Entre Simão Bacamarte e Jim Jones, por Sr. Semana

Vila fundada e dirigida com mão de ferro pelo pastor pentecostal norte-americano Jim Jones na região amazônica da Guiana, foi palco do maior suicídio coletivo da história

Entre Simão Bacamarte e Jim Jones.

por Sr. Semana

Declarações do chefe da nação na semana passada em relação à pandemia do coronavírus causaram estupor. A necropolítica parece alcançar novo e macabro patamar. A fim de contornar a ausência de qualquer paralelismo com as políticas sanitárias atualmente promovidas pelos demais países do mundo, tentemos jogar alguma luz na escuridão do país apelando para um personagem ficcional, mas que é uma caricatura de um comportamento real, e um outro real, mas que é uma caricatura de um comportamento ficcional.

A situação atual do Brasil já foi comparada à da Itaguaí ficcional do conto O Alienista de Machado de Assis. Não a Itaguaí recentemente notória pelo uso do seu porto pelo tráfico miliciano (ver reportagem de Luis Nassif no Jornal GGN, publicada em 21/08/2019, https://jornalggn.com.br/…/operacao-requentada-da-lava-jato-visa-desviar- atencao-das-manobras-de-bolsonaro-com-receita-por-luis-nassif), mas a Itaguaí do século XVIII imaginada por Machado. A cidade é palco dos experimentos psiquiátricos do renomado médico Simão Bacamarte. Apoiado pela elite da cidade, Bacamarte estabelece um manicômio, a Casa Verde, e vai internando todos os moradores nos quais diagnostica algum desequilíbrio mental. Com o número de desiquilibrados internados superando em muito o dos equilibrados, revê sua doutrina invertendo os critérios de diferenciação entre o normal e o patológico, e substitui os internos pelos externos. Bacamarte vai então paulatinamente liberando também esses até o último interno. “Fechada a porta da Casa Verde”, reconhece que é ele próprio quem precisa ser internado e assim “entregou-se ao estudo e à cura de si mesmo” (Machado de Assis, “O Alienista”, Obra Completa, Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2004, vol. 2, p. 288).

Da Itaguaí ficcional cômica setecentista do litoral sul fluminense, passemos à Jonestown trágica do final do século passado. Vila fundada e dirigida com mão de ferro pelo pastor pentecostal norte-americano Jim Jones na região amazônica da Guiana, foi palco do maior suicídio coletivo da história (ver reportagem da BBC Brasil, publicada em 19/11/2018, “Jonestown, 40 anos: o que levou ao maior suicídio coletivo da história”, https://www.bbc.com/portuguese/geral-46258859). Morreram 918 fiéis (somente 35 sobreviveram), a maioria voluntariamente, mas vários assassinados à bala. O líder messiânico morreu com um tiro na própria cabeça. Pouco antes Jones havia transferido sua comunidade religiosa da Califórnia para a Guiana para se livrar das restrições civis do estado às suas práticas despóticas. Denúncias de cárcere privado e maus tratos de membros da comunidade levaram um deputado federal norte-americano à Jonestown. Ele e quatro membros de sua comitiva foram assassinados pela milícia da comunidade quando se preparavam para voltar aos Estados Unidos. O messianismo do Jim e a violência das milícias por ele comandadas, convicções apocalípticas dos fiéis e a escalada do conflito com os poderes institucionais do estado levaram ao desfecho trágico.

Rumamos para Itaguaí ou Jonestown? A crônica desta semana quer ser otimista. Reconhecendo a improbabilidade do desfecho Itaguaí no qual o bom senso acabou por prevalecer, talvez evitemos alternativa semelhante à de Jonestown nos dando conta, num futuro que se espera não longínquo, que o marinheiro viveu somente uma “noite de almirante”.

“A verdade é que o marinheiro não se matou. No dia seguinte, alguns dos companheiros bateram-lhe no ombro, cumprimentando-o pela noite de almirante, e pediram-lhe notícias de Genoveva [nesta crônica interpretada como metáfora do Brasil, seus eleitores e principais instituições], se estava mais bonita, se chorara muito na ausência dele, etc. Ele respondia a tudo com um sorriso satisfeito e discreto, um sorriso de pessoa que viveu uma grande noite. Parece que teve vergonha da realidade e preferiu mentir” (Machado de Assis, “Noite de Almirante”, Obra Completa, vol. 2, p. 451).

Redação

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  1. O autor desse post repete o mesmo papo absurdo: “O maior suicidio coletivo da historia” “Morreram 918 fiéis, (a maioria) voluntariamente, mas (vários) assassinados (Sic) à bala”. O suicidio coletivo ocorreu sim mas foi na midia. Desde quando a BBC (Besteira/Babaquice /Cascata) é fonte séria? Ninguém bebeu algum veveno: o veveno foi injetado com seringas nos corpos previamente deitados de bruços, como ficou posteriormente provado.

