Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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A nova sensibilidade gnóstica do horror no filme “Ghost Stories”, por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreira

Desde a Era Vitoriana, quando os fenômenos paranormais (mesas girantes, fantasmas, fotografias de ectoplasmas etc.) entraram em cena na cultura Ocidental, as explicações sobre esses eventos sempre estiveram sintonizadas com o “zeitgeist” de cada época. Na virada de século, as tentativas de explicações científicas deram lugar à mistura de fé com espiritualidade. Nesse cenário, a sensibilidade gnóstica começa a se esgueirar pelos filmes de terror, um gênero que sempre foi canônico. Apesar de parecer uma homenagem às velhas antologias cinematográficas de terror, “Ghost Stories” (2017) vai mais além: é um exemplo que segue a linha das violentas viradas narrativas como “Sexto Sentido” e “Os Outros” – a abordagem PsicoGnóstica da paranormalidade, na qual a mente pode ser a nossa principal prisão. Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

O mundo do paranormal, envolvendo tanto os praticantes quanto seus críticos, sempre esteve conectado com o espírito (desculpe o trocadilho!) da época. Na Era Vitoriana, tudo era sobre experiências de mesas girantes, fantasmas, fotografias de ectoplasmas e sessões mediúnicas. 

Nos anos 1960-70, as histórias de assombrações em casas amaldiçoadas se tornaram notícia mainstream – poltergeists, possessões, aparições. Representado por filmes que se tornaram clássicos do gênero como O Exorcista, Poltergeist, A Casa da Noite Eterna etc. Era como se os fenômenos paranormais tivessem saído de lugares controlados (sessões espíritas, laboratórios etc.) e invadido os nossos lares céticos e cristãos.

Hoje o jogo do paranormal parece dividido entre os céticos que passaram a ser rotulados como possuidores de mentes fechadas à espiritualidade, e os espiritualistas e espíritas que encaram o fenômeno como manifestação da fé – espiritualidade e religiosidade se confundem, substituindo o viés empírico-científico que no passado tentava-se abordar o fenômeno paranormal.

Por essa razão, a sensibilidade gnóstica começa também a se esgueirar no gênero do horror paranormal ou no próprio terror. Excetuando-se filmes como das franquias Atividade Paranormal, REC (mockumentary de terror), refilmagens como It, O Grito ou o terror com crítica social (Corra, Despertar dos Mortos), roteiros com violentas torsões narrativas mostrando que a realidade percebida (tanto pelo protagonista como pelo espectador) não é aquela que imaginávamos, começam a se multiplicar no gênero.

Desde O Sexto Sentido (a melhor e mais bem construída virada narrativa até aqui no cinema), passando pelo Os Outros (2001), AfterDeath (2015) ou até mesmo o terror metalinguístico de O Segredo da Cabana (2011) ou Resolution (2012), a sensibilidade gnóstica de desconfiança ontológica (de que a realidade sempre foi artificial, fabricada como fosse algum tipo de jogo) vem invadindo os mundos do além.

 

 

Ghost Stories (2017) é mais uma produção que reforça essa desconfiança gnóstica dentro do gênero. Aqui, a narrativa tende para uma abordagem PsicoGnóstica do paranormal: o que vemos é o que a nossa mente quer ver, nos tornando prisioneiros de uma realidade interna que vai muito mais além do que mera uma ilusão derivada da loucura.

Homenagem às antologias de horror?

Adaptação de uma peça teatral homônima, do circuito teatral de Londres que se tornou um grande sucesso, Ghost Stories a princípio parece ser uma homenagem às velhas antologias de horror como Creepshow: Show de Horrores (George Romero, 1982) ou Na Solidão da Noite (1945) – a narrativa se estrutura em três estórias aparentemente independentes.

Mas gradualmente, vamos desconfiando de que há algo mais – o velho olhar gnóstico de que toda estrutura é construída sobre uma ilusão. A princípio Ghost Stories joga com a abordagem atual sobre o paranormal: a oposição entre a fé e o ceticismo que há muito deixou de ser científica – tornou-se apenas negação. Mas, como sempre dentro dessa proposta gnóstica os três episodio irão convergir para uma violenta torsão mostrando que nada é aquilo que aparenta ser.

O Filme

Ghost Stories nos conta a estória do Professor Philip Goodman (Andy Nyman), uma subcelebridade, conferencista e desmistificador de fenômenos paranormais. Ele apresenta um programa de TV (o “Psychic Cheats”) no qual desmascara médiuns e toda sorte de fenômenos espirituais como truques de charlatões em busca de dinheiro fácil.

 

 

Quando criança, nos anos 1970, era fã de Charles Cameron (Leonard Byrne), celebridade televisiva famosa em desmascarar médiuns famosos e casas falsamente assombradas. Mas, no auge da fama, Cameron misteriosamente desapareceu.

O filme começa com Goodman interceptando uma transmissão de rádio em show de um médium-vidente notando que uma mulher na plateia está conversando com o charlatão no palco através de um ponto eletrônico, que diz ver naquele momento o espírito de uma criança falecida.

Goodman é arrogante sobre o pedestal do ceticismo radical. É claro que nesse momento pensamos: essa cara merece uma lição!

Durante a filmagem de um episódio do seu programa de TV, Goodman fica espantado com um convite: o supostamente falecido Charles Cameron quer contata-lo. Goodman vai ao endereço (um velho trailer estacionado em um camping) para descobrir que Cameron aparentemente forjou sua própria morte e foi levado ao isolamento devido a três casos que não conseguiu solucionar. Casos que desafiaram o seu ceticismo, levando à crise e o abandono da TV.

Com uma doença terminal, Cameron quer passar esses três casos para Goodman. Mas não com o objetivo de que devem ser “solucionados” – mas para que finalmente Goodman deixe sua arrogância e abra a sua mente para a existência de genuínos fenômenos paranormais.

No primeiro caso ele se encontra com o vigia noturno Tony Mathews (Paul Whitehouse), uma história de fantasma aterrorizante com todos aspectos do horror moderno – passa-se em um edifício abandonado anteriormente ocupado por um manicômio de mulheres. Tem de tudo: manequins, aparições, uma menina assustadora com vestido amarelo.

O segundo caso acompanha Simon (Alex Lawther, da série Black Mirror), um estudante paranoico após um incidente enquanto dirigia o carro à noite por uma floresta, perseguido por uma estranha criatura com aparência demoníaca. Assustado, procurou respostas na Internet. Ele cobriu as paredes de seu quarto com imagens de sátiros, bestas e criaturas fantásticas.

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Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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