Bolsonaro veta proibição de despejos e impede síndico de fechar áreas de lazer

Projeto aprovado pelo Congresso impedia que perda de renda provocasse  despejos durante a pandemia, e dava poder a síndico de fechar áreas de lazer para reforçar o isolamento social. Bolsonaro vetou as medidas

 REPRODUÇÃO

Escrito por: Rosely Rocha

“O perfil deste governo é o de não pensar nos desfavorecidos. Infelizmente não se pode esperar que um governo de direita olhe para os mais pobres”, desabafa o músico e motorista de Uber, Pedro Pita.

 

“A arma que temos para diminuir as mortes é o isolamento social, mas este governo prefere tomar medidas de caráter individual contra a coletividade para atender parcela do seu eleitorado”, critica a médica infectologista Juliana Salles.

“Só me vêm um palavrão à mente para definir este governo”, alfineta o publicitário Waldir Guerrieri.

Pedro, Waldir e Juliana, três trabalhadores que não se conhecem e de profissões diferentes, vivem sob o medo das consequências na saúde e em suas finanças toda vez que Jair Bolsonaro (ex-PSL) toma uma atitude em detrimento da população, sejam os mais pobres ou a classe média.

A razão das críticas a Bolsonaro são os vetos a dois itens do total de oito que ele fez a um projeto de flexibilização de pontos do direito civil e do consumidor, durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19), preparado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli e aprovado em maio pelo Congresso Nacional. O texto do projeto volta para o Senado, que tem o poder de derrubar os vetos presidenciais, como esperam os brasileiros que podem ser beneficiados pelas medidas.

Um dos vetos é ao artigo que ajudaria quem está passando por dificuldade financeira, proibindo a concessão de liminar de desocupação de imóveis em ações de despejo, até 30 de outubro deste ano. A regra valeria para processos protocolados na Justiça a partir de 20 de março.

O outro veto retirou o poder dos síndicos de condomínios decidirem se abrem ou não as áreas sociais como salões de festa, piscina, academias, entre outras áreas de convivência, para aumentar o isolamento social, como recomenda a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Os dois vetos interferem negativamente no combate à pandemia. Primeiro porque as reduções de jornadas e salários e a suspensão de contratos de trabalho para, de acordo com o governo garantir a manutenção dos empregos,   atingiram 10 milhões de pessoas. Ainda, segundo o próprio governo, a pandemia contribuiu para aumentar ainda mais o desemprego, que atinge 12,8 milhões de pessoas, que podem não conseguir pagar suas contas. Segundo porque sem regras claras, tudo poderá funcionar nos condomínios, aumentando a possibilidade de aglomerações e mais contato entre as pessoas que deveriam ficar distantes para se proteger.

Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF/IBGE), divulgados em 2019, referentes a 2017-2018, mostram que a despesa média com habitação, que envolvem prestação da casa própria, impostos como IPTU, tarifas de água, luz e gás de cozinha, pesa bastante no orçamento no Brasil, chegando a  36,6% do rendimento das famílias. A conta pesa ainda mais para as famílias com renda menor de até R$ 1.908,00, com 39,2% de comprometimento do orçamento.

Já as despesas de aluguel representam em média no Brasil 15,1% no orçamento, e o comprometimento com a renda aumenta também para os baixos salários. As famílias com renda de até R$ 1.908,00, comprometem 20,6% do que ganham com o aluguel.

“A moradia é um direito previsto na Constituição e o governo federal deveria preservar por medidas que garantam o direito a um teto para as famílias. Vetar este artigo só reforça que Bolsonaro não tem preocupação social com a proteção da população mais fragilizada”, afirma Adriana Marcolino, técnica do Dieese/Subseção CUT.

A pesquisadora do Dieese ressalta ainda que o governo Bolsonaro logo, que começaram os primeiros sinais do aprofundamento da crise econômica, não titubeou em editar medidas que favoreciam o sistema financeiro e também tomou medidas de proteção, principalmente, para as grandes empresas como a suspensão do contrato de trabalho e diminuição de pagamento de tributos.

“Agora uma medida que protege a população que não tem casa própria, que vive de aluguel, ele não tem uma sensibilidade social para pensar em medidas que protejam essas famílias”, critica Adriana.

