Porta de saída do Bolsa Família são os novos empregos, diz Lula

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Em entrevista para o jornal mexicano La Reforma, dada um dia antes  de sua viagem ao México, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva afirmou que a política de transferência de renda para os brasileiros mais pobres não foi assistencialista, mas um investimento. E que a chave do sucesso do programa brasileiro — o programa mexicano não obteve o mesmo êxito — foi a criação de empregos como portas de saída para o Bolsa Família e a erradicação da pobreza ter se mantido como prioridade de governo.  Abaixo, a íntegra da matéria.

“Atacar a pobreza, compensa”

Na véspera de sua chegada ao México para participar da Cruzada Nacional contra a Fome, o ex-Presidente brasileiro enfatizou que a chave do sucesso da política social de sua administração foi dar aos mais necessitados opções que lhes permitissem superar essa situação.

“A porta de saída foi a criação de 19 milhões de empregos. Foi formalizar 11 milhões de empreendedores individuais. A grande saída foi a regularização de 3 milhões de micro e pequenas empresas no Brasil. Precisamos vencer o discurso conservador que diz que essas políticas são populistas”, destacou em entrevista ao La Reforma

“No Brasil, não aceitamos que dissessem que eram políticas assistencialistas ou que eram gastos porque, para nós, é investimento. Investimos no pobre, ele passou a consumir, o consumo movimentou o comércio, o comércio comprou da indústria e da agricultura, e assim todos os setores começaram a gerar mais empregos”.

De acordo com informação oficial do Brasil, na gestão Lula – de 2003 a 2010 – 33 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema e a classe média aumentou em 40 milhões.

Por Alberto Armendáriz

Investir nos mais necessitados é chave para que países como o México possam crescer de maneira sustentável, afirmou o ex-Presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva.

“No Brasil, não aceitamos que dissessem que eram políticas assistencialistas ou que eram gastos porque, para nós, é investimento”, enfatizou em entrevista exclusiva a LA REFORMA, poucas horas antes de chegar ao país para participar da Cruzada Nacional contra a Fome.

“Investimos no pobre, ele passou a consumir, o consumo movimentou o comércio, o comércio comprou da indústria e da agricultura, e assim todos os setores começaram a gerar mais empregos. Os resultados são extraordinários”.

“O importante é uma política de Estado permanente, que seja duradoura, que não seja feita por um ano”, advertiu Lula, em cuja administração conseguiu-se tirar 33 milhões de pessoas da extrema pobreza e aumentar em 40 milhões a classe média brasileira.

O ex-operário metalúrgico e fundador do Partido dos Trabalhadores (PT) do Brasil, explicou que a chave do sucesso da política social de seu governo foi dar aos mais necessitados uma porta de saída que permitisse a eles superar essa situação.

“A porta de saída foi a criação de 19 milhões de empregos. Foi formalizar 11 milhões de empreendedores individuais. A grande saída foi a regularização de quase 3 milhões de micro e pequenas empresas no Brasil. Precisamos vencer o discurso conservador que diz que essas políticas são populistas”, disse.

Para o ex-Presidente, o investimento nos pobres deve ocorrer em vários aspectos, como aconteceu no Brasil através de uma combinação de programas como o famoso esquema de transferência de renda Bolsa Família e o Fome Zero, além de ter uma política de valorização do salário mínimo, de ajuda à agricultura familiar, ao pequeno empreendedor individual e às pequenas empresas por meio de linhas de crédito com juros mais baratos.

Lula ressaltou a necessidade de o México olhar mais para a América do Sul e se aproximar mais do Brasil e do Mercosul, o bloco comercial integrado pelo gigante sul-americano junto com Argentina, Paraguai, Uruguai e Venezuela.

“Não é fácil, talvez os empresários mexicanos tenham desconfiança dos brasileiros e vice-versa. Mas a verdade é que México e Brasil têm que se aproximar muito mais.

“São as duas maiores populações e economias da América Latina, são países que têm um potencial de produção e intercâmbio muito grande”, afirmou.

“Espero que o Presidente Enrique Peña Nieto e a Presidenta Dilma Rousseff tenham a capacidade de fazer aquilo que eu e os ex-presidentes mexicanos não tivemos condições de fazer”, desejou.

Muitos dos programas sociais de transferência de renda e combate à fome que o senhor lançou no Brasil já haviam sido testados antes no México sem os mesmos resultados positivos. Por quê?

O que funcionou no Brasil não foi apenas um programa, mas sim um conjunto de programas na área social, coordenados por um único ministério, com um cadastro de beneficiários muito fiel à realidade para podermos garantir que o dinheiro chegasse a quem estava destinado.

No Brasil tínhamos uma política social, mas como não existia um cadastro daqueles que estavam necessitados, muitas vezes o dinheiro não chegava nas mãos dessas pessoas; tinha muito intermediário.

