Leilão de Libra foi o primeiro sob o novo marco regulatório da exploração do petróleo

Sugerido por Assis Ribeiro

Da BBC Brasil

Cinco pontos explicam novo modelo exploratório do pré-sal

O leilão do campo de Libra foi o primeiro a ser realizado sob vigência do novo marco regulatório para a exploração petrolífera no Brasil.
 
Saiu vencedor o consórcio formado pela francesa Total, pela americana Shell, pelas chinesas CNPB e CNOOC, e pela Petrobrás, após um leilão marcado por protestos.
 
Aprovado em 2010 para o desenvolvimento das reservas do pré-sal, o novo modelo substituiu o regime de concessões pelo regime de produção partilhada.
 
O modelo garante uma participação ampla da Petrobras e de entes estatais na exploração dos poços, ainda que em parceria com empresas privadas.
 
Abaixo, a BBC explica em 5 pontos o que mudou com tal modelo:
 
1) Propriedade do petróleo
 
Uma diferença básica entre o regime de concessões e o de produção partilhada é que, no primeiro, as petrolíferas são donas do petróleo produzido, enquanto que no segundo o petróleo é da União.

 
2) Remuneração das empresas
 
Como consequência da diferença acima, no modelo de concessões, as empresas privadas remuneram o Estado pelo “direito” de extrair petróleo por meio de royalties, impostos e de um bônus de assinatura (pagamento feito de imediato ao assinar o contrato).
 
Já no novo modelo além de o Estado receber os royalties, impostos e bônus de assinatura, também “recebe” das empresas o petróleo extraído das reservas em questão.
 
Na prática, as petrolíferas privadas são “remuneradas” pelo Estado por seus investimentos com parte da produção.
 
No caso de Libra, por exemplo, o edital do leilão estabelece que a União ficará com um mínimo de 41,65% do chamado “lucro-óleo” – o petróleo produzido depois de descontados os custos de produção.
 
No leilão, o bônus de assinatura é fixo (R$ 15 bilhões) e a petrolífera vencedora será a que se dispuser a abrir mão de uma fatia maior desse lucro-óleo em favor da União.
 
Já em um leilão de concessão em geral vence quem oferece o maior bônus de assinatura ou mais royalties ao Estado.
 
3) Participação da Petrobras
 
No modelo adotado pelo Brasil em 2010, a Petrobras tem uma parcela mínima de 30% em todos os projetos do pré-sal e só os outros 70% é que vão a leilão.
 
A estatal também pode se juntar a um dos consórcios competindo por esses 70% para aumentar sua parcela nos projetos.
 
Além disso, ela é a “operadora” dos campos, ou seja, é responsável pela administração e decisões estratégicas, o que lhe dá controle sobre todo o processo de produção – desde a tecnologia que será utilizada até o ritmo de exploração.
 
Em um regime de concessão, as operadoras seriam as empresas privadas.
 
“Na prática, no novo modelo as empresas estrangeiras são quase que simples financiadoras dos projetos”, acredita Carlos Assis, especialista em gás e petróleo da consultoria EY.
 
4) Estatal do pré-sal
 
No novo modelo, também será criada uma estatal para supervisionar a exploração do petróleo do pré-sal – a chamada Pré-sal Petróleo SA, ou PPSA.
 
A empresa seria instalada a princípio em uma sala da Agência Nacional do Petróleo (ANP), segundo o jornal Valor Econômico, mas poderia chegar a ter 180 funcionários.
 
Não está claro até que ponto a PPSA interferirá nos projetos e como se relacionará com as empresas.
 
A ideia, porém, é que tenha poder de veto sobre decisões estratégias – o que, para analistas como Assis e Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura, amplia as incertezas dos investidores privados.
 
5) Conteúdo nacional
 
No novo modelo também foram incluídos requerimentos sobre o conteúdo nacional dos projetos.
 
O percentual mínimo de componentes brasileiros usados na operação tem de ser de 37% na fase de exploração, 55% na fase de desenvolvimento até 2021 e 59% depois desse ano.
 
Segundo analistas, há dúvidas sobre a capacidade da indústria nacional conseguir suprir as necessidades de bens e serviços de alto valor agregado dos projetos nesses prazos.
Redação

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  1. Pré-sal e o futuro do Brasil – Giorgio R. Schutte

    Pré-sal e o futuro do Brasil – Giorgio R. Schutte

    21/10/2013 Nos últimos meses, instalou-se no debate uma visão de que a Petrobras, em vez de orgulho nacional, seria um exemplo das mazelas que impedem o crescimento do Brasil. Essa visão precisa ser equilibrada.

    Curiosamente, embora duramente criticada por alguns setores liberais e aqueles vinculados a interesses dos oligopólios internacionais, o assunto não ganhou o merecido destaque na campanha eleitoral de 2010, ano em que o marco-regulatório do pré-sal foi discutido e aprovado no Congresso.
    Diante das três rodadas de licitação de petróleo e gás neste ano, com destaque para a primeira do pré-sal, sob o regime de partilha, marcado para hoje, o tema surgiu, porém de forma desequilibrada. São várias questões que estão em jogo, nem sempre diretamente interligadas.

