Requalificar o debate nacional para derrotar o obscurantismo, por José Machado

O Brasil hoje é liderado por um estadista e, apesar das enormes concessões que tem sido obrigado, tem tomado iniciativas importantes

Ricardo Stuckert

Requalificar o debate nacional para derrotar o obscurantismo

por José Machado

Por que nos falta o sonho coletivo de virmos a ser uma Nação desenvolvida num ponto futuro de nossa história? Estamos fadados a ser eternamente um país subdesenvolvido?

Essa situação pode ser metaforizada da seguinte maneira. Estamos confinados numa sala com uma janela fechada e, portanto, só enxergamos as quatro paredes. Somos incapazes de abrir a janela e de olhar para o horizonte, com a ambição de alcançá-lo. Conformamo-nos com o quotidiano pobre e exasperador vivido na sala fechada.

Essa é uma reflexão idílica, sabemos bem, porque desconsidera que nessa sala fechada há uma elite poderosa cujos interesses bloqueiam a germinação do sonho coletivo e impedem que a janela seja aberta.

Contudo, em dado momento desse estado de coisas, fruto dos embates entre os que convivem nessa sala, abrem-se oportunidades para se romper esse bloqueio. Essas oportunidades podem e devem ser induzidas? Inequivocamente, sim.

Acordemos do sonho e pensemos a respeito. O Brasil hoje é governado por um governo progressista liderado por um estadista e, apesar das enormes concessões que tem sido obrigado a fazer em nome da governabilidade, tem tomado iniciativas importantes, viceja a esperança de que ele acalente as oportunidades e promova as condições para que vislumbremos o futuro e o conquistemos. Medidas como a Reforma Tributária e a Nova Indústria Brasil são portadoras de futuro, contudo, o conjunturalismo reinante no debate público tem obscurecido e, em larga medida, impedido, na medida e intensidade necessárias, o vislumbre do futuro

Alinhando-me a outros autores, defendo a imperiosa necessidade de se erigir uma política nacional de desenvolvimento de longo prazo para nosso país, de modo a superar a visão e a postura conjunturalistas em vigor, que nos coloca como nau sem rumo, ao sabor do vento. Defendo ainda que tal política, para ser eficaz, tem que ser institucionalizada por lei, de modo a ter caráter vinculante para os governos de plantão e, pois, se perpetuar como uma Política de Estado, lembrando que essa é uma exigência de nossa Constituição, conforme rezam o inciso IX do seu artigo 21 e o parágrafo primeiro do artigo 174, ainda não regulamentados.

O atual governo, inexplicavelmente, extinguiu a Secretaria de Assuntos Estratégicos – SAE e não criou um sucedâneo vocacionado para coordenar internamente ao governo o pensamento estratégico, de modo a superar a fragmentação que o inibe de pensar o país no longo prazo. Lembremo-nos de que o Ministério do Planejamento está estruturado atualmente apenas para o planejamento de curto prazo, ou seja, para a elaboração do Plano Plurianual (PPA). No organograma deste Ministério consta uma Subsecretaria de Planejamento de Longo Prazo, porém sem status para tarefa dessa envergadura. Há que se pensar, pois, preferencialmente, na recriação da SAE, porém, não sendo possível na atual conjuntura, adotar uma solução paliativa que supra essa lacuna, de modo a dar ao atual governo condições para formular uma proposta de política de desenvolvimento de longo prazo, a ser levada ao debate público e submetida, ao seu tempo, ao Congresso Nacional.

A solução paliativa para suprir tal lacuna poderia ser a criação, mediante Decreto Presidencial, de uma Comissão Governamental ou algo-que-o-valha de alto nível, bem estruturada e com dedicação exclusiva.

Metodologicamente essa Comissão estaria orientada para não começar do zero, ou seja, ser capaz de resgatar e atualizar os conteúdos produzidos nos governos pretéritos do Presidente Lula (Brasil em 3 Tempos, 2004, pelo Núcleo de Assuntos Estratégicos; Enunciados Estratégicos para o Desenvolvimento, 2006, pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e; Brasil 2022, 2010, pela Secretaria de Assuntos Estratégicos). Tal Comissão teria autonomia e capacidade para articular e incorporar, mediante motivação explícita, as contribuições advindas de órgãos internos ao governo federal (ministérios, IBGE, IPEA, Embrapa, BNDES, SUDENE, SUDAM, SUDECO, etc.), de instituições acadêmicas e da sociedade civil (partidos políticos, movimentos sociais, sindicatos, setores produtivos, institutos e fundações, etc.), além dos governos estaduais e municipais. Nesse contexto, políticas setoriais, como a Nova Indústria Brasil, dotadas de espectro estratégico de longo prazo, obviamente serão incorporadas no escopo da política geral de desenvolvimento de longo prazo.

À guisa de sugestão, o Projeto de Lei, ponto culminante desse esforço, deveria ter como conteúdo mínimo:

  • Eixos estruturantes, diretrizes e metas estratégicas;
  • regras vinculantes de cumprimento obrigatório pelas ações governamentais, notadamente a que vincula o PPA ao Plano Nacional de Longo Prazo;
  • definição do horizonte de planejamento e de regras para correção de rumos face à emergência de fatores excepcionais internos e externos.

Essa tarefa elaborativa não pode prescindir de um prazo para sua conclusão. A sugestão que fazemos é que a minuta da proposta da política geral de desenvolvimento de longo prazo, na forma de Projeto de Lei, esteja concluída até, no máximo, o primeiro trimestre de 2025, garantindo-se tempo hábil para ser submetida ao crivo presidencial e encaminhado ao Congresso Nacional até o final do primeiro semestre desse ano.

A expectativa é a de que tal matéria, debatida larga e intensamente na sociedade brasileira, introduza, ao longo do próximo período, uma nova atmosfera de reencantamento no país de que fala Aldo Fornazieri (https://jornalggn.com.br/noticia/o-governo-lula-precisa-se-reinventar-por-aldo-fornazieri/), requalificando o debate político e, pois, libertando-o, como força catalisadora e coesionadora, das amarras do conjunturalismo sufocante e paralisante que alimenta a direita obscurantista.

José Machado – Foi Deputado Estadual (1987-88), Prefeito de Piracicaba (1989-92 e 2001-04) e Deputado Federal (1995-98 e 1999-2000)

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