20 de abril inspira medo de novos ataques em escolas; entenda o simbolismo da data

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
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Pesquisadora de grupos extremistas fala ao GGN sobre cenário de medo que assombra a comunidade escolar e o simbolismo da data

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20 abril: Um chamado à violência nas escolas ou apelo por atenção à educação?

Na madrugada de domingo, 9 de abril, as redes sociais foram tomadas por, pelo menos, duas imagens específicas: palavras pichadas diziam que haveria ataques às escolas, uma continuação da crueldade que fez mais de uma dezenas de vítimas no país desde o final do último mês. Entre tantas mensagens, a data de 20 de abril ganhou destaque, o que gerou ainda mais pânico na população. 

A ação logo foi rastreada por um grupo de monitoramento formado por pesquisadores, que observou o comportamento em massa ao longo de toda aquela semana, quando as ameaças cessaram em 13 de abril. A disseminação do conteúdo gerou estranheza nos próprios estudiosos, que focam no rastreio de uma subcomunidade com cerca de 500 adolescentes, de onde saíram a maioria dos autores de ataques nos últimos meses. 

Todas essas ameaças das escolas que ocorreram no Brasil inteiro começaram no dia 9 à noite e acabaram no dia 13 (…) Nós rastreamos uma primeira ameaça a duas escolas no bairro do Realengo, no Rio, essa mesma ameaça usou duas fotos bem específicas, fotos que saíram do Pinterest (…) Começamos a ver a repetição dessas duas mesmas imagens no Brasil inteiro. Então isso começou a ficar muito estranho”, explicou a jornalista Letícia Oliveira, editora do site El Coyote, que acompanha há pelo menos 11 anos ações online e na vida real de grupos extremistas brasileiros. 

Oliveira também é uma das autoras do relatório pioneiro sobre cenário: “O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental”. O documento elaborado por um Grupo de Trabalho de Transição foi entregue ao governo Lula, em dezembro passado, alertando o que estava por vir.

Agora, com a proximidade do dia 20 de abril, Oliveira explica ao GGN dois fenômenos estão ocorrendo de forma concomitantes sobre os casos de violência e o pânico generalizado que tomou a população nos últimos dias frente às barbáries.  

Por quê o dia 20?

Entre as dezenas de ameaças de massacres contra escolas espalhadas nas redes, esta quinta-feira (20) foi apontada como dia para uma suposta série de ataques em todo país. 

A data teria sido escolhida por marcar os 24 anos do massacre de Columbine, o primeiro grande ataque a uma escola americana que gerou repercussão internacional. “É uma data que a gente vê como uma data comemorativa para esses meninos [parte da subcomunidade que reverencia autores de massacres em escolas]”, diz Oliveira. 

Além disso, o ditador alemão Adolf Hitler faz aniversário em 20 de abril e há uma associação dos ataques de extermínio em massa com a ideologia nazista. Contudo, Oliveira pontua que os jovens autores de ataques – ou que pensam em fazê-lo – são, de fato, “fãs” de atiradores em massa e não, por exemplo, do Hitler. 

“Há essa subcomunidade de adolescentes que cultuam atiradores em massa e foi dessa subcomunidade que saíram diversos dos autores de atentados que começaram em agosto do ano passado até agora (…) São adolescentes que cultuam e tratam atirador de escola como como ‘ídolo pop’”, conta. 

Alguns desses adolescentes autores se referem sim [ao nazismo] (…) Há influência do supremacismo branco (…) Mas eles não têm contato com células nazistas. É algo tangencial. Apesar de ter uma influência da extrema-direita no geral”, continua Oliveira. 

Segundo a pesquisadora, muitos adolescentes não têm conhecimento de fato sobre as ideologias extremistas e passam a agir dentro de um “processo de imitação”. 

Eles imitam os ídolos. O maior ídolo deles é o T. [ autor de um dos maiores massacres em uma escola no Brasil]. T. era nazista (…) Agora, vemos mais a questão da estética, em um discurso pronto de nazismo e nada muito aprofundado”, ressalta. 

Chamado à ação

Segundo Oliveira, as diversas ameaças que circulam pelo país – apontada como um dos fenômenos – acabou incentivando um segundo cenário, ainda mais grave. 

Estamos tratando [esse segundo fenômeno] como um chamado à ação”. explica. Segundo ela, grupos se aproveitaram do dia 9 ao dia 13 para influenciar os jovens a cometer esses ataques. Mas, o caso vai além, e o grande volume de ameaças disseminadas na semana passada ainda seria uma ferramenta de desinformação para aumentar o pânico da população. 

Não sabemos quem organizou isso, mas foi coordenado, pelo volume de ameaças enviadas no Brasil todo. Não parece ter sido coisa de um grupo de adolescentes que, chutando alto, tem 500 membros. E, além do volume, tem o tipo das ameaças, o tipo de linguagem que não é linguagem de adolescentes, porque eles funcionam como um ‘fandom’ [fã clube], eles fazem ‘edit’ [vídeos curtos] até fanfic [narrativas de fãs]”, diz Oliveira. 

O volume de ataques, do dia 9 para cá, dá para associar a outros grupos (…) Eu não sei quem cometeu essas ameaças. Quem começou a espalhar. Mas, sim, isso foi muito benéfico para certos grupos, principalmente aqueles que querem a polícia dentro das escolas e que querem deixar todo mundo apavorado, porque o que se criou foi uma situação de pânico geral”, alerta Oliveira. 

Como combater aliciamento nas redes

Hoje as ameaças circulam livremente pelas redes sociais, o ambiente também pelo qual esses adolescentes encontram uma base de apoio extremista. Para combater esse aliciamento, Oliveira destaca a necessidade de responsabilização das plataformas e de um trabalho social, como foco na saúde psicológica.

“Temos que cobrar das plataformas para que elas moderem [ esses conteúdos] (…) Esses adolescentes vão chegando nisso porque tá tudo fácil de chegar”, diz.

Além disso, “precisa ser feito um trabalho pedagógico de acolhimento psicológico. É preciso educação crítica para entender que nem tudo que eles veem na internet, eles podem absorver. Eles são muito jovens, não têm as ferramentas, nem psicológico para lidar com esse tipo de coisa”

Para ela, é importante ainda o trabalho em comunidade para identificar esses “adolescentes que podem estar em risco de serem computados”. No entanto, esse não é “um trabalho só dos professores, mas da comunidade escolar como um todo”, completa. 

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Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

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