    Uma visão de curto prazo, característica dos investidores financeiros, contra a qual Keynes já havia nos alertado na década de 1930, pode levar a uma interpretação errada dos seguintes fatos: a ausência de aumento da produção total de petróleo e gás no período 2010-2013, o déficit anual de mais de US$ 10 bilhões na conta de abastecimento e a queda das ações da Petrobras.

    No que diz respeito ao último ponto, cabe citar o próprio Keynes: “…seria insensato pagar 25 por um investimento cuja renda esperada, supõe-se, justifica um valor de 30 se, por outro lado, se acredita que o mercado o avaliará em 20 três meses depois”. Projetados para os dias de hoje, meses seriam dias. É óbvio que nesse momento a ação da Petrobras é um investimento de longo prazo. A megacapitalização aumentou o capital para possibilitar aumento da receita no futuro, baixando no curto prazo a rentabilidade. Não serve a lógica da liquidez no curto prazo.

    Voltando aos outros pontos. A estabilidade do nível de produção esconde um enorme êxito da Petrobras, detentora de uma tecnologia endógena construída ao longo de décadas, que a fez descobrir o pré-sal. Em junho de 2013, somente sete anos depois da descoberta, o Brasil estava produzindo 376 mil de petróleo e gás equivalente por dia do pré-sal, superando todas as estimativas, inclusive da própria empresa. O sucesso exploratório nas áreas de pré-sal é de 82%, contra uma média da Petrobras, no Brasil, de 64%. Para isso, na escassez dos equipamentos, foi necessário frear a produção em campos existentes muito além do nível de esgotamento. Ou seja, recuperável com a chegada dos novos equipamentos e esforços em curso para melhorar a produtividade e gestão nos campos antigos. Mas, a partir de segunda metade de 2013, este quadro mudou.

    Seria um grave erro insistir que os supostos atrasos na exploração e produção seriam fruto das exigências de conteúdo local. Diante de uma demanda, até 2020, estimada pela Organização Nacional de Indústria de Petróleo (ONIP), de R$ 400 bilhões em serviços e equipamentos do setor de petróleo e gás no Brasil, seria uma irresponsabilidade não aproveitar as oportunidades de longo prazo para a produção local. Não há dúvida de que possa existir um trade-off entre interesses de curto prazo na exploração e produção o mais rápido possível, de um lado, e interesses de longo prazo da economia, de outro.

    Na próxima década, o Brasil deve chegar a uma produção de óleo e gás equivalente a cerca seis bilhões de barris por dia, nível atingido hoje somente por quatro países no mundo. É o tamanho e a perspectiva de médio-longo prazo que justifica que a atuação da Petrobras e o marco-regulatório devam ser pensados no âmbito da estratégia de política industrial e tecnológica do país.

    O que não deve mudar, porém, nos próximos dez anos, é o déficit na conta de derivados. A política de crescimento com distribuição de renda gerou uma explosão do consumo de petróleo e gás. O número de passageiros aéreos aumentando, de uma média anual, de 34,8 milhões, no período 2000-2003, para 83,5 milhões, no período de 2008-2012. Haja querosene. Ou o número de licenciamento de veículos, de uma média de 1,5 milhão para 3,5 milhões no mesmo período. O consumo aparente de derivados de petróleo aumentou 76% entre 2002 e 2011. A última refinaria (em São José dos Campos) foi entregue em 1980, como fruto do segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (PND II).

    Observa-se ainda que 42,5% dos derivados importados são não-energéticos (principalmente nafta, matéria prima da indústria petroquímica-plástica), também fruto da política de crescimento com distribuição de renda, considerando a alta elasticidade renda/demanda de plásticos para consumo popular. A Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) projetou um aumento do consumo de plásticos de 23 kg por habitante, em 2005, para 46 kg por habitante, em 2015.

    Logo, o Brasil vai importar gasolina, diesel, querosene e nafta e exportar petróleo cru até 2020, quando o atual planejamento de expansão da capacidade de refino estará completo. Nada tem a ver com o novo marco regulatório. Mas isso significa um gasto para a Petrobras, que está importando os derivados a preços superiores àqueles praticados no mercado interno. Correta, portanto, a defesa da convergência dos preços internos com os preços internacionais, devolvendo, inclusive, o espaço devido ao etanol, muito menos poluente e abrindo caminho para biodiesel.

    Considerando o impacto de uma forma ou outra sobre a economia brasileira, o debate público sobre o pré-sal é essencial, mas não pode ser restrito a visões e interesses específicos e/ou de curto prazo (Giorgio Romano Schutte, mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Amsterdam e doutor em Sociologia pela USP, é professor de economia e relações internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC)

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