    Quem desconhece a formação dos militares brasileiros, em particular, acredita no absurdo do suicidio coletivo com participantes in-voluntários e voluntários assassinados à bala”. Isso sem falar na contagem inicial, com helicoptero, de 400 mortos (todos de cara pro chão e bunda pro céu) e descobrir posteriormente outros —514— aqueles que tentaram a fuga nos campos e foram caçados pela milicias. Detalhe: nenhum curioso foi autorizado a aproximar-se do local nos primeiros cinco dias. Outro detalhe: o deputado Leo Ryan que reunira dois cinegrafistas da NBC e dois assistentes para visitar Jonestown e saber se procediam as denúncias contra os fanáticos da seita, foi assassinado com seus acompanhantes (um deles escapou ileso do atentado). Pela primeira vez na história do governo estadunidense um parlamentar em missão oficial, no exterior, foi assassinado; nem assim o governo protestou junto ao governo da Guyana inglesa e nem pediu um inquérito (ao Bolsonero/Sergio Morto da situação). — Mais outro detalhe: na comitiva do Ryan partecipava um tal de Richard Dwer, oficialmente como funcionário do Departamento de Estado (o Itamaraty dos EUA), na verdade ele era um agente da CIA. Isso Ryan não sabia. De fato foi o unico que não estava perto do Ryan na hora do tiroteio.

    O videomaker e blogger Massimo Mazzucco escreveu um artigo interessante e fez um video usando documentos preciosos e raros extraídos de uma coletânea chamada Evidence of Revision, coleção de clips históricas que dura cerca de 7 horas expondo os bastidores de todos os casos importantes da história estadunidense: do assassinato de John Kennedy à guerra do Vietnam, do assassinato de Robert Kennedy ao nascimento do progeto MK-ULTRA. Essa coletânea pode ser consultada no Youtube. O massacre de Jonestown tem a ver com a Cia e com o já citado Progeto MK-ULTRA, desmontado no ano anterior, em 1977.

    Como diz o autor do artigo e do video, esse massacre por si só é historicamente pouco relevante; passa a ser interessante se foi uma classica operação de depistagem por parte da midia mundial para encobrir o que certamente foi uma operação experimental de controle mental da CIA (MK-ULTRA), abortado por culpa do parlamentar de San Francisco, Leo Ryan.

    Para entender esse desfecho é preciso conhecer seis passagenes:

    1) Nos anos ’70 Jones entra no business como pastor evangélico, funda a igreja chamada Templo do Povo (mas se fosse Templo da Roubada ou Roubada do Povo dava no mesmo). Jones ficara conhecido pelas cestas básicas para crianças pobres. Fez amigos politicos, militares, empresários.
    2) Um belo dia o agora famoso reverendo surpreende suas ovelhas: reunidos todos na “casa do Rei” sobe no pulpito e pede para irem com ele para a Guyana inglesa fundar uma comunidade agrícola e juntos viverem felizes, longe dos males da civilização moderna. A Terra Prometida! Muitos aceitaram. Tudo bem. Até que algum fugitivo voltasse e revelasse a familiares que aquele progeto agricola era na verdade um lager, com milicia armada e trabalhos forçados; com autofalantes por todos os lados que difundiam pregações e discursos de Jones 24 horas por dia, sete dias por semana, com volume altissimo, naquele modo obsessivo, exaltado, muito comum no rito evengélico.
    3) Como parte dessa ininterrupta lavagem cerebral Jones organizava simulações de suicidio coletivo: as pessoas acordavam improvisamente no meio da noite com Jones gritando nos altofalantes, ordenando que saíssem imediatamente em direção do edificio central porque mercenários estavam chegando para matá-los.
    4) Jonestown não era uma comunidade agricola fundada por Jones mas era uma base militar da CIA conhecida como “Progeto Shalom” usada anteriormente no adestramento de mercenários negros para a guerrilha de Angola.
    5) Joseph Holsinger (assistente do parlamentar assassinado que escapou ileso) testemunhou numa comissão parlamentar: “minha impressão é que estavam fazendo algum tipo de experimento de controle mental; tinham um hospital modernissimo que fazia controles médicos diariamente, varias vezes por dia a todos os habitantes da colonia. Uma coisa desse tipo tem sentido no âmbito de algum programa experimental, com grupos sob controle e observação; para mim aquelas pessoas eram cobaias; queriam estudar o que é possivel obter com certos tipos de drogas numa situação de isolamento, estavam no meio da floresta, longe de olhos indiscretos.
    6) Ryan atrapalhou o programa e a CIA para evitar que seguazes da seita revelassem o que realmente acontecia, despachou antecipadamente todo mundo para junto do Senhor.

    Por que é importante voltar a falar desse massacre? Porque oficialmente o programa MK-ULTRA da CIA foi fechado oficialmente em 1974 quando foi descoberto e revelado ao povo estadunidense. O palestino Shiran que atirou em Bob Kennedy, soube-se posteriormente, passara por um programa de controle mental da CIA; de lá pra cá muitos como ele ainda passam por programas desse tipo. O grande John Lennon, entre outras coisas, defendia a causa das Panteras Negras e uniu a CIA e FBI no mesmo ódio contra ele. Minha convicção pessoal (e não estou sozinho) é que o Mark Chapman fosse um desses “programados”. O fato é que infelizmente o mundo não é perfeito. Num mundo perfeito Chapman errava o Lennon e acertava na Yoko.

    Video de Massimo Mazzucco no Youtube (em italiano):

    Il massacro di Jonestown: suicidio di massa, o progetto MK-Ultra?
    https://www.youtube.com/watch?v=NqghFMxPNUI

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