Moraes não seria o primeiro: antes do golpe de 64, militares prenderam ministro do STF

No episódio anterior, a prisão do ministro do STF, Victor Nunes Leal, em 1963, e meses depois o golpe de Estado foram concretizados

Victor Nunes Leal foi o ministro do STF preso por militares na Revolta dos Sargentos, meses antes do golpe de 1964 – Foto: Arquivo

Alexandre de Moraes não foi o primeiro ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) alvo de militares em pressão que antecedeu um golpe de Estado. No episódio anterior, entretanto, tanto a prisão como o golpe, no ano seguinte, foram materializados.

A dimensão da perseguição contra Alexandre de Moraes, articulada pelo governo de Jair Bolsonaro e por militares, pode ser melhor dimensionada quando comparada à história recente do país. É o que lembra artigo de Tiago Angelo, no Consultor Jurídico, confira:

Plano para prender Alexandre de Moraes é história se repetindo como farsa

Por Tiago Angelo

Logo no primeiro parágrafo da obra O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, o filósofo, economista e historiador Karl Marx afirma que fatos e personagens de grande importância na história ocorrem duas vezes, a primeira como tragédia, a segunda como farsa.

Os planos para sequestrar Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, revelados pela PF, e de militares que pretendiam prender o ministro, são desses casos que se repetem.

Um episódio parecido aconteceu em 12 de setembro de 1963, uma quinta-feira, durante o primeiro dia do que ficou conhecido como “A Revolta dos Sargentos”. Na ocasião, cabos e sargentos amotinados da Aeronáutica e da Marinha prenderam o ministro do STF Victor Nunes Leal. 

Leal foi pego pelos revoltosos a caminho de um encontro com o ministro Lafayette de Andrada, então presidente do Supremo, e ficou preso na Base Aérea de Brasília durante uma hora e meia, das 10h às 11h30.

No dia anterior, o STF, com a adesão do ministro, decidiu contra a causa de militares que pretendiam assumir cargos eletivos. Também foi alvo da revolta e preso pelos sargentos o presidente em exercício da Câmara dos Deputados, Clóvis Mota (PSD-RN).

Assim que libertado, Leal voltou à sua residência e, em seguida, foi ao Supremo, onde relatou o caso em sessão especialmente convocada por Andrada para tratar da prisão.

Na ocasião, pronunciaram-se, além de Leal e Andrada, o ministro Ribeiro da Costa, o procurador-geral da República, Cândido de Oliveira Neto, e o presidente da OAB-DF, Esdras Gueiros.

Ribeiro da Costa fez um discurso que, meses depois, quando houve o golpe de 1964, se mostraria um tanto profético: defendeu a decisão contra os oficiais que queriam cargos políticos, afirmando que a função das Forças Armadas é outra, e que incentivar a mistura de militares com a política poderia fazer com que as Forças Armadas acabassem por se sobrepor às leis e à Constituição.

“Nessas condições, ao invés de contar o país com Forças Armadas unidas, aptas a agir com a presteza e a energia necessárias em dados momentos, quando a ordem nacional estiver em perigo ou sob ameaça, o que acontecerá, então, é que esses elementos, que são numerosíssimos, e indispensáveis, trarão para o seio das Forças Armadas a cizânia, a divisão, a incompreensão, a indisciplina, pretendendo sobrepor-se, como agora fizeram, não só às leis e à Constituição, mas aos seus superiores hierárquicos,” disse o ministro.

Os discursos da sessão constam no Diário da Justiça de 13 de setembro de 1963 e podem ser lidos clicando aqui. O caso também é narrado no livro Os Presidentes, do jornalista Rodrigo Vizeu.

Prisão de Alexandre
A Polícia Federal identificou evidências de que um grupo do Exército conhecido como “kids pretos” planejava prender Alexandre de Moraes. Eles teriam a incumbência de deter o ministro após uma tentativa de golpe.

“Kids pretos” são militares formados pelo Curso de Operações Especiais do Exército Brasileiro. Eles são treinados para atuar em missões sigilosas e em ambientes hostis e politicamente sensíveis.

A investigação da PF é um dos pontos que embasou a decisão de Alexandre que autorizou operação de busca e medidas cautelares contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), militares e ex-ministros de Estado.

Segundo a PF, Bernardo Romão Correia Neto, ex-assistente do comandante militar do Sul, organizou reuniões com a presença dos “kids pretos” e assistente de generais. A investigação encontrou conversas entre Neto e Mauro Cid, antigo ajudante de ordens de Bolsonaro.

“Os diálogos encontrados no celular de Mauro Cid demonstram que Correia Neto intermediou o convite para reunião e selecionou apenas os militares formados no curso de Forças Especiais (kids pretos), o que demonstra planejamento minucioso para utilizar, contra o próprio Estado brasileiro”, disse a PF em documento enviado à PGR.

Em janeiro, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, contou de um outro episódio envolvendo planos para sequestrar e matar Alexandre.

“Era um movimento para, em primeiro lugar, impedi-lo de atuar e, na sequência, sequestrá-lo e matá-lo da forma mais brutal que se possa imaginar”, disse Andrei em entrevista à CBN.

Leia mais:

Redação

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador