Resenha: “ Em busca de um final feliz”, de Katherine Boo.

01. BEHIND THE BEAUTIFUL FOREVERS: Life, Death, and Hope in a Mumbai Undercity, de Katherine Boo, 256 pages. Random House. 2012(*)

Katherine Boo não é uma romancista. Ela é uma jornalista nascida e criada em Washington/DC, já laureada com nada menos que um Pulitzer Prize, e um talento excepcional para transformar um documentário em uma hipnotizante obra de ficção.

De 1993 a 2003, K. Boo trabalhou no Washington Post , sempre obcecada pelo tema dos menos privilegiados, a quem acompanhou de perto, em seus diversos sofrimentos.

Sua série de reportagens sobre deficientes mentais , em 2000, lhe rendeu as honrarias máximas do jornalismo yankee, e a aclamação pública pela seriedade e preciosismo com que executou suas pesquisas.

Sendo ela própria vítima de severos efeitos colaterais de uma artrite reumática, que lhe aflige desde a adolescência, e lhe deformou as mãos, a autora entende um bocado das dores e limitações que podem acometer o ser humano.

Mas ainda assim, casada com um proeminente acadêmico de origem indiana, utilizou 3 anos de pesquisa in loco, não para mais uma reportagem impecável, mas como matéria-prima de seu primeiro livro de ficção.

Foi um tiro certeiro: aos 48 anos, já radicada como editora da New Yorker, abocanhou, de primeira, nada menos que o National Book Award de 2012.

Ela e o livro de estreia merecem o bafafá que têm provocado, e que certamente não demorará a desembarcar no Brasil.

Aproximadamente 350 barracos, prensados ao lado de um gigantesco esgoto a céu aberto, abrigam 3.000 habitantes. Entre estes e a Índia moderna, vibrante e em galopante transformação, apenas uma parede de concreto. Uma enorme e fundamental parede para esconder a mais cruel miséria, ocultar seres sem qualquer chance de uma existência digna. Assim é Annawadi, a favela de Mumbai que explode nas páginas do livro.

A mesma parede é o personagem que dá o lindíssimo título da obra.

Do lado debruçado para a rodovia, que leva ao moderníssimo Chatrapati Shivaji International Airport de Mumbai, out-doors de um radiante amarelo-sol, com anúncios de revestimentos cerâmicos, nos quais as palavras “Beautiful” e “Forever” são repetidas diversas vezes.

Por trás dessas “sempre” e “lindas” promessas de felicidade, em forma de azulejo, Zehrunisa , Abdul, Fatima, Sunil, Asha, vão protagonizar a complexa, mas surpreendentemente funcional, realidade da favela. Não qualquer favela, mas sim aquela situada no país que abriga um terço de todos os miseráveis do Planeta.

E é justamente aí que se revela o maior mérito da autora: humanizar e tratar como indivíduos cada um dos personagens, cada um dos relatos, cada um dos enredos vividos.

A crítica do New York Times resumiu: “ao aceitar a quantidade de esgoto, literal e moral, que permeia a vida em Annawadi, Katherine Boo oferece algo muito mais poderoso do que um olhar agudo, direto e isento. A capa do livro, com uma imagem de miséria abjeta, não faz justiça à sua prosa ágil, ao tom irônico e à teatralidade surpreendentemente otimista. A comparação com Dickens não é infundada”.

Portanto, se você se emocionou com “Quem quer ser um milionário?”, virou a noite lendo o thriller “Tigre Branco” de Aravind Adiga, já salivou por uma samosa bem temperada, e adoraria falar híndi para acompanhar as produções de Bollywood, não perca mais tempo:a obra de Katherine Boo será seu próximo destino literário!