BC “torra” US$ 20,9 bilhões para segurar dólar entre julho e outubro, por Lauro Veiga Filho

Quando o BC começou a disparar suas ordens de venda de dólares ao mercado, a moeda norte-americana voltou rapidamente para níveis próximos a R$ 5,18

BC “torra” US$ 20,9 bilhões para segurar dólar entre julho e outubro

por Lauro Veiga Filho

Para aqueles que acreditam em coincidências e mantêm a mesma crença em relação à autonomia e independência do Banco Central (BC), a gestão das reservas internacionais nos últimos meses deveria ao menos suscitar algum tipo de questionamento. Afinal, nos últimos 12 meses, as reservas internacionais do País, que têm funcionado como verdadeira âncora contra crises cambiais por mais de uma década, registrou perda de praticamente US$ 42,381 bilhões, caindo 11,52% no período, de US$ 367,927 bilhões em outubro do ano passado para US$ 325,546 bilhões no mesmo mês deste ano – o nível mais baixo desde março de 2011, quando havia alcançado US$ 317,147 bilhões.

Quase metade dessa perda, no entanto, algo como US$ 20,857 bilhões, ocorreu no curto período entre o final de julho e outubro deste ano. Apenas para registro, os dólares estacionados nas reservas externas do País encolheram de US$ 346,403 bilhões para aqueles pouco mais de US$ 325,5 bilhões. Foram necessários apenas três meses para que o BC sacasse contra as reservas internacionais o equivalente a 49,21% de todos os dólares gastos num período de 12 meses.

Em torno de US$ 2,0 bilhões foram sacados apenas em outubro. Segundo o BC, a queda em relação a setembro explica-se em função, “primordialmente, de vendas líquidas de US$ 1,0 bilhão em operações de linhas com recompra (quando o BC vende dólares ao mercado sob o compromisso de recomprar a moeda mais adiante), e contribuições negativas das variações de preços, US$ 823 milhões, e de paridades, US$ 166 milhões. A receita de juros totalizou US$ 576 milhões” (valor recebido pelo País a título de remuneração pelos dólares aplicados em ativos no exterior, que incluem títulos soberanos de países com moeda forte, sobretudo Estados Unidos, aplicações em ouro e outras formas de investimento).

Eleições no radar

O período extremamente conturbado atravessado pelo País nos últimos meses, com turbulências acirradas pelo desgoverno e sua trupe despudorada, início da campanha eleitoral e um cenário igualmente complicado na área internacional, havia produzido uma disparada nos preços do dólar entre o final de maio e o dia 21 de julho, na série de dados do próprio BC. Convertida em reais, a cotação do dólar experimentou salto de quase 16% naquele intervalo, avançando de R$ 4,72 para R$ 5,47 e mais uns quebrados. No mesmo período, como se recorda, o desgoverno e sua equipe econômica, sob comando do ministro dos paraísos fiscais, passaram a atuar ainda de forma mais destrambelhada, com o propósito único de reverter o resultado que as pesquisas eleitorais já anteviam.

A partir de junho, em meio a uma série de medidas nitidamente eleitoreiras, o governo federal, com ajuda do Congresso, impôs aos Estados a redução de impostos sobre combustíveis e energia, o próprio governo federal chegou a zerar a cobrança de contribuições sobre a gasolina e o diesel, ao mesmo tempo em que gastos extraordinários foram disparados nas semanas que antecederam as eleições, contrariando a legislação eleitoral e a própria Lei de Responsabilidade Fiscal (sob silêncio dos tais mercados).

Tanto que, até o final deste ano, segundo previsões recentes de especialistas em contas públicas, a despesa primária do governo central deverá estourar o teto de gastos em alguma coisa próxima a R$ 116,2 bilhões. Será o terceiro ano consecutivo de desrespeito ao famigerado teto, que impôs o congelamento virtual dos gastos primários por duas décadas (com a devida exclusão das despesas com juros, que não estão limitadas por teto algum).

Efeitos transitórios

Além de injetar recursos na economia na tentativa de reanimar o mercado, o governo buscava frear o avanço dos preços, que vinha agravando a carestia e roubando votos especialmente nas faixas de renda mais baixa da população. A redução de impostos de fato funcionou para derrubar a inflação, mas os efeitos foram sentidos muito mais entre as famílias de renda média em função da queda nos preços dos combustíveis.

O efeito foi meramente passageiro. A inflação transitou por terreno negativo entre as duas últimas semanas de julho e a quinzena final de setembro, voltando a subir na sequência. A taxa oficial de inflação chegou a ficar negativa em 073% nas quatro semanas encerradas em 15 de agosto, mas avançou para 0,59% nos 30 dias de outubro, mantendo-se ao redor de 0,53% na segunda quadrissemana de novembro (quer dizer, entre as duas últimas semanas de outubro e as duas primeiras deste mês).

Quando o BC começou a disparar suas ordens de venda de dólares ao mercado, a moeda norte-americana voltou rapidamente para níveis próximos a R$ 5,18 até o final de agosto. Ao longo de setembro, a cotação experimentou alguma elevação, fechando o mês em pouco menos de R$ 5,41 – o que havia correspondido a uma variação de 4,39% em 30 dias, às vésperas do primeiro turno. Nos dias seguintes, até 21 de outubro, o dólar variou ao redor de R$ 5,20, iniciando mais uma tendência de elevação que levaria o câmbio a subir aproximadamente 3,0%, para quase R$ 5,35 no dia 28 do mesmo mês, dois dias antes do segundo turno.

Para registro, no fechamento de ontem, sexta-feira, dia 25, o dólar fechou em R$ 5,35. Entre oscilações, altos e baixos, a cotação manteve-se nos mesmos níveis de 28 de outubro. Nada garante que não haverá novas altas (ou quedas), ao sabor das especulações e das jogadas usualmente arranjadas pelos mercados para – surpresa, surpresa – ganhar dinheiro.

Lauro Veiga Filho – Jornalista, foi secretário de redação do Diário Comércio & Indústria, editor de economia da Visão, repórter da Folha de S.Paulo em Brasília, chefiou o escritório da Gazeta Mercantil em Goiânia e colabora com o jornal Valor Econômico.

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