O perfil do novo presidente do Supremo e o desprezo pelas questões morais

O desprezo pelas questões morais balizou também suas ações na campanha que fez como ministro do STF, para dar à filha Marianna Fux, com uma cadeira no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Por Frederico Rochaferreira

No Justificando

No último dia 10, o ministro Luiz Fux tomou posse como presidente do Supremo Tribunal Federal,[1] em uma solenidade marcada por um discurso vazio, desprovido de sinceridade e confiabilidade, cujas palavras iam em direção contrária não só aos nove anos como ministro da Corte, mas também à sua caminhada imoral para conquistar um assento na Corte.

Em seu discurso,[2] permeado por referências aleatórias como os compositores Luiz Gonzaga, Michael Sullivan; os escritores Manoel de Barros, Guimarães Rosa, Fernando Pessoa e Adélia Prato; lutadores de jiu-jitsu como os Gracie, Sergio Penha e Osvaldo Alves, Fux prometeu intensificar o combate à corrupção, enfatizando: “Aqueles que apostam na desonestidade como meio de vida não encontrarão em mim qualquer condescendência”.

Citando a Constituição, Fux salientou que ela sairá fortalecida de todo o processo de reação e reconstrução nacional e que permanece como a âncora do Estado Democrático de Direito e bússola das aspirações presente e futura do país, palavras que soam demagógicas quando olhamos o protagonismo do STF no golpe de 2016 e na arbitrária prisão e condenação do ex-presidente Lula.

O novo presidente do Supremo tem uma mente brilhante,[3] mas sua conduta moral é reprovável. Para chegar ao STF, Luiz Fux não mediu esforços. De acordo com a jornalista Mônica Bergamo, o ministro do Superior Tribunal de Justiça, se aproximou do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, votando a favor do governo Petista em causas bilionárias: “O governo vai achar você o máximo. Aí toda vez que eu concorria (ao STF) ligava para ele (Palocci).” Também espreitou o ex-ministro Delfim Netto, por este ter influência sobre o governo Lula. Fux diz sem pudor, “colei no pé dele [risos].”

João Pedro Stédile foi outro de quem Fux se aproximou ao decidir uma conciliação favorável ao líder dos sem Terra em um confronto no Pontal do Paranapanema. Fux relembra: “Depois pedi a ele (Stédile) para mandar um fax me recomendando e tal. E ele mandou”, assim como usou da amizade com o ex-governador Sérgio Cabral, que hoje cumpre pena por corrupção e lavagem de dinheiro num presídio do Rio, para fazer lobby junto à presidente Dilma Rousseff. “Eu sou amigo dele (Sérgio Cabral) e também da mulher dele. E ele levou meus currículos [para Dilma]. Você tem que ter uma pessoa para levar seu perfil e seu currículo”[4] e claro, em se tratando de um governador amigo do governo, era acima de tudo uma recomendação valiosa.

Contudo, sua maior cartada imoral para conquistar uma vaga no Supremo a qualquer custo, foi o possível assédio ao ex- ministro José Dirceu. Segundo Dirceu, que evitou recebê-lo por um bom período, Fux o assediou por seis meses, dizendo conhecer o processo do mensalão no qual Dirceu estava envolvido, prometendo absolvê-lo. Finalmente em 2011, Fux foi nomeado pela presidente Dilma para o STF e no julgamento do mensalão votou pela condenação de Dirceu, quando deveria se declarar impedido de votar.[5][6]

No âmbito da Operação Lava-Jato, que usou e abusou de ações marginais na caça às bruxas a membros do Partido dos Trabalhadores, veio à tona diálogos entre o procurador Deltan Dallagnol e o ex-juiz Sérgio Moro, em que o primeiro cita uma conversa que manteve com o ministro Fux sobre seu apoio à Lava-Jato[8]. No diálogo com Sérgio Moro, Dallagnol escreve: “Fux disse para contarmos com ele para o que precisarmos, mais uma vez” e Moro responde, “nesse podemos confiar”. Fux negou a conversa[9], mas foi dele a canetada que censurou a entrevista que o ex-presidente Lula daria à Folha de São Paulo antes das eleições de 2018.[10]

Em 2014, Fux garantiu mais um privilégio à casta dos juízes, concedendo auxílio-moradia a todos os magistrados do país, mesmo para aqueles que comprovadamente tinham residência própria na cidade onde atuavam[11]. Quatro anos depois, suspendeu o auxílio-moradia como resultado de um acordo com o presidente Michel Temer para garantir o reajuste dos salários dos ministros do Supremo[12], mas propôs que o Conselho Nacional de Justiça aprovasse um novo auxílio-moradia com o mesmo valor de R$ 4.377, para uma casta menor de juízes, o que foi feito no mês seguinte.[13]

