O Brasil teve alguns períodos de câmbio controlado.
O primeiro foi entre 1931-1953, depois que Getúlio Vargas foi obrigado a suspender o livre fluxo de capitais devido a uma crise cambial.
Em 1953, a Instrução 70, da Sumoc (Superintendência da Moeda e Crédito), instituiu um sistema de múltiplas taxas de câmbio. A taxa oficial era fixada pelo governo e era relativamente alta, para estimular as exportações.
O segundo, no período 1964-1990, no qual o câmbio foi regulado por mini desvalorizações.
Em todos esses períodos, em que pese a falta de dólares, as dificuldades com inflação, o país logrou crescimento robusto, imensamente superior ao da última década.
Com todas as crises do período, com a escassez de dólares que marcou a crise dos anos 30 e dos anos 50, a economia cresceu. E cresceu por uma razão básica: a previsibilidade do dólar estimulava empresas internas a planejarem exportações e as empresas de fora a investir no país.
A lógica é simples:
- A empresa externa quer investir no Brasil.
- Ela prepara estudos sobre o mercado, com projeções de crescimento.
- Mas a remessa de lucros depende da projeção do câmbio. Se ocorre uma desvalorização do câmbio, reduz a quantidade de dólares remetidos; e vice-versa.
Por isso mesmo, um câmbio controlado é fundamental para atrair investimentos produtivos internos. Nos anos 50, o avô de Roberto Campos Neto defendeu uma desvalorização cambial no curto governo de Café Filho e, depois, no governo JK. Dava como exemplo a Coreia, que ele previa se transformar em nação desenvolvida por ter desvalorizado a moeda e, depois, garantido a sua estabilidade.
O mesmo vale para as exportações. O fabricante brasileiro só ousará exportar se tiver garantia de que a relação dólar/real não se altera no período.
Por aqui, desde Armínio Fraga, adotou-se a tal política de metas inflacionárias que transformou o câmbio em variável de ajuste. Quer combater a inflação? Aumente as taxas de juros para atrair mais dólares e, com isso, derrubar os preços dos produtos exportados e importados. Quando isso ocorre, quebra a perna do capital produtivo que investiu no país e da empresa brasileira que ousou exportar. Mata-se o desenvolvimento.
Quem ganha com isso? Apenas o capital financeiro, que pode montar operações de arbitragem, ganhando com as oscilações não apenas do dólar, mas de ativos internos referenciados em dólar. Aliás, todas essas políticas de austeridade visam, em última instância, corrigir os desequilíbrios provocados pelo livre fluxo de capitais.
Tome-se a ata do Copom (Comitê de Política Monetária). Antes, o risco maior era do FED (o Banco Central norte-americano) aumentar a taxa de juros. Ontem, o FED decidiu mantê-la, mostrando sinais de que a economia americana caminha para um patamar de estabilidade. Se era o risco maior, reduzido o risco o óbvio seria o Copom acelerar a queda da Selic para 0,75 ponto. Mas levanta-se outro fantasma: incertezas sobre a inflação de serviços mundial. Não fosse isso, poderiam invocar a possibilidade de ampliação da guerra de Israel, a crise da economia alemã, as incertezas da economia chinesa, as dúvidas sobre o déficit público brasileiro. Qualquer argumento serve para manter os juros elevados e a economia travada.
Armou-se um enorme carnaval quando Lula falou da possibilidade de um déficit primário de 0,5 ponto do PIB. Isso equivale a menos de um ponto da taxa Selic. Ou seja, essa lógica maluca diz que, quando o governo permite déficit fiscal, tem que se aumentar a taxa Selic – e ampliar a dívida pública – como contrapartida.
Está é a loucura! Todos os fatores levantados têm como base de análise o impacto sobre o dólar no mundo e, por tabela, no Brasil, devido ao fato de ter um câmbio livre. E quando aumenta o fluxo de dólares, a imprensa comemora, como se o país estivesse sendo salvo, sendo que nenhum centavo irá para atividade produtiva, para levantar empresas, aumentar a produção, gerar emprego. Será utilizado exclusivamente para operações de arbitragem: comprar barato e vender caro.
Repito o que venho dizendo: manter a queda em 0,5 ponto não se trata apenas de um erro de análise, criticado pelos analistas mais profissionais do mercado. Trata-se de uma ação deliberada para amarrar o governo Lula.
No período 2004-2008, governo Lula, o PIB brasileiro cresceu em média 4,5% ao ano. Esse crescimento foi impulsionado pela expansão do consumo interno, estimulado por políticas sociais e pelo aumento do crédito.
A missão de Campos Neto será impedir a repetição desse período.
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Eu imagino que certas pessoas quando descobrem que nunca terão luz própria, se contentam em existir à sombra de outras. Não tem solução, quando alguém nasce para ser vassalo e escravo de uma elite rentista, impatriota e perdulária, continuará lambendo botas e sapatos daqueles que, em breve, o tornarão como um bagaço já sem sumo e sem mais qualquer serventia. Estará renegado a um destino final, cujo o fim da linha será o lixão da história.
Brasileiro lutando contra o Brasil
Ele é empregado de quem? Não é do governo, onde está de mero agente do capital privado…
Há mais de vinte anos, no governo FHC, Armínio Fraga lançou no Brasil um feitiço chamado “tripé macroeconômico”, um curioso tripé perneta em que um dos cantos é frouxo: o câmbio flutuante. Desde então, o país vem tentando se equilibrar nesse banquinho de circo, de equilíbrio fiscal e equilíbrio monetário, enquanto os capitais especulativos deitam e rolam na terceira ponta, a taxa de câmbio.
Tal política, aplicada sob inspiração externa e com viés austero, como explicita a ladainha do “dever de casa”, é não só um mecanismo de chute de escada em termos de desenvolvimento, mas também de indução de ciclos de alta de juros e valorização cambial, em uma trilhonária transferência de recursos públicos para mãos privadas.
Embora até pudesse ter algum sentido à época fernandista, em que o Brasil estava de pires na mão batendo à porta do FMI e grandes bancos, assim não deveria ser ao menos desde que, no governo Lula, o país tornou-se credor internacional. Entra aí a função da mídia de continuar a agitar o espantalho, de escandalizar o nada e lançar cortinas de fumaça, para que, continuando na metáfora circense, o grande elefante continue a acreditar que está preso pelo barbantinho…
Se o Brasil quer mesmo chegar a algum lugar, há de romper essas amarras ideológicas e oficializar a prática de uma meta cambial competitiva, implementando uma malha de controle sobre essa importante variável, que não pode ficar à mercê da famigerada “mão invisível”; ainda que esta possa eventualmente estabilizar a malha de controle (embora em regra entregue, ao contrário, fortes oscilações e instabilidade), dificilmente o fará com a variável no “set point” (meta) do interesse público.
Acreditar que um sistema complexo como o econômico se equilibra sozinho (e num ponto de interesse da coletividade!) é terraplanismo puro, que ignora tudo o que se estuda em física e engenharia sobre modelagem e controle de sistemas dinâmicos; mistificação que, como as demais, tem origem em ignorância ou má-fé, normalmente nesta explorando aquela. A “mão leve invisível” dos canalhas.