Política e justiça são coisas diferentes, por Luiz Carlos Bresser-Pereira

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Política e justiça são coisas diferentes

por Luiz Carlos Bresser-Pereira

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A decisão de ontem do STF inviabiliza definitivamente a candidatura de Lula. O grande líder político foi vítima de uma injustiça dupla. Primeiro, por ter sido condenado sem qualquer prova digna desse nome. Segundo, porque seu habeas corpus não foi aceito não obstante a prisão depois de condenação em segunda instância ser inconstitucional. Nesse sentido, o voto da ministra Rosa Weber foi patético. Reconheceu a inconstitucionalidade, mas decidiu ficar com “a jurisprudência do tribunal”.

Cabe, agora, discutir o que os cidadãos democráticos e de centro-esquerda devem fazer. E o que o PT, que se propõe ser um partido democrático e de centro-esquerda, deve fazer, considerando-se que temos eleições presidenciais muito brevemente.

Eu não tenho dúvida a respeito. Desde o fracasso do governo Dilma Rousseff e de sua proposta desenvolvimentista e social, o neoliberalismo se tornou ideologicamente hegemônico no Brasil, e tem um programa de liberalização total da economia brasileira que apenas agravará a quase-estagnação reinante desde 1990 – ou seja, desde que um regime de política econômica liberal se tornou dominante no Brasil em substituição ao regime desenvolvimentista que caracterizou a economia brasileira desde 1930. Enquanto o neoliberalismo é abandonado no resto do mundo, porque é uma forma de organização econômica e política incompatível com o desenvolvimento e a construção de uma sociedade solidária, ele é aqui defendido por uma coalizão de classes de capitalistas rentistas e financistas que nada têm a oferecer ao Brasil.

As eleições de outubro próximo são uma oportunidade de dar um basta ao radicalismo neoliberal que beneficia apenas a uma elite muito reduzida. Lula teria todas as condições de ganhar essas eleições e dar esse basta, mas sua candidatura foi inviabilizada. Está na hora, portanto, de a esquerda se voltar para um outro candidato viável. 

Felizmente esse candidato existe. É Ciro Gomes. Ciro é um homem extremamente bem preparado para realizar uma grande presidência. É um candidato republicano, comprometido com o interesse público; é um candidato de centro-esquerda, comprometido com os trabalhadores e os pobres; é um candidato antipopulista, comprometido com o equilíbrio não apenas fiscal, mas também cambial; é um candidato com grande experiência política, que conhece muito bem o Brasil; é um candidato que se preparou a vida inteira para ser presidente, e já tem um programa básico de governo.

Se o PT acha que tem em suas fileiras um candidato com a mesma dimensão política de Ciro Gomes, que o lance imediatamente. Se não, que pense seriamente em adotá-lo como candidato, indicando o nome do vice-presidente que, em princípio, deve ser Fernando Haddad. 

Eu sei que o PT nunca deixou de ter seu próprio candidato. Mas a responsabilidade do PT é essencialmente para com o país, não para consigo mesmo. Está na hora de o PT ser ao mesmo tempo generoso e realista e começar a discutir seu candidato. O que definitivamente não faz sentido é continuar a insistir na candidatura de Lula. Política e justiça são coisas diferentes, mas a boa política é sempre a política do acordo e do interesse público. Lula, com quem me solidarizo diante da injustiça, sabe muito bem disto.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. Ilustre ex-ministro do FHC

    Parece-me que o ilustre ex-ministro (que, diga-se de passagem, não parecia muito incomodado com o neoliberalismo naquela época) esquece (ou faz-de-conta que esquece?) o fato do país estar sob ataque, resultado de uma guerra híbrida a nível mundial. Estamos vivendo um momento crítico, no qual a ordem mundial, liderada há séculos pelo ocidente, claudica. A busca por sobrevida faz com que a potência líder esteja empenhada em manter sob controle a região que considera seu domínio natural. Nesse contexto, a resistência pela via eleitoral é uma quimera. 

    1. Pois é…

      Surpreende e até desanima perceber que pessoas com tal histórico e dimensão apegam-se à possibilidade de mudança de rumo pela via eleitoral. Num golpe dessa magnitude, é muita ingenuidade acreditar que assumindo o poder por tal caminho, os invasores vão restabelecer a ordem democrática, correndo o risco de ver tudo que “conquistaram” escorrer pelo ralo numa eleição limpa. Os planejadores do ataque ao Brasil ignorariam esse “detalhe”? 

  2. Cadê o Ciro?

    A propósito, Ciro disse que, se fosse decretada a prisão de Lula, ia sequestrá-lo e jogá-lo dentro da embaixada da Venezuela… Cadê?

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