Valdir da Silva Bezerra
Valdir da Silva Bezerra - Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Estatal de São Petersburgo e membro do Grupo de Estudos sobre Ásia do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo e do Grupo de Estudos sobre os BRICS da USP.
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O próximo governo Lula e os BRICS, por Valdir da Silva Bezerra

Lula deverá dar ênfase ao imperativo de tornar os mecanismos formuladores da Ordem Mundial pós-guerra mais representativos

O próximo governo Lula e os BRICS

por Valdir da Silva Bezerra

A vitória de Lula (candidato pelo Partido dos Trabalhadores) à presidência brasileira nas últimas eleições abre uma perspectiva de revigoramento dos laços políticos do Brasil com os BRICS, um dos principais vetores de política externa de seus dois primeiros mandados, entre 2003 e 2010. Basta lembrarmos que: foi na gestão de Lula que Brasil, Índia e África do Sul (3 dos atuais 5 membros do BRICS) formaram o grupo IBAS, considerado uma ‘iniciativa inédita no fortalecimento da cooperação Sul-Sul’ e cuja articulação diplomática defendia a importância do ‘multilateralismo’ e da necessidade de reformulação das estruturas globais de governança, sobretudo no que concerne às instituições de Bretton Woods (Banco Muncial e FMI). Nesse sentido, o futuro governo Lula deverá dar ênfase ao imperativo de tornar os mecanismos formuladores da Ordem Mundial pós-guerra mais representativos, levando em conta o papel de economias emergentes e de nações usualmente ignoradas pelas potências Ocidentais, encabeçadas pelos Estados Unidos.

No mais, vale lembrar que Lula foi justamente o líder à frente do Brasil durante a própria criação do BRIC em 2009, e que desde então (juntamente de China, Rússia, Índia e África do Sul) passou a verberar o discurso em prol da ‘multipolaridade’ nas relações internacionais, sem qualquer forma de domínio por parte de uma superpotência isolada, e em prol de uma política global definida por diferentes centros de influência econômica, política e civilizacional. Com efeito, desde a sua criação “o BRICS [tem] se apresentado como um vetor de mudança da governança global, atuando por meio do balanceamento das potências hegemônicas” (ALBINO et al, 2021, p. 2; tradução nossa) ocidentais e o Brasil é uma peça fundamental nesse jogo, por se tratar do país mais significativo (em termos territoriais e economicos) da América Latina. O Brasil, por sua vez, poderá novamente retomar seu tradicional papel de ‘Potência Regional responsável’ (PECEQUILO, 2008) com os BRICS tornando-se instrumental para a política externa de Lula no sentido de facilitar os seguintes objetivos:

• defesa do multilateralismo e da pluralidade nos assuntos mundiais;

• reforma das instituições monetárias e financeiras internacionais;

• contraposição ao hegemonismo ocidental, através da concertação com outras importantes potências do grupo.

Em termos de relações bilateriais com membros isolados do grupo, durante o anterior governo Lula o Brasil tornou-se um dos principais fornecedores de commodities para a China, fator fundamental para o crescimento econômico chinês durante os anos 2000. Na época de seus dois primeiros mandatos, a diversificação das parcerias políticas e comerciais do Brasil tornou-se uma prioridade para a diplomacia brasileira, o que leva a crer que Lula dará continuidade às sólidas relações bilaterais com a China, assim como com demais países e regiões que ficaram de fora da agenda política do governo Bolsonaro, por conta de suas predileções ideológicas particulares. No mais, em se tratando de Rússia, Lula não deverá alienar Moscou (ainda que sofra pressão americana e ocidental nesse sentido) tampouco tecer críticas duras às políticas de Vladimir Putin no tocante à Ucrânia, tendo em conta suas boas relações pessoais com o presidente russo assim como a necessidade de manter portas abertas para uma maior cooperação com a Rússia seja em termos de comércio bilateral ou mesmo dentro dos BRICS. Em suma, espera-se que o BRICS volte a representar um importante vetor para a Política Externa brasileira durante o governo Lula, auxiliando o Brasil em sua defesa do multilateralismo, da cooperação no ambito do Sul Global (envolvendo sobretudo Índia e África do Sul), bem como no estreitamento de suas relações políticas e econômicas com a Superpotência chinesa e com a Grande Potência russa.    

REFERENCIAS

Albino, V; Onuki, J; Fernandes, I (2021). The BRICS and Brazilian public opinion: soft balancing or economic strategy? Revista Brasileira de Política Internacional, 64(2): e012, pp. 1-22

Pecequilo, C (2008). As relações bilaterais Brasil-Estados Unidos (1989-2008) As três fases contemporâneas. https://nuso.org/articulo/as-relacoes-bilaterais-brasil-estados-unidos-1989-2008-as-tres-fases-contemporaneas/


Valdir da Silva Bezerra – Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Estatal de São Petersburgo e membro do Grupo de Estudos sobre Ásia do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo e do Grupo de Estudos sobre os BRICS da USP.

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Valdir da Silva Bezerra

Valdir da Silva Bezerra - Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Estatal de São Petersburgo e membro do Grupo de Estudos sobre Ásia do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo e do Grupo de Estudos sobre os BRICS da USP.

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