Políticas antagônicas prejudicam inovação no país

Lilian Milena, no Brasilianas.org
Da Agência Dinheiro Vivo

Os fatores que envolvem a dinâmica de estudos para melhorar produtos e serviços são contraditórios no Brasil. O governo oferece uma série de mecanismos para fomentar a pesquisa aplicada (cerca de R$ 500 milhões no total, hoje), mas, em contrapartida, promove um quadro macroeconômico, tributário e educacional que amedrontam os investimentos privados em inovação. A opinião é do diretor científico da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), Carlos Henrique de Brito Cruz, convidado para falar no 12º Fórum de Debates Brasilianas.org, realizado nesta terça-feira, 30, em São Paulo.

“A partir do momento que a economia nacional ficou estável, em meados dos anos 1990, o mundo passou a prestar mais atenção no Brasil” conta. Entre os atrativos do país, estão mercado consumidor consolidado e conhecimento desenvolvido em setores importantes, como o petroquímico, de biocombustíveis (etanol) e aeronáutico.

Entretanto, “o conjunto acaba não funcionando direito”, continua Brito Cruz, porque os fatores negativos (juros, carga tributária, encargos trabalhistas e câmbio, principalmente) “contaminam tudo”. Outro ponto problemático apontado pelo diretor da Fapesp é a falta de mão de obra qualificada, mais especificamente, de engenheiros no país.

Segundo pesquisa divulgada este ano pela Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), a infra-estrutura de transporte precária, os encargos trabalhistas, altos impostos e câmbio valorizado fazem com que a produção no Brasil seja 40% mais cara que na Europa ou nos Estados Unidos.  

O vice-presidente de Sustentabilidade e Desenvolvimento da Embraer, Hermann Ponte e Silva, também convidado para palestrar no evento, destaca que a empresa de aviação superou, por conta própria, o problema de mão de obra.

“Há 11 anos criamos um programa de especialização de engenheiros, prevendo a falta deles no país”, conta. “O aluno passa por uma formação que dura 18 meses. Ao final dessa etapa vai para uma experiência de três anos, onde ajuda no desenvolvimento de pequenos projetos”, explica. A formação de cada engenheiro custa em média, à Embraer, R$ 60 mil.

Silva lembra que a empresa foi resultado de um projeto de governo. A Embraer nasceu 18 anos depois do nascimento do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), responsável pela formação de recursos humanos qualificados, dando impulso ao empreendimento. Em meados da década de 1990 a companhia foi privatizada. Hoje investe entre US$ 65 e US$ 70 milhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento pré-competitivo, ou seja, “que a empresa julga ser necessário, mas que não necessariamente resultará na produção de um serviço ou produto novo para o mercado”, completa o porta-voz da Embraer.

“No Brasil, o percentual que as empresas destinam à P&D [pesquisa e desenvolvimento] em relação ao PIB é de 0,4 a 0,5. Muito pouco, considerando que as empresas norte-americanas investem cerca de 2,8% do PIB e as coreanas 2,5%”, confirma Brito Cruz.

O modelo de financiamento à P&D também apresenta problemas no país.  O espaço onde, historicamente, mais ocorreram pesquisas aplicadas foi o acadêmico “No Brasil, a lista dos 20 maiores patenteadores são universidades ou institutos de pesquisa. A Fapesp é a oitava nessa lista. O brasileiro deveria chorar com essa informação, pois as empresas criariam muito mais empregos e impactariam muito mais no desenvolvimento do país, se a P&D fosse mais concentrada nelas”, afirma Britto Cruz, que continua explicando que em todos os países do mundo a intensidade da relação universidade-empresa se dá, principalmente, no campo da formação adequada de mão de obra.

“Apenas 5,5% dos investimentos em inovação produtiva nas universidades norte-americanas vêm de instituições privadas”, completa. Em 2001, a Embraer fechou um acordo com a Fapesp num projeto para aproximar pesquisadores acadêmicos da indústria. O convênio foi fruto do processo de negociação da empresa feito com o governo do Estado de São Paulo para montar uma nova unidade na cidade de Gavião Peixoto. O inicio foi difícil, explica Silva, porque existe um estranhamento natural entre empresa e academia quanto ao tempo de consolidação de projetos. “Obviamente isso não era irresponsabilidade da Fapesp e nos adequamos a uma nova forma de trabalhar, pensando mais no longo prazo”.

A Embraer implantou um grande programa de inovação que envolve todos os funcionários, não importando o cargo. “Chegamos a introduzir 100 ideias de uma só pessoa”. O porta-voz da empresa ressalta que são os investimentos em P&D que salvam a empresa. Em quatro anos fizeram mais de 4,5 mil projetos para melhorar a produção de aeronaves em vários eixos. Foram aplicadas propostas que mudaram completamente a linha de montagem e que fizeram rever a forma como o desenvolvimento integrado do produto era pensado.

Silva destaca que, antes, a inovação era um diferencial das empresas, hoje é a principal necessidade para se manterem no mercado, e que, graças aos esforços voltados a pesquisa, conseguiram aumentar a produtividade em 60%, reduzindo de 25 para sete dias o tempo de montagem de aviões comerciais, sem aumentar  o custo de produção ou as horas extras.

O grande papel do governo está em cooperar e incentivar a cadeia produtiva, dando condições para que a iniciativa privada possa investir com segurança em novos produtos e serviços. “Hoje, nós estamos numa situação peculiar. Cerca de 90% das nossas receitas vêm de exportações. Para ajudar o mundo está em crise desde o final dos anos 2008, e por outro lado o crescimento do país não nos beneficia, pelo contrário, houve aumento de salários, e o câmbio continua muito valorizado”, pontua. Nos últimos dez anos, a taxa/hora paga para engenheiros e produção triplicou no Brasil.

Luis Nassif

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