a oportunidade de estudar, ler, ir a teatro, cinema, viajar etc., comportarem-se como imbecis na hora do voto. É nessa hora que se revela toda uma visão de si mesmo e da relação com os outros e o mundo, uma visão de vida em sociedade.

Confesso que cansei da temperança e da ponderação para falar do eleitor de Bolsonaro. Entretanto, faço aqui um convite à reflexão. Se você não é imbecil e ainda está em dúvida, achando que Lula não merece seu voto, repense. Pode ser que não mereça, segundo seu ponto de vista. Porém, pode ser que você não esteja considerando muitas coisas importantes também. Mesmo assim, vote no Lula, a quem também tenho muitas críticas. O país vai respirar mais – e imbecis terão vergonha de vir a público e dizer: sou imbecil mesmo, pode cuspir na minha cara! Ou então reacionários e fascistas terão vergonha de aparecer e dizer: sou de direita e tenho muito orgulho de ser assim!

Álvaro Miranda – Jornalista, poeta, mestre e doutor em políticas públicas, estratégias e desenvolvimento pela UFRJ, atualmente fazendo graduação em direito pelo Mackenzie-Rio, autor de cinco livros de poesia, dentre eles, “Estranho país que teus olhos já não procuram mais” (2019, 7Letras), e “Tribunal de Contas no Brasil: a falsa cisão entre técnica e política” (2020, Editora da UFRJ)

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Redação

2 Comentários

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  1. Artigo maravilhoso. O governo bolso é o reino da estupidez, da ignorância. O pior de tudo, entretanto, é que as pessoas não têm consciência da própria ignorância e, portanto, nada farão para mudar a própria ignorância.

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