O risco do protecionismo norte-americano

Protecionismo pode custar caro aos EUA

Douglas A. Irwin /Especial para The Wall Street Journal

PORTUGUESEOCTOBER 13, 2010, 7:30 P.M. ET

http://online.wsj.com/article/SB128701251451946769.html?mod=WSJP_economi…

Desemprego e fraco crescimento da economia têm se tornado solo fértil nos Estados Unidos para um novo sentimento protecionista que em muito lembra o período da Grande Depressão dos anos 30 – quando tarifas protecionistas foram erguidas, a princípio sob o argumento de proteger agricultores americanos, mas que resultaram em mais danos que benefícios.

Então, os Estados Unidos estão se preparando para erguer suas pontes levadiças econômicas?

Para entender a tendência atual, ajuda começar com uma visão clara sobre a lei Smoot-Hawley, que introduziu tarifas em 1930 e foi apenas mais um dos vários erros cometidos pelos legisladores na era da Grande Depressão — mas não o mais significativo deles.

Questionado sobre se a Smoot-Hawley tinha causado a Grande Depressão, o professor da Universidade de Chicago e prêmio Nobel de Economia Milton Friedmann respondeu: “Não. Eu acho que a Smoot-Hawley foi uma lei ruim. Acho que ela causou danos. Mas a Smoot-Hawley por si só não teria deixado um quarto dos trabalhadores desempregados”. Como o trabalho do próprio Friedman mostrou, a oferta monetária e os preços domésticos tinham caído em um terço durante a Depressão, em grande parte por problemas de funcionamento do padrão ouro e da política monetária inepta do Federal Reserve. Essas foram as causas fundamentais do desastre econômico.

A tarifa Smoot-Hawley não teve um grande impacto macroeconômico porque na época em que foi criada, diferentemente de hoje, os EUA não eram muito abertos ao comércio internacional. Dito isso, a Smoot-Hawley merece inteiramente a sua notoriedade. Foi uma lei criada num momento ruim e a partir de um julgamento ruim, um espetacular tiro pela culatra.A tarifa foi originalmente proposta para ajudar agricultores americanos, que passaram por longo período de desaquecimento, depois de usufruir de preços altos durante os anos da Primeira Guerra Mundial. Preços agrícolas baixos provocaram problemas financeiros graves e inadimplência nos financiamentos imobiliários.

Para aparentar que estava fazendo alguma coisa para ajudar os agricultores, o Congresso optou por aumentar tarifas de importação. O problema é que a maioria dos agricultores, particularmente os de trigo e algodão, exportavam sua colheita, e o mercado mundial determinava os preços que eles recebiam. Tarifas mais altas no volume trivial de importações que eles enfrentavam não significaram nada para eles.

Pior, o Congresso não conseguiu confinar a nova tarifa aos produtos agrícolas. Coalizões em troca de apoio provocaram o aumento de tarifas para vários produtos importados. Mas no afã de atender aos interesses domésticos, os legisladores esqueceram de uma coisa: a reação internacional e seu impacto sobre as exportações americanas.

Parceiros comerciais ficaram enfurecidos ao ver que o país mais rico do mundo estava bloqueando a estrada de sua capacidade de ganhar os dólares necessários para que eles quitassem dívidas e custeassem os reparos da Primeira Guerra Mundial. Vieram revides. O Canadá, maior mercado de exportação dos EUA, ergueu tarifas discriminatórias sobre os produtos americanos e basicamente entregou seu mercado aos concorrentes britânicos. Alguns poucos empregos podem ter sido criados nos EUA com a barreira à importação, mas muitos mais foram perdidos porque a demanda internacional pelos produtos do país secou.

É muito pouco provável que os EUA retornem à mentalidade da Smoot-Hawley. O país está muito mais integrado à economia mundial do que naquela época, e hoje é amplamente compreendido que interrupções no comércio internacional seriam muito mais custosas. Parece que nós aprendemos algumas lições com a história.

Em primeiro lugar, restrições à importação poucas vezes atingem os objetivos desejados. A Smoot-Hawley na realidade acabou prejudicando os agricultores americanos. Embora alguns ainda afirmem que sanções comerciais à China criariam empregos nos EUA, o efeito mais provável seria mandar esses empregos para outros países emergentes com salários baixos. A tarifa punitiva sobre pneus baratos da China, adotada pelo governo no ano passado, não teve impacto sobre a produção doméstica de pneus e sobre o mercado de trabalho. Os maiores beneficiários foram os produtores de pneu da Tailândia e da Coreia do Sul, cujas exportações para os EUA deram um salto, substituindo as da China.

Mais importante, aprendemos a levar em conta a possibilidade de retaliação internacional contra exportadores americanos. A China é uma potência crescente, onde a ideologia Marxista cedeu espaço a um crescente nacionalismo assertivo. O país não vai sentar quieto se for o alvo direto de restrições comerciais. Na realidade, as recém-criadas tarifas chinesas sobre o frango dos EUA são vistas por muitos como uma desforra pela tarifa do governo Barack Obama sobre os pneus. Isso torna arriscada a estratégia de impor tarifas contra a China.

