Entrevista: Irã vive tensão de escalada da guerra contra Israel, diz embaixador ao GGN

Dolores Guerra
Dolores Guerra é formada em Letras pela USP, foi professora de idiomas e tradutora-intérprete entre Brasil e México por 10 anos, e atualmente transita de carreira, estudando Jornalismo em São Paulo. Colabora com veículos especializados em geopolítica, e é estagiária do Jornal GGN desde março de 2014.
[email protected]

Embaixador no Irã relata clima do país após ataque a Israel e ressalta a importância do país asiático na economia; assista

Crédito: Agência Senado

A situação está variando em graus de tensão e ansiedade a cada momento”, afirmou o embaixador brasileiro no Irã, Eduardo Gradilone, em entrevista exclusiva ao canal TVGGN [assista abaixo] após o Irã deflagrar ataques contra Israel.

Apesar de que tenham sentido um “certo alívio” após a chancelaria chamar o corpo diplomático, assegurando, segundo Gradilone, “que o ataque tinha sido bem limitado, restrito, estritamente, segundo a legislação internacional que garante o direito de defesa” e que o Irã considerava um assunto encerrado, Israel decidiu escalar sua resposta, aumentando a tensão. 

A pequena comunidade brasileira no Irã, formada por cerca de 180 compatriotas, foi mobilizada pela embaixada do Brasil, que organizou um grupo de WhatsApp para manter contato diário e permanente diante da crise iniciada no último fim de semana.

“A cada vez que tem um sobressalto, mais brasileiros se filiam a esse chat”, revelou o embaixador ao sustentar que os aeroportos já foram reabertos e que eles poderiam sair do país normalmente, desde que a chancelaria iraniana expôs sua posição oficial. 

Para o embaixador, o Irã está disposto a abrir “a possibilidade de haver uma espécie de pausa nessa situação de crise” e  encaminhando o assunto “agora pelas vias diplomáticas, que é o caminho que o Brasil sempre defendeu e sempre defenderá em caso de qualquer conflito”. 

Brasil e Irã, uma relação de 120 anos

Sobre as relações bilaterais, o embaixador revelou que “o Brasil é visto com uma enorme simpatia” dentro da institucionalidade iraniana. “Se nós tivéssemos de graduar os países em termos de quais são os países mais sujeitos a programas com o governo do Irã, o Brasil estaria, certamente, entre aqueles que têm melhor relacionamento”, defendeu Gradilone. 

Principalmente com o retorno do governo Lula, o diplomático acredita que “se retomaram as boas relações dos dois primeiros mandatos do presidente”. Para ele, essa seria uma vantagem muito maior, que representantes de outros países ocidentais não teriam, como Alemanha e Reino Unido. 

Entre as iniciativas da embaixada para o próximo período estaria a estreia de um Programa de Leitorado de Portugues (Brasil- Portugal), que seria lançado durante a celebração da língua portuguesa, dia 5 de maio, com a inauguração da nova residência da embaixada. 

O maior desafio para o corpo diplomático brasileiro relatado pelo embaixador é o alto número de afegãos “suplicando por vistos e nós com dificuldades de atender a todos, embora reconheçamos as agruras que eles passam”. Desde o retorno do Taleban ao comando do Afeganistão, muitos afegãos fogem para o Irã em busca de refúgio em outras partes do mundo. 

As parceria comerciais entre Brasil e Irã 

O Brasil cumpre um importante papel quanto à garantia da segurança alimentar do Irã, na qualidade de exportador agropecuário. Apenas em 2023, o Irã foi responsável por uma receita de US$2,3 bilhões a produtos agropecuários brasileiros, de acordo com a Agrostat. 

Ainda no ano passado, a União Europeia, Irã e Indonésia foram os maiores importadores de farelo de soja brasileiro, cujo valor cresceu 75,1% devido ao aumento do volume exportado, segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA). Além da soja, os produtos mais importados pelo mercado iraniano são compostos por cereais, farinhas e preparações. 

Em 2024, o agronegócio brasileiros já exportou mais de US$716 milhões ao país asiático, segundo o MAPA. 

Em 2022, a então Ministra da Agricultura, Teresa Cristina, visitou o país asiático por intermédio da Câmara de Comércio Brasil-Irã para fortalecer as relações comerciais bilaterais, focando-se na compra de fertilizantes iranianos. 