Hoje, a pessoa cadastrada possui um cartão magnético e recebe os recursos sem dever favores ao governo. E 99% dos cartões são entregues a mulheres, porque elas oferecem uma garantia de que vão transformar esse dinheiro em alimento para a família.

Para que estes programas tenham sucesso, é necessário um ritmo de crescimento mínimo da economia?

Obviamente, quanto mais uma economia cresce, e se você tem um compromisso social de distribuir a renda gerada por esse crescimento, melhor. Mas no Brasil, quando começamos com o Fome Zero, a economia não estava crescendo. O que nós fizemos foi dividir o nosso orçamento, um pouco de todo mundo, para que os pobres tivessem participação nos recursos do governo.

Há países nos que a economia cresce por anos a fio, por exemplo, o Brasil chegou a crescer 10% ao ano na década de 70, mas não houve redução da pobreza. O fundamental é, na hora de elaborar o orçamento nacional, destinar uma parte para distribuir entre os mais pobres.

Toda a sociedade organizada tem um participação direta ou indireta no orçamento, mas os pobres não. Nós começamos a incluir os pobres no orçamento e, à medida que a economia, o PIB, foi crescendo, foi possível aumentar assa porção para políticas sociais.

É importante lembrar que no Brasil gastamos apenas 0,5% do PIB para atender 54 milhões de pessoas. O fundamental é começar. A gente se perguntava se o PIB tinha que crescer para ser distribuído ou se deveria ser distribuído antes de crescer. Nós fizemos as duas coisas concomitantemente. Começamos a distribuir e a economia começou a crescer, e tudo foi mais fácil.

No México, empresas transnacionais estão se incorporando à Cruzada Nacional contra a Fome. Na experiência brasileira, esse tipo de iniciativa beneficiou o programa?

No Brasil, também participaram muitas empresas. Mas essa participação é mais paliativa. É o Estado quem deve colocar no seu orçamento uma porção por ano para resolver o problema da miséria.

‘Democracia é alternância’

O ex-Presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva criticou duramente aqueles governantes que acreditam ser imprescindíveis e buscam se eternizar no poder.

Artífice da guinada para a esquerda dos governos latino-americanos, Lula definiu a democracia como uma alternância de poder. Não apenas de pessoas, mas também de classes sociais.

“Acredito que a democracia é sobretudo uma alternância de poder. Não apenas uma alternância de pessoas, mas também de classes sociais no governo”, afirmou em entrevista exclusiva com REFORMA.

“No Brasil, muita gente acreditava que não era possível um metalúrgico chegar na Presidência; e durante muito tempo eu também não acreditei que seria possível chegar pela via do voto, mas eu consegui (…)

“Eu era contra continuar porque, se eu quisesse um terceiro mandato para mim, meu adversário também ia querer. E quem quer um terceiro pode querer um quarto, um quinto…

“Toda pessoa que acredita ser imprescindível, insubstituível, quando começa a pensar assimcomeça a se tornar um pequeno ditador (…) Eu sou contra as pessoas se perpetuarem.

“A alternância de poder é muito importante para consolidar a democracia e o que vai garantir mais a democracia não é a continuidade de um governo, é o fortalecimento das instituições democráticas”.

Enquanto na Venezuela a tensão aumenta pela estreita diferença eleitoral com a qual o Presidente empossado, Nicolás Maduro, venceu o opositor Henrique Capriles, o ex-Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, reiterou ontem seu respaldo ao triunfo de Maduro, e considerou que este pode dar continuidade ao processo iniciado pelo falecido Hugo Chávez.

“Há pessoas que têm diferenças com a forma em que o Chávez governava a Venezuela, mas é importante levar em consideração que a vida dos pobres melhorou.

“Maduro tem condições de dar continuidade, de dialogar com a sociedade, de acabar com a divisão colocada na sociedade entre pobres e ricos, pobres e classe média. Quando se é governo, é preciso governar para todos. É possível ter um olhar para os setores mais oprimidos, que não tiveram educação, estão fragilizados e passando fome, mas se deve governar para todos. Acredito que Maduro deve fazer isso”, assinalou.

Antes de aterrissar na Cidade do México, Lula aceitou responder um questionário para REFORMA no qual não quis se pronunciar sobre as acusações que lhe são imputadas em torno do caso do “mensalão”. O ex-Presidente brasileiro se desculpou e esclareceu que não vai se pronunciar sobre o tema antes de terminada a investigação que a Polícia Federal iniciou na semana passada para indagar acerca de seu papel no caso.

O chamado “mensalão” é o escândalo de corrupção e compra de votos no Congresso brasileiro que sacudiu o seu governo em 2005 e pelo qual, no ano passado, a ex-cúpula do Partido dos Trabalhadores (PT) foi condenada em um processo histórico.

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Lourdes Nassif

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