O episódio Smott-Hawley continua sendo uma história de alerta. Mas existem outras lições menos sutis tiradas dos erros cometidos durante a Grande Depressão, e elas são até mais relevantes para o problema que dos EUA hoje.

O divisor de águas para a política comercial na era da Depressão não foi a assinatura da problemática tarifa em junho de 1930 pelo então presidente Herbert Hoover. Foi quando vários países abandonaram o padrão ouro e outros não, em setembro de 1931. Essa divergência deu início a uma guerra comercial, já que os países que continuaram com o padrão ouro passaram a restringir importações dos países que permitiram que suas moedas se desvalorizassem.

Em uma pesquisa que eu fiz com Barry Eichengreen, da Universidade da Califórnia, Berkeley, nós descobrimos que, durante a década de 30, os países usaram políticas monetárias expansionistas e protecionismo comercial como substitutos entre si.

Os países que se agarraram ao padrão ouro foram forçados a manter políticas monetárias rígidas. Como não podiam imprimir dinheiro para compensar as forças deflacionárias que estavam controlando a economia, eles impuseram tarifas mais altas, cotas e controles de câmbio para restringir as importações. Essas barreiras de entrada não conseguiram impulsionar suas economias. Como consequência, esses países sofreram uma depressão prolongada.

Em contraste, países que abandonaram o padrão ouro e permitiram a depreciação da moeda não precisaram recorrer a medidas protecionistas. Eles usaram a política monetária para combater a deflação e restaurar o crescimento econômico. Além disso, diferente de restrições comerciais, a depreciação da moeda não era uma política de busca de benefícios às custas do vizinho. Como a expansão monetária por trás dessa política estimulou o crescimento, ela na realidade ajudou os países vizinhos. As importações por países com moedas mais fracas cresceram muito mais rápido que as de países que mantiveram a paridade ao ouro.

É aqui que nós achamos a ligação crucial com a nossa situação atual, com a iminente possibilidade de uma guerra cambial. Se todos os principais bancos centrais fossem intervir nos mercados de câmbio para reduzir o valor de suas moedas, nenhum deles conseguiria mudar as taxas de câmbio nominais, mas o movimento seria o equivalente a um afrouxo mundial da política monetária. Uma política monetária mais solta foi essencial para o fim da Depressão nos anos 30. Se ela tivesse sido coordenada de forma que as taxas de câmbio não mudassem abruptamente, o protecionismo poderia ter sido mantido a distância.

Por outro lado, se alguns países intervêm unilateralmente — como a China é acusada, com justiça, de fazer, e outros países estão começando a imitar — as taxas de câmbio nominais são afetadas; os produtos cobrados em yuan se tornam mais baratos quando comprados com dólares ou euros. A experiência da década de 30 mostra que esse tipo de situação dá origem a disputas comerciais e pode provocar respostas protecionistas.

Então, o que pode ser feito para desencorajar os EUA a retaliar contra países que desvalorizam suas moedas?

A ferramenta mais importante para resistir ao sentimento protecionista da década de 30 foi a política monetária que promoveu expansão econômica. Tais políticas funcionaram naquela era, quando os preços estavam caindo e o desemprego estava excepcionalmente alto, e a situação é semelhante hoje, embora não tão extrema. Se o receio de deflação se acalmasse e o mercado de trabalho se expandisse mais rapidamente, a pressão por uma resposta protecionista de Washington se dissiparia. Quando a economia está bem, as disputas cambiais se tornam secundárias.

A grande preocupação é que política monetária expansionista possa levar a uma inflação descontrolada, destruindo a crença no dólar. Tais temores podem ser justificados em tempos normais de alto emprego, mas quando há considerável fraqueza econômica e o desemprego permanece alto, a política monetária pode contribuir para elevar a produção antes que ela provoque um aumento de preços.

Eu suspeito que mesmo Milton Friedman teria aprovado. Nos anos 90, o Japão estava numa situação semelhante à hoje enfrentada pelos EUA: ausência de inflação (ou presença de deflação, no caso do Japão) e crescimento medíocre depois do estouro de uma bolha imobiliária. Ao escrever sobre o Japão em 1997, Friedman observou: “O caminho mais certo para uma recuperação econômica saudável é elevar a taxa de crescimento monetário, para mudar de dinheiro apertado a dinheiro mais fácil, para uma expansão monetária perto da que prevaleceu nos anos dourados da década de 80 mas, novamente, sem exagerar”.

No momento, o Congresso está emprenhado em culpar outros países pela recuperação sem empregos dos EUA. Se o Fed fosse agir de forma mais decisiva, ele não apenas ajudaria a economia, mas também contribuiria para evitar medidas protecionistas que poderiam trazer prejuízos econômicos duradouros.

Douglas A. Irwin, professor de economia da Dartmouth College, é autor do livro “Peddling Protecionism: Smoot-Hawley and the Great Depression”, que será publicado em fevereiro, e “Trade Policy Disaster: Lessons from the 1930s”, que será publicado no quarto trimestre de 2011……………..

Luis Nassif

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