O terrorismo do mercado funcionou, por Luís Nassif

Os terroristas foram bem sucedidos com o arcabouço fiscal e a meta de déficit zero para 2024, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Marcelo Camargo – Agência Brasil

A arma do mercado é o terrorismo. Por isso mesmo, no início do ano, todas as previsões catastróficas sobre a economia não foram erros de cálculo, como se imagina, mas ameaças calculadas para não fugir dos cânones do mercado. Ou seja, os terroristas foram bem sucedidos com o arcabouço fiscal e a meta de déficit zero para 2024, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Não se tire o mérito do Ministro da Fazenda Fernando Haddad. Aproveitou o empurrão do mercado para avançar na aprovação de uma reforma tributária histórica e na tributação de setores até agora inexpugnáveis pelo fisco.

Mas não conseguiu desmontar a cidadela que o mercado levantou no Banco Central. A manutenção da queda de 0,5 ponto da Selic mostrou que a militância política de Roberto Campos Neto prosseguirá até o término do seu mandato. Qualquer dirigente técnico já veria elementos mais que suficientes para acelerar a queda da Selic: preços caindo, juros internacionais estabilizando, melhoria na avaliação das agências de rating, sinais positivos dos grandes investidores internacionais. Enfim, o quadro ideal de estímulo ao investimento financeiro – ainda que à custa do desestímulo ao investimento real, como demonstrou a última projeção do PIB do Banco Central. Mas, como bom bolsonarista, Campos Neto criou sua realidade paralela, alimentando o sonho de se tornar o Ministro da Fazenda do candidato que vier a substituir seu herói, Jair Bolsonaro.

Sempre é bom recordar que o período de maior crescimento das últimas décadas – 2004-2008 – foi alimentado pelo crédito abundante.

Lula termina o ano com nível de aprovação superior ao de desaprovação, e não é pouco para quem assumiu com mercado, Congresso e militares jogando contra. Mas o grande desafio será no primeiro semestre de 2024, quando se verão, na prática, os efeitos de uma Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) sem déficit fiscal. Segundo todas as avaliações independentes, apenas um crescimento imprevisto da economia impediria cortes expressivos no orçamento.

De qualquer modo, Lula terá condições de conduzir uma política macro, sem depender tanto do Congresso. Esta semana reuniu o Ministério para uma avaliação de desempenho. Os dois critérios adotados – exposição pública e comparação entre viagens internas e externas – não significam nada. Mas a reunião mostra a intenção de começar a chacoalhar o governo.

As últimas campanhas da Secom mostraram o mote básico do modelo Lula: o de agregar o maior número de pessoas. O caminho mais universal será o de juntar o Brasil produtivo, empresas, trabalhadores, cooperativas, agricultura familiar em torno do mote produção.

Haverá uma curiosa adesão da mídia. Ontem, o Estadão – conhecido pelo exercício permanente de só enxergar erros no governo – abriu a primeira página com uma visão extraordinariamente otimista sobre 2024. A razão – explícita no contexto da manchete – é a de preparar o ambiente para captar a publicidade dos lançamentos imobiliários. Como se sabe, é o setor mais sensível ao estado de espírito do consumidor.

Leia também:

Luis Nassif

4 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Imagino que uma autoridade estratégica que é independente ao governo, tem tudo para no ano final de seu mandato assoprar um pouco mais em 2024, para o lado do governo, do que assoprou em 2023.
    Pode querer fazer uso da mediação amiga da onça, que até ouso julgar que irá enterrar sua imagem em profundidade muito mais extensa, do que possa imaginar.
    Talvez já sabendo que após a sua saída e com um novo presidente imparcial, patriota, sem partido e estritamente leal e profissional, certamente os governos que viverem situação parecida terão uma das mais importantes peças a seu favor.
    Na verdade uma peça tão estratégica, que permitirá o impulso seguro, controlado e eficiente da economia, do desenvolvimento, das oportunidades e da captação de mais receitas ordinárias e extraordinárias.
    Será, ao mesmo tempo, um soco na boca do estômago de todas as supostas autoridades que tentem configurar em seu currículo e na sua história, a grave e mentirosa infração de que seja permitido, no uso de um cargo de confiança, o poder de substituir o profissionalismo e a lealdade pela possibilidade do uso pessoal da submissão a um partidarismo inadmissível.
    Então, após tantas demonstrações de fraqueza e incompatibilidade com o cargo, pergunto: quem, em 2025, terá a confiança necessária para entregar uma cargo de similar envergadura, a um profissional que se mostra inconsistente com a razão, com o equilíbrio e com o fato de não ser leal a seu próprio currículo?

  2. Cenários mudam, mas existe um fator principal que pouco se altera no Brasil : a relação entre os juros praticados no País e o quadro dos investimentos. O País não enfrenta isso. O Banco Central e o COPOM são parcialmente responsáveis, uma vez que dirigem a política monetária, mas é necessário o empenho de partes maiores entre os que possam se interessar pelo desenvolvimento do Brasil para libertar o País desse engessamento. Mesmo no citado período (2004- 2008) onde existiu mais crescimento, todos conviveram com taxas de juros elevadas. O que foi diferente, talvez tenha sido o contexto. Agora com efeitos reduzidos em relação ao crédito, que naquele período foi forte, hoje pessoas jurídicas e pessoas físicas encontram-se mais endividadas, o que afeta as soluções em face da ociosidade dos setores que pode ser usada. O terrorismo empregado na batalha de expectativas pelo mercado, que ganha majoritariamente com o capital de terceiros e portanto se torna menos afeito aos riscos, quer defender a aplicação de políticas fiscais e o déficit zero, e até de privatizações porque elimina qualquer risco maior. Outros investimentos tem fases de riscos inerentes a cada um. O que é preciso será o País definir o que deseja como conjunto social e econômico.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador