Finalmente, alguém falou em impeachment, por João Almeida Moreira

Temos reunidas as condições para que um protagonista da política nacional tenha mencionado, pela primeira vez, a tal palavra proibida - impeachment - sem que ninguém lhe perguntasse nada sobre o assunto. Esse protagonista foi o próprio Jair Bolsonaro

Foto: Evaristo Sá/AFP

do Diário de Notícias

Finalmente, alguém falou em impeachment

por João Almeida Moreira

Dados os escândalos seguidos e as gafes imparáveis, com menos de cinco meses de governo, um protagonista da política brasileira usou, finalmente, a palavra proibida: impeachment.

A história, ainda curta mas rica, da democracia brasileira, no entanto, diz-nos que escândalos e gafes, por maiores que sejam, não bastam para derrubar presidentes.

Caso contrário, Lula da Silva teria caído logo que se começou a especular sobre o Mensalão, o esquema de compra de votos de deputados com dinheiro público – praticado na política brasileira, se bem que de forma desorganizada, antes e depois daquele primeiro mandato do líder do PT, registe-se.

No entanto, o Brasil vivia, sob o governo do ex-sindicalista, um período de bonança econômica. E controlava o Congresso – perverso e criminoso, o tal Mensalão tinha, no entanto, o condão de assegurar estabilidade política.

Lula, portanto, não foi derrubado.

Quando Michel Temer foi gravado por um corrupto a combinar nos porões do oficial Palácio do Jaburu subornos a um aliado preso, caíram o Carmo e a Trindade. Que voltaram a cair nos dias seguintes, ao ser partilhado nos noticiários um vídeo do assessor especial do presidente com uma mala cheia de dinheiro recebida das mãos de um funcionário do tal corrupto numa pizaria de São Paulo.

No entanto, como Temer dera início a uma reforma laboral, exigida pelo patronato, e determinara o fim da obrigatoriedade de gastos em educação e saúde, considerada essencial para reorganizar as finanças públicas segundo o mesmo patronato, sentiu-se que o investimento iria aparecer e aquecer a economia. E a maioria do Congresso, composto quase exclusivamente por patrões, manteve-o no posto.

Caíram o Carmo e a Trindade mas Temer não.

Ou seja: para haver impeachment não bastam escândalos ou gafes. O que determina a queda de um presidente é a soma da degradação da confiança na economia com a perda de apoio parlamentar.

Foram essas crises – económica e política – que derrubaram Collor de Mello e Dilma Rousseff. O primeiro acabaria por perder o mandato por uma irregularidade associada à compra de um carro utilitário; a segunda, por pedaladas orçamentais iguais às que todos os antecessores já haviam cometido.

Pretextos, portanto.

Em pouco mais de quatro meses, as gafes de Bolsonaro e da chamada “ala psiquiátrica” do governo superaram as de todos os outros governos eleitos em 20 anos de democracia.

E os escândalos para lá caminham: já caíram dois ministros, um por ação do filho do presidente, o outro por incompetência, e ainda devem cair mais dois, um por estar também debaixo da mira do tal filho e outro por um esquema de candidaturas-fantasmas.

Os núcleos do governo – os discípulos do guru Olavo de Carvalho, os generais, os evangélicos e os paraquedistas na política, como um ator porno, uma ex-jornalista acusada de plágio e um batalhão de delegados de polícia – não passam um dia sem se ofenderem mutuamente, debaixo do nariz de Bolsonaro.

E outro filho do presidente beneficiou-se, diz o Ministério Público, de um esquema de desvio de dinheiro de assessores. Nesse esquema, cabem crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, peculato e talvez nepotismo. Crimes que podem atingir o próprio presidente. Crimes que podem até estar ligados a crimes de sangue, como o da execução da vereadora Marielle Franco.

No entanto, repita-se, esses escândalos e essas gafes por si não bastam para derrubar o presidente. Mas a subida do dólar acima de quatro reais, a persistência do desemprego, a ameaça de retração do PIB e a espera, desesperada, dos empresários por um sinal de retomada económica, podem bastar.