A senadora pelo Mato Grosso do Sul descreveu a nota do Itamaraty quanto a retaliação iraniana como “genérica e fraca”. “Temos sim de condenar com todas as letras o risco de escalada de guerra que a reação do Irã, até aqui contida, pode significar para as populações do Oriente Médio”, declarou Teresa Cristina em sua rede social. 

O papel do Brasil quanto ao acordo nuclear iraniano 

Gradilone expressou que o fracasso do acordo nuclear negociado com o Irã por Brasil e Turquia os deixou “muito magoados”. 

Em 2010, a Declaração de Teerã, assinada pelos chefes de Estado do Irã, Turquia e Brasil pretendia reafirmar o compromisso do país asiático com o Tratado de Não Proliferação Nuclear e o direito de todos os Estados desenvolverem pesquisa, produção e uso de energia nuclear para fins pacíficos.

No entanto, os Estados Unidos preferiram corroborar seu acordo anterior a apoiar o acordo Sul-Sul organizado pelo Brasil, atrasando o desenrolar da trama nuclear em vários anos. 

Para o atual embaixador brasileiro no Irã, as razões para que os Estados Unidos não reforçasse a Declaração de Teerã poderiam estar relacionadas a preferência por nenhum tipo acordo, “porque qualquer acordo vai mascarar o projeto nuclear iraniano” ou, até mesmo, o incômodo  pelo fato dos interlocutores não serem os que grandes potências esperavam. Afinal, segundo o embaixador, “todas essas resistências e forças antagônicas se reuniram para achar que nosso acordo não estava garantindo o controle do projeto nuclear americano”, mas terminaram assinando outro “que não é muito diferente”. 

LEIA TAMBÉM:

Dolores Guerra

Dolores Guerra é formada em Letras pela USP, foi professora de idiomas e tradutora-intérprete entre Brasil e México por 10 anos, e atualmente transita de carreira, estudando Jornalismo em São Paulo. Colabora com veículos especializados em geopolítica, e é estagiária do Jornal GGN desde março de 2014.

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. E tudo isso sem falar do mundo paralelo, da perene distorção da realidade praticada por Hollywood. Um exemplo: Em 1979 aconteceu uma revolução islâmica no Irã. Alguns estudantes iranianos aprisionaram diplomatas estadunidenses. Para resgata-los a Casa Branca organizou a operação secreta Eagle Claw: dos oito helicópteros que decolaram do porta-aviões o primeiro caiu no mar após a decolagem; o segundo perdeu-se no deserto e retornou; os seis restantes conseguiram chegar na zona estabelecida mas um deles chocou-se com o avião cisterna e explodiram juntos; como se não bastasse, o lugar designado pelo “intelligence service” para desembarcar os “Rambos”, na moita, era às margens de uma rodovia movimentada tipo Avenida Brasil no Rio de Janeiro. Erraram os cálculos. Daqui pra frente a operação passa de Eagle Claw a Eagle Clay. Para não serem descobertos mataram um motorista de caminhão e sequestraram um ônibus com dezenas de pessoas a bordo, que passavam no local. Diante de tanta falência os Rambos frustrados e com o cu piscando deram no pé antes que chegassem os militares iranianos, abandonando cinco helicópteros em perfeito estado, armas e toda a papelada com carimbo Top Secret 🙂 Enquanto isso, diplomatas canadenses entregam seis diplomatas estadunidenses que estavam escondidos na embaixada deles desde o início dos protestos. Apesar desses fatos serem documentados, Hollywood desavergonhadamente produz e premia o filme Argo, completamente descolado da realidade. Hoje na opinião pública conta a narração desse filme. Moral: se os fatos contradizem os teus interesses então que se danem os fatos. Depois disso um desazado Jimmy Carter volta a vender amendoim. —— E assim segundo a Reuters o ataque israelense é SUPOSTO; o Irã revida legitimamente um ataque não provocado e os EUA estudam outras sanções contra ele; Israel revidando um ataque “false flag” que matou e aprisionou israelenses já matou até agora, somente de crianças palestinas, mais de trinta mil; continua atacando e matando vizinhos sem ser provocado e ninguém pede sanções contra Israel. —— Steny “dick head” Hayer, democrata de Maryland: “Um Irã encorajado lançou ataque sem precedentes ao nosso aliado. Vamos deixar claro para o mundo que a América é defensora da liberdade, da democracia e do direito internacional” – Gargalhadas, vaias, algazarra. Pano rápido.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador