Os cuidados com a PPI dos presídios, por Luís Nassif

Deveriam entrar em contato com o ex-Secretário de Administração Penitenciária de SP, Nagashi Furukawa, autor de iniciativas de integração

O tema das PPIs dos presídios merece uma análise mais aprofundada do governo. O PPI prevê a utilização de parcerias público-privadas (PPPs) para a construção e operação de presídios. O objetivo é reduzir os custos do sistema prisional e melhorar a qualidade da gestão das unidades.

Os PPIs dos presídios são baseados no modelo de concessão administrativa, no qual o parceiro privado é responsável pela construção, operação e manutenção das unidades prisionais. O parceiro público, por sua vez, é o responsável pela fiscalização do contrato e pelo pagamento da contraprestação ao parceiro privado.

Uma análise da literatura existente sobre o tema mostra objetivos de eficiência, mas dificilmente alcançável.

As instalações prisionais privadas que implementaram programas de reabilitação inovadores centrados na formação profissional, na educação e no apoio à saúde mental, ajudaram na redução da criminalidade.

Em alguns casos, a adoção da privatização das prisões conduziu a um sistema prisional mais rentável e eficiente. Os operadores privados implementaram práticas baseadas em evidências e utilizaram tecnologia para agilizar as operações, resultando na redução dos custos operacionais sem comprometer a segurança. As economias de custos foram reinvestidas em programas de reabilitação, levando a melhores resultados para os presidiários.

Mas na maioria dos casos – especialmente na experiência brasileira – os resultados foram catastróficos, e resultaram em massacres em presídios do Amazonas e outros estados.

Os principais vícios do modelo foram praticados pelas empresas brasileiras que assumiram presídios:

1. Medidas de redução de custos, para maximizar os lucros, levando a níveis inadequados de pessoal, serviços de qualidade inferior e acesso reduzido a programas e recursos essenciais. 

2. Falta de transparência e responsabilização: Os contratos de prisões privadas incluem frequentemente cláusulas que limitam a transparência e a responsabilização. Isto pode tornar difícil para os organismos de supervisão externos, tais como agências governamentais ou organizações da sociedade civil, monitorizar as operações e garantir que as prisões privadas aderem a padrões adequados de cuidados e reabilitação.

3. Incentivos para altas taxas de ocupação: Muitos contratos de prisões privadas incluem garantias de taxa de ocupação ou “quotas de leitos”, que exigem que o governo mantenha um certo nível de população reclusa. Isto pode criar incentivos para o encarceramento de indivíduos, conduzindo potencialmente a taxas de criminalidade mais elevadas e a um aumento da reincidência à medida que mais pessoas são enviadas para a prisão.

4. Formação e rotatividade inadequadas do pessoal: As prisões privadas podem registrar taxas de rotatividade de pessoal mais elevadas em comparação com as instalações públicas. Isto pode resultar na falta de pessoal experiente e bem formado, o que pode ter um impacto negativo na qualidade dos programas de reabilitação e na segurança geral do ambiente prisional.

5. Potencial de corrupção e conflitos de interesses: A motivação do lucro inerente à privatização das prisões pode criar oportunidades para corrupção e conflitos de interesses. Por exemplo, houve casos em que operadores de prisões privadas se envolveram em práticas antiéticas, tais como fazer lobby por leis de sentenças mais rigorosas para aumentar a sua população reclusa e os lucros.

O caso do presídio de Manaus, administrado por uma empresa de Luiz Gastão Bittencourt, ligado ao grupo que controlava a Confederação Nacional do Comércio, é um exemplo acabado de um modelo sujeito a todo tipo de corrupção.

As recomendações internacionais são claras:

1. Enfatizar programas de reabilitação baseados em evidências: Independentemente da propriedade da prisão, é crucial priorizar programas de reabilitação baseados em evidências. Estes programas devem centrar-se na educação, na formação profissional, no apoio à saúde mental e no tratamento do abuso de substâncias. A implementação e avaliação destes programas pode ajudar a reduzir as taxas de reincidência e melhorar os resultados da reabilitação.

2. Reforçar a supervisão e a responsabilização: Para enfrentar potenciais armadilhas, é essencial estabelecer mecanismos de supervisão robustos e garantir a transparência e a responsabilização nos sistemas prisionais públicos e privados. Isto pode ser conseguido através de inspeções regulares, auditorias independentes e métricas de desempenho claras que medem a eficácia dos esforços de reabilitação.

3. Promover a colaboração entre os sectores público e privado: Incentivar a colaboração entre entidades públicas e privadas pode levar a abordagens inovadoras na gestão prisional. As parcerias público-privadas podem aproveitar a experiência e os recursos de ambos os sectores para melhorar os programas de reabilitação, a formação de pessoal e o desenvolvimento de infra-estruturas.

4. Priorizar a formação e retenção de pessoal: Investir em programas abrangentes de formação de pessoal e fornecer remuneração competitiva pode ajudar a atrair e reter pessoal qualificado nas prisões públicas e privadas. Pessoal bem treinado e motivado é essencial para criar um ambiente prisional seguro e reabilitador.

5. Evitar quotas de camas e concentrar-se em contratos baseados em resultados: Em vez de confiar em quotas de camas que incentivam elevadas taxas de ocupação, considere contratos baseados em resultados que priorizem a redução das taxas de reincidência e a melhoria dos resultados de reabilitação. Esta mudança de enfoque pode encorajar os operadores de prisões privadas a investir em programas de reabilitação e serviços de apoio eficazes.

6. Realizar avaliações e pesquisas regulares: Avaliar continuamente o impacto da privatização das prisões nas taxas de criminalidade, taxas de reincidência e resultados de reabilitação através de pesquisas rigorosas e análise de dados. Isto ajudará a identificar as melhores práticas, monitorizar o progresso e informar decisões políticas baseadas em evidências.

7. Considerar alternativas ao encarceramento: Explorar alternativas ao encarceramento, tais como programas de desvio, reabilitação baseada na comunidade e abordagens de justiça restaurativa. Estas alternativas podem ajudar a reduzir a dependência dos sistemas prisionais e concentrar-se na abordagem das causas subjacentes ao comportamento criminoso.

Aliás, seria interessante que o governo entrasse em contato com o ex-Secretário de Administração Penitenciária de São Paulo, Nagashi Furukawa, autor de iniciativas exemplares de integração com a sociedade, quando juiz em Bragança Paulista. E defenestrado da Secretaria por pressão de Saulo de Castro Abreu Filho que, quando Secretário de Segurança do governo de São Paulo, foi responsável por grandes massacres no estado.

Luis Nassif

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