E é de proteção social que precisa o músico Pedro Pita. Ele faz parte do contingente de 60 milhões de brasileiros que estão sobrevivendo do auxílio emergencial de R$ 600,00, que não cobre nem as despesas básicas.

Morador de São Bernardo do Campo, na grande São Paulo, casado, dois filhos, um menino de 12 anos, que necessita de cuidados especiais, e uma menina de cinco anos, Pedro, além de músico fazia bicos como motorista de Uber, duas profissões profundamente afetadas pela pandemia, e só restou a ele ficar em casa e renegociar o valor do aluguel de R$ 1.200,00 pela metade. Mas, a esposa também perdeu o emprego, e nem com a redução do valor Pedro conseguiu pagar o aluguel que está atrasado há três meses. Por isso, o veto de Bolsonaro à proibição de despejos o afeta profundamente.

“Eu não quero negar o pagamento. Inclusive, avisei a dona do imóvel que minha mulher começou a trabalhar numa startup de aplicativos este mês, mas ainda não recebeu o primeiro salário de cerca de R$ 2.000,00”, diz o músico.

Embora aliviado com o novo emprego da esposa, Pedro entende que se a lei fosse aprovada sua família poderia se reerguer com mais tranquilidade, pagando as demais contas atrasadas com a segurança de que não iria ser despejada.

“Para a rua eu não iria porque tenho meus pais, mas imagine a situação, ter de morar com meu pai de 69 anos, que é grupo de risco, numa época de pandemia”, desabafa.

Situação diferente, mas também preocupante passa o publicitário Waldir Guerrieri, de 58 anos. Solteiro e sem filhos, ele paga o aluguel de R$ 1.000,00, num pequeno apartamento na região central de São Paulo, com o valor do auxílio-doença de pouco mais de R$ 2.200,00, que recebia por ter de fazer hemodiálise três vezes por semana.

Grupo de altíssimo risco, Waldir, em decorrência da doença, perdeu o prazo para revalidar o benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), exatamente no período da pandemia quando as agências do órgão fecharam. Mesmo fazendo todo procedimento online, como recomenda o ministério da Previdência, ele está há três meses sem receber nenhum centavo.

“Quem está pagando meu aluguel é minha irmã porque nem posso ir para a casa da minha mãe de 83 anos, pois ela também tem uma doença que deixa a sua imunidade muito baixa. Sou obrigado a pegar transporte público para ir ao hospital três vezes na semana, não posso correr o risco de contágio, muito menos minha mãe. Se não posso nem visitá-la, imagine morar com ela”, afirma o publicitário.

Pela profissão que exerce a médica Juliana Salles também faz parte de um grupo de altíssimo risco. Defensora incondicional do isolamento social para diminuir as mortes e ocupação de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), a infectologista faz uma crítica veemente ao veto de Bolsonaro ao poder do síndico decidir pela liberação das áreas sociais e de lazer nos condomínios.

“Bolsonaro deveria atuar para a indústria brasileira produzir material para os hospitais, ou ainda se preocupar com uma política assistencial para os moradores de favelas, comunidades, os trabalhadores informais que estão sem condições de praticar o isolamento. Mas, ele prefere se meter em condomínio de classe média, que tem condição de moradia para fazer o isolamento, só para agradar parte de seus eleitores”, diz Salles.

“Bolsonaro decide o isolamento social como uma questão individual e não da coletividade. Em vez de atuar para diminuir as mortes, ele conduz o país para o genocídio”, conclui a médica infectologista.

 

Redação

4 Comentários

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  1. Governo das redes sociais

    Quem acompanha o lado de lá sabe que essa foi uma demanda das redes sociais. Síndicos fechando áreas de lazer eram denunciados, aos brados, por comunismo, venezuelização, cubanização, etc, coisa de notórios comunistas, como Dória, Witzel, Helder Barbalho e quejandos. Demanda entregue.

  2. Este tipo de notícia deveria ter junto com a manchete a foto do moro, do dallagnol e carlos fenrando dos santos lima como endereçados. Afinal, esta a prova concreta de que este país se tornou a realização dos sonhos deste três cavaleiros do apocalipse

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