Lagartixa jacaré efeito, noite 1, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Meus pés ficaram gelados, então coloquei uma meia. Com febre eu perdi o sono e comecei a ter delírios. Eis aqui um deles.

Lagartixa jacaré efeito, noite 1

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Ontem tomei a primeira dose da vacina: Oxford/Fiocruz. Jacaré, jacaré, estou virando jacaré. Antes disso porém farei 3 meses de estágio como lagartixa antes de tomar a dose final que completará a transformação. Ok, isso é apenas uma piada baseada na bobagem dita pelo presidente brasileiro acerca do efeito colateral da vacina contra COVID-19. Agora vamos falar de algo sério.

Antes de deitar para dormir não senti qualquer efeito da vacina. Mas  depois de algum tempo deitado eu comecei a sentir meu corpo quente e tive calafrios. Meus pés ficaram gelados, então coloquei uma meia. Com febre eu perdi o sono e comecei a ter delírios. Eis aqui um deles.

Um personagem (eu vou chamá-lo de  A) está em seu apartamento. Ele é alto forte, mulato que usa a barba bem aparada. Alguém bate na porta, ela vai atender. O segundo personagem (eu vou chama-lo de B) é recebido por A.

B também é mulato, forte, mas não usa barba e é mais baixo que o irmão dele.

– Está tudo bem com você meu irmão? – diz A.

– Não, não está. Nossos inimigos invadiram o bloco de apartamentos e estão atras de mim. Eu não consigo derrotar eles sozinho. Você tem que me ajudar, homem. Vamos, meu irmão…- diz B.

– Eu não gosto dos seus métodos. Você sabe disso. Fique aqui, eu vou resolver essa briga do meu jeito. Não saia do apartamento e não abra a porta para ninguém. – diz A.

B fica no apartamento, com a porta trancada. A atravessa a parede e vai lutar com os inimigos. Ele espanca um por um, obrigando-os a ir embora. Aqueles que caem mortos são absorvidos pela estrutura do prédio. Enquanto A está atravessando paredes e corredores e percorrendo os andares do prédio, no apartamento dele B fica um pouco ansioso. Ele também quer participar da luta, mas sabe que tem que fazer o que o irmão mandou.

Um inimigo que conseguiu escapar de A bate na porta do apartamento em que B está escondido. Quando B vai olhar pelo ‘olho mágico’ ele vê seu irmão A.

– Abra a porta, sou eu seu irmão… – diz aquele que parece A.

B abre a porta, o inimigo entra e espanca ele até matá-lo. Quando B está morto, o inimigo que parece A senta-se numa poltrona e fica esperando o verdadeiro A.

Depois que derrotou todos os inimigos A retorna para seu apartamento. Ele atravessa a parede e vê seu doppelganger  (gosto da sonoridade dessa palavra e é a primeira vez que consigo usá-la de maneira apropriada) sentado na poltrona.

– Que bom que você chegou. Veja, A, agora nós somos iguais e não existe inimizade entre nós. – diz o doppelganger.

Ao caminhar em direção ao seu duplo, A fica horrorizado ao ver seu irmão B morto no chão da sala.

– Não pode haver amizade ou semelhança entre nós dois – diz o verdadeiro A.

Então A se transforma no seu irmão B e vai atacar ferozmente o doppelganger dele. Ele derrota o inimigo e joga o corpo dele pela janela do apartamento. Então ele se senta na poltrona e observa seu irmão B ser dissolvido na estrutura do prédio. Quando esse processo é completado ele volta a assumir sua imagem original de A.

Esse foi um delírio interessante. Muito apropriado, suponho. Enquanto eu suava e tremia com febre eu via essas cenas e ao mesmo tempo sentia ela ocorrendo dentro do meu corpo. Agora a pegadinha: eu não sei se o delírio pode ser considerado um efeito colateral da vacina que eu tomei ou apenas o resultado do hamburguer que eu comi ao chegar em casa retornando do posto de saúde.

Fábio de Oliveira Ribeiro, 22/11/1964, advogado desde 1990. Inimigo do fascismo e do fundamentalismo religioso. Defensor das causas perdidas. Estudioso incansável de tudo aquilo que nos transforma em seres realmente humanos.

Este artigo não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Fábio de Oliveira Ribeiro

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