O desprezo pelas questões morais balizou também suas ações na campanha que fez como ministro do STF, para dar à filha Marianna Fux, com uma cadeira no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Literalmente Fux pressionou para que a filha fosse nomeada desembargadora. O processo que é conduzido pela Ordem dos Advogados do Brasil, apresenta uma lista de seis nomes e em seguida os desembargadores em votação no Tribunal de Justiça reduzem a três, sendo a escolha final feita pelo governador. Na época o governador era Sérgio Cabral e ele foi o primeiro a ser informado pelo amigo Fux, que queria ver a filha advogada, desembargadora no TJ do Rio. Cabral repassou o recado do amigo ao presidente da OAB na época, Wadih Damous.

A campanha de Fux em favor da filha se intensificou no primeiro semestre de 2014, quando se multiplicaram os relatos de telefonemas do ministro do Supremo a bancas e gabinetes de magistrados e políticos pedindo apoio para sua filha, período em que Fux recebeu para um almoço em Petrópolis, desembargadores, ministros de tribunais superiores e o governador do Rio Luiz Fernando Pezão.

Wadih Damous, que presidiu a OAB do Rio por dois mandatos, entre 2007 e 2012, foi um dos receberam o telefonema aliciador de Fux: “Expliquei que não estava mais na OAB, mas ele ponderou que eu ainda exercia liderança sobre os conselheiros e disse que precisava da minha ajuda. Falei que não só não me meteria no assunto, como, se pudesse, não votaria na filha dele”.[14]

Além da autoridade e influência como ministro do STF, Fux tinha outro trunfo para garantir a escolha de sua filha para o Tribunal de justiça do Rio. Sob sua guarda, estavam vários processos-chave para o estado do Rio e para os magistrados, como a ação dos auxílios salariais que permitem a 90% dos desembargadores ganhar bem mais do que o teto do funcionalismo público, auxílios que o então ministro Carlos Ayres Britto extinguiu em 2012, mas Fux pediu vistas e suspendeu a decisão, guardando a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4393 que tratava do assunto no fundo da gaveta do STF.[15]

Outra cartada de Fux foi impedir por meio de liminar, a votação no Congresso que daria aos estados não produtores de petróleo uma fatia dos royalties, beneficiando sobretudo o Rio de Janeiro, questão que também se encontrava estrategicamente no fundo na gaveta.[16] Em março de 2016, não houve surpresa. A advogada Marianna Fux, foi escolhida pelo governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, como a nova desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro[17]. Posteriormente o governador Pezão foi acusado e preso por integrar um esquema de corrupção chefiado pelo amigo e padrinho político, o ex-governador Sérgio Cabral[18]

O desprezo pelas questões éticas e morais do atual presidente do Supremo Tribunal Federal não surpreende, é apenas o reflexo de um sistema moral duvidoso que rege tanto a sociedade quanto as instituições brasileiras.

Frederico Rochaferreira é escritor, especialista em Reabilitação pelo Hospital Albert Einstein, membro da Oxford Philosophical Society

 

Redação

3 Comentários

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  1. E Fux vai agora mostrar toda a sua verve autoritária, pois é daqueles que entende que o poder deve não apenas ser exercido, mas demonstrado. Ele cometerá abusos mesmo sem razão mas para demonstrar que pode. Quem fez o que fez para conseguir sua vaga e a da filha, não se incomodará de fazer qualquer coisa para conseguir seus objetivos pessoais e familiares. O pior é que não temos clareza, sobre quais os seus objetivos, mas não espero que sirva a nada e a ninguém que não a si mesmo. A política, o mercado e a propria justiça são apenas meros instrumentos para seguir seus objetivos. Ele jamais será lembrado pelo conhecimento jurídico, pois se o tem , o considera apenas mais uma arma a ser utilizada.

  2. Direitos não são constitucionais, são existenciais. Nossa existência é a prova cabal disso, pois independe de certidões ou números em um formulário. Quando o homem se arvora a ser o criador dos direitos, ele o faz pois não aceita que leis naturais (físicas ou comportamentais) derivam da origem da criação, quer ser ele o criador das regras, é como querer ser “Deus” sobre os outros homens. Todo mundo que apoia o estado de Direito tem um pouco de síndrome de Napoleão ou quem sabe Luis XIV o rei sol. Se “não roubar” é a base das religiões e do estado de direito, como esperamos que uma organização com base em “ações coercitivas” gere ordem? Por pensamento mágico? O problema acaba quando termina o nosso consentimento para que essas arbitrariedades ocorram. A única pergunta política que deveríamos fazer é pq obedecemos governos?

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