Globo News reforça extrema direita e estimula ódio contra repatriados da Faixa de Gaza

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
[email protected]

Reportagem de Délis Ortiz, também veiculada pelo Jornal Nacional, reproduziu informação da deputada bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP)

O governo Lula repatriou nesta segunda-feira (12) 31 brasileiros que viviam na Faixa de Gaza. A família de Hassan Habee chegou junto com o grupo. Foto: Reprodução/Rede social Hassan Rabee

Em matéria veiculada pela Globo News nesta quinta-feira (16), a repórter Délis Ortiz utilizou a família de Hassan Rabee para ilustrar o grupo de 31 brasileiros repatriados da Faixa de Gaza, na Palestina, resgatados no Oriente Médio nesta segunda-feira (12) pelo governo federal. 

Para surpresa de Hassan, que atendeu a equipe da Globo News sem ressalvas, na reportagem ele é tratado por Délis Ortiz como um radical extremista por supostamente apoiar o grupo Hamas, responsável pelo ataque terrorista a Israel no último dia 7 de outubro. 

A jornalista baseou a sua informação falsa em postagens antigas de Hassan, publicadas em rede social muito antes do atual conflito, no ano de 2015, em que, devido ao que o povo palestino sofre na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, conforme explicação, ele escreveu que estava na hora do Hamas “explodir ônibus em Israel”. 

Hassan apagou a postagem e justificou que escreveu em um momento de raiva e angústia pelo o que estava vendo acontecer com os palestinos no conflito com o Estado de Israel, o avanço das ocupações militares nos territórios da Palestina e abusos locais de autoridades militares. Da mesma forma, não informação de que Hassan tenha vínculo com o Hamas.  

Hassan e sua família passaram a sofrer ameaças de morte, agressões, xingamentos racistas e xenófobos desde que chegaram ao Brasil. Já são mais de 200 mensagens de ódio.

Os ataques contra o repatriado se intensificaram após a reportagem da Globo News, que, por sua vez, teve uma origem não questionada por Délis Ortiz, autora da matéria: a extrema direita no Congresso Nacional e a máquina de produção de ataques de ódio que alimenta na internet.  

Pedido de proteção ao governo 

Os ataques foram iniciados após a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) acusar o repatriado de compartilhar conteúdo “pró-terrorismo”. A parlamentar resgatou a postagem de 2015 feita por Hassan. Ato contínuo, os seguidores da deputada, que se vinculam ao bolsonarismo, passaram a disseminar que Hassan é terrorista. 

Na entrevista também veiculada pelo Jornal Nacional, Hassan afirmou que não se lembra da postagem e que é contrário a atos de violência. “Não sou a favor de violência nenhuma, sou a favor de conversa, sempre. Pode ser que eu tenha postado com raiva, mas não me lembro de nada”, disse o repatriado.

A defesa de Hassan formalizou um pedido para que o brasileiro e os familiares sejam incluídos no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH). As informações da defesa de Hassan foram divulgadas primeiramente pelo jornal Folha de S.Paulo, na coluna de Mônica Bergamo.

A defesa de Hassan destacou ainda para a colunista que pretende processar todos os autores dos ataques sofridos pelo brasileiro, incluindo a deputada Carla Zambelli. 

“Nós vamos processar. É inadmissível que exista impunidade. Cada vez que há impunidade, essas pessoas se sentem mais empoderadas [em promover ataques]. Hoje é a família do Hassan, mas deve sair uma segunda lista [de futuros repatriados]. E essas pessoas que estão vindo, também vão passar por isso?”, indagou a advogada Talitha Camargo da Fonseca à Folha de S.Paulo.

Outras questões permeiam a falta de cuidado em reproduzir a informação sem checagem e em um contexto inverídico: como um “terrorista” do Hamas pode estar desde o início das hostilidades (dia 7 de outubro) se expondo nas redes sociais sem ir ao combate e ainda pedindo ajuda para deixar a Faixa de Gaza? Se Hassan é “terrorista”, não deveria estar na lista do Mossad, serviço secreto israelense, entregue à Policia Federal brasileira – ainda mais depois de se expor tanto nas redes sociais?

LEIA MAIS:

Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador