O aumento dos suicídios de idosos na Coreia do Sul

Do MSN

Mudanças sociais na Coreia do Sul levam a aumento de suicídios de idosos

Por Choe Sang-hun- The New York Times News Service/Syndicate

Seul, Coreia do Sul – Mesmo com o aumento dramático de suicídios na Coreia do Sul, o caso da viúva de 78 anos foi chocante a ponto de merecer atenção na recente eleição presidencial e repercutir na mídia.

Em vez de tirar a própria vida em casa, silenciosamente, como muitos sul-coreanos o fazem, a mulher fez de sua morte um ato final de protesto público contra uma sociedade que, segundo ela, a abandonou. Ela bebera pesticida durante a noite em frente à prefeitura, após funcionários do governo suspenderem seus benefícios da assistência social, afirmando que não precisavam mais sustentá-la agora que seu genro havia encontrado emprego.

‘Como podem fazer isso comigo?’, perguntava no bilhete de suicídio que a polícia informou ter encontrado em uma bolsa perto de seu corpo. ‘Uma lei deveria servir ao povo, mas ela não me protegeu.’.

A morte da idosa é parte de uma das estatísticas mais terríveis da Coreia do Sul: o número de pessoas com 65 anos ou mais cometendo suicídio, que quase quadruplicou nos últimos anos, tornando a taxa dessas mortes no país uma das mais altas no mundo desenvolvido. A epidemia é o contraponto do grande sucesso econômico da nação, que desgastou o contrato social confuciano que formou a base da cultura coreana há séculos.

Esse contrato foi criado na premissa de que os pais fariam quase qualquer coisa para cuidar de seus filhos – nos tempos atuais, esgotando as economias de suas vidas para pagar por uma boa educação – e depois terminar suas vidas sob os cuidados dos filhos. Nenhum sistema de Previdência Social era necessário. Casas de repousos eram raras.

Mas quando as gerações mais jovens e determinadas da Coreia do Sul se juntaram ao êxodo das fazendas para as cidades nas últimas décadas, ou simplesmente acabaram trabalhando mais arduamente no meio hiperconcorrido que ajudou a impulsionar o milagre econômico da nação, os pais foram, muitas vezes, deixados para trás. Muitos idosos agora vivem os seus últimos anos na pobreza, em áreas rurais que transmitem a sensação de melancolia das cidades-fantasmas.

Lee Geum-sook, right, a volunteer who works with elderly people, holds the hand of Yoon Jeom-do, an 89-year-old woman who lives alone in an apartment, in Seoul, South Korea, Oct. 18, 2012. The epidemic of suicides among the elderly in South Korea is the flip side of the nation

Tais mudanças sociais não são incomuns no mundo industrializado. No entanto, a mudança súbita provou ser especialmente perturbadora na Coreia do Sul, onde os pais veem seus sacrifícios como o equivalente ao plano de pensão, e aqueles que estão sofrendo estão virando vítimas das mudanças que eles mesmos ajudaram a provocar enquanto reconstruíam a economia devastada pela Guerra Coreana.

‘A família sempre foi uma extensão do ser’, afirmou Park Ji-young, professor de bem-estar social na Universidade de Sangji, em Wonju. ‘Os filhos eram tudo o que tinham para o futuro – os cuidados de saúde, o apoio financeiro e uma vida confortável na velhice. O sucesso dos filhos era o sucesso da família.’

Tornando as questões mais difíceis para os idosos, o governo foi pego de surpresa pelo rápido desgaste da estrutura familiar tradicional.

O governo começou a criar um sistema público de pensão em 1988, mas dizem que, na maioria dos casos, os pagamentos mal cobrem os custos básicos de subsistência, e muitos dos sul-coreanos mais idosos não têm cobertura porque eles já tinham passado da idade produtiva quando o sistema foi criado. Um relatório do governo em 2011 deu conta de que apenas quatro de cada 10 pessoas acima de 65 anos tinham pensão pública ou privada ou economias para a aposentadoria.

E, como a idosa que se envenenou em agosto descobriu, a lei nega o benefício às pessoas cujos filhos são considerados capazes de sustentá-las. Isso deixa a alguns pais a humilhante escolha de pedir ajuda aos filhos ou ao governo, que pode dar isenções se ficar provado que os filhos não querem ou não podem ajudar.

Em um país que valoriza muito a dignidade, especialistas sobre idosos afirmam que é uma escolha dolorosa. Park disse que alguns se matam porque se sentem traídos; outros são levados a isso pelo medo de prejudicarem as chances de suas famílias progredirem.

As taxas são alarmantes; os suicídios entre pessoas com 65 anos ou mais subiram para 4378 em 2010, contra 1161 em 2000. O número de suicídios entre outros adultos e adolescentes também aumentou, embora essas mortes sejam geralmente atribuídas ao estresse de viver em uma sociedade altamente competitiva e não às mudanças na estrutura familiar que estão levando os idosos ao desespero.

O governo diz que está tentando ajudar, propondo uma idade mais alta para a aposentadoria de forma que as pessoas possam economizar mais dinheiro, mas essa é uma ideia difícil de vender, com o desemprego crescente entre jovens. O governo também tornou obrigatório aos municípios criarem centros de prevenção de suicídio para todas as idades, e esses centros proclamaram alguns êxitos.

Kim Man-jeom, de 73 anos, foi um deles. Após o marido morrer em 2011, ela ficou consternada com o fato dos filhos não a convidarem para morar com eles, mas ela também tinha pavor de ser tornar um peso. ‘Quando vi uma gravata, pensei em me enforcar’, afirmou em uma entrevista. Ela foi salva, afirma, por um empático assistente social.

Mas, como indício revelador de que a causa fundamental da angústia – o desgaste do tecido social – não foi tratado sistematicamente, uma pequena, porém crescente, parcela de idosos coreanos está morrendo sem que ninguém reivindique os corpos ou realize os rituais tradicionais tidos como facilitadores do caminho na vida após a morte.

Kim Seok-jung, que abriu uma empresa na cidade do sul de Pusan para cuidar dos pertences dos falecidos, afirma que se assombra com o caso de uma mulher de 73 anos cujo corpo foi encontrado em fevereiro, meses após sua morte.

‘O calendário na parede da falecida estava em outubro’, Kim disse. ‘Quando olho para esses idosos, vejo como a minha própria geração irá morrer.’

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Luis Nassif

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