Some-se uma manifestação de rua na semana passada, em cerca de 200 cidades do país, a que os congressistas costumam ser muito sensíveis, e temos reunidas as condições para que um protagonista da política nacional tenha mencionado, pela primeira vez, a tal palavra proibida – impeachment – sem que ninguém lhe perguntasse nada sobre o assunto.

Esse protagonista foi o próprio Jair Bolsonaro.

Redação

9 Comentários

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  1. nos tempos collor o ambiente começou a ficar anuviado
    e os ministros e assessores desesperaram-se , atacando-se….
    agora houve alguns lances como os da janaína aloprada pascoal
    e outros dando indicações de que tiram o time
    de campo do lado bolsonárico….
    é assim que começam as defecções…
    não dá pra subestimar a doideira dessa gente
    inepta da direita fascista, mas é evidente que não tem
    o que defender de positivo para o país….
    aliás, é inacreditável que consigam viver com
    tanto ódio e tanta ideia destrutiva de mundo…
    nesse mundo diabólico deles,
    deus distanciou-se
    e está cada vez mais ausente…
    e sem deus a jagunçada vira o diabo e se arma
    para praticar besteiras pelo mundo já violento
    de seus patrões de araque….
    parece que o dito riobaldino – o diabo na
    rua no meio do redemoinho – passou a vigorar no país até
    esses mequetrefes que só pensam em suas
    ganancias começarem a perceber que viver é mais do que
    resmungar e seguir esses desregramentos fascistas
    que inundam seus cotidianos…….

  2. Tem que cassar a chapa pelo caixa 2 do whatsapp e entregar o posto ao segundo colocado. Mas pera, todo o centrão participou do golpeachment, vão seguir a lei pra que? Pra por um “inimigo” no poder, como diria o capetao??

  3. Não vejo os, como diz o articulista, “patrões” muito insatisfeitos, não. Pelo contrário, até agora esses patrões estão conseguindo tudo o que os levou a derrubar o governo anterior, de nítida orientação social-democrata: sugaram, da Petrobrás, mais do que que qualquer esquema ilícito e com aplicação de leis prá lá de questionável; desmontaram a indústria nacional de construção civil, os recursos militares (exército, aeronáutica e marinha), estão a um passo de dar licença para a entrada de armas estadunidenses (a NRA agradece); estão espalhando firmas estrangeiras que vendem diploma e eventualmente alguma educação, unisquinas a preços módicos criando piões para exércitos de contingência; espalham-se fornecedores de serviços médicos de preços também módicos mas de qualidade também altamente questionável… enfim, os tais “patrões” não devem estar tão insatisfeitos assim, a ponto de tirarem Bolsonaro, estão conseguindo espalhar pobreza, incompetência e mediocridade e, ao mesmo tempo, concentrando renda. Viceja a pobreza geral e em todos os sentidos, ainda que em embalagens, argumentos de venda, “gourmet”.

    Se é verdade que são esses patrões – e não o povo – que mantém um governo, Bolsonaro não cairá tão cedo…

  4. Análises vazias,sem nenhum fundamento,sem compromisso com a verdade. O que leva o indivíduo a escrever essas leviandades. O Brasil precisa de uma faxina, quando a verdade chegar, esses pseudos escritôres, ficam com a cara grande.

  5. Não vejo desta maneira. Não precisa ser um hábil operador do Direito para se vislumbrar que há, sim, elementos suficientes para se entrar com um processo de impeachment contra o desgoverno de Bolsonaro. Por outro lado, ainda que não me morra de amores pelo Gal. Mourão, e esquecendo a determinação constitucional de que ele seria o sucessor no caso de impeachment, é ele que vem dando sustentação ao governo incompetente de Bolsonaro. Não é à-toa que ele viajou para a China para apagar o fogo provocado pelo presidente contra o governo chinês. Com o impeachment de Bolsonaro, a permanência de Mourão ou não, até o final do mandato, seria ou departamento. O que não se pode é deixa os destinos da nação nas mãos deste maluco…

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