Itamar 6: privatizações e processos

Desde o período Collor, embora não fosse contra as privatizações em si, era crítico do modelo adotado. Fui o primeiro a cunhar a expressão “moedas podres”, para as moedas incluídas no modelo de privatização – títulos da Siderbrás, Eletrobras etc.

Defendia um modelo de “fundos sociais”, no qual a União, estados e municípios reconheceriam dívidas com fundos sociais (INSS, FGTS, Pis-Pasep, FAT). Essas dívidas seriam transformadas em obrigações sociais que constituiriam fundos de privatização beneficiando os trabalhadores.

No governo Collor, apelidei a ideia de Plano K. Não prosperou. Com Itamar, achei que teria mais chances. Mas, àquela altura, o processo de privatização já tinha sido empalmado por um grupo composto por Vladimir Riolli (estreitamente ligado a Serra), José Roberto Mendonça de Barros e Andrezinho Franco Montoro, com a estratégia já definida de criar novos grupos aliados.

No episódio da privatização da Ultrafértil, demonstrei que o modelo de precificação da companhia era viciado. Utilizavam taxas internas de retorno excessivas e depreciavam o valor da companhia projetando os preços dos fertilizantes – àquela altura depreciados pelo fato da Rússia ter despejado estoques imensos no mercado internacional.

Nem com as denúncias, calculadas e documentadas, o processo foi interrompido. Tentei criar um fato político e acusei Itamar de ser “pusilânime”.

O adjetivo pegou na veia. Itamar convocou uma reunião com a Casa Civil, Militar, lideranças políticas na Câmara e no Senado, para me processar.

Líder no Senado, Pedro Simon tentou colocar panos quentes. Mas, na reunião, Itamar abriu o dicionário e passou a se indignar cada vez mais com os sinônimos de “pusilânime”:

–       Olha aqui: covarde, biltre, poltrão!, esbravejava.

Pedro Simon me salvou do primeiro processo:

–       Mas, presidente, está aqui que sinônimo de “pusilânime” é indeciso. E a indecisão é a marca de todo democrata.

–       Ah, indeciso eu sou mesmo, concluiu Itamar, deixando de lado o processo.

Continuei batendo no modelo da privatização. Voltei ao ataque no caso da CSN e, quando Itamar e o grupo de Juiz de Fora aprontou uma das suas – acho que declarações bestas sobre a economia – fui convidado pelo Jô Soares e dei uma entrevista cáustica contra ele.

Dessa vez, veio o processo.

Aí ocorreu um fato curioso, mostrando o caráter das pessoas.

O presidente do BNDES era Alexis Stepanenko, homem de confiança de Itamar. Aliás, no período que precedeu o impeachment do Collor, ele era uma das minhas fontes, sustentando que não haveria loucuras com Itamar.

Soube do processo em Brasília. No dia seguinte teria um café da manhã com Yeda Crusius. Aí, recebo dois telefonemas. Um, do Alexis, se dizendo solidário comigo e concordando com minhas críticas.

Baita prova de confiança, já que – pelos padrões de jornalismo já vigentes – poderia ter escrito uma coluna com a conversa que tivemos. Obviamente, não o fiz.

Outro telefonema foi de Yeda, cancelando o café.

O processo de Itamar foi rejeitado pelo juiz de primeira instância. Tempos depois encontro Andrezinho Montoro que me falou do desabafo de Itamar. Disse que a Justiça sempre estava a favor dos “poderosos”. “Poderoso”, no caso, era um jornalista enfrentando o presidente da República.

Luis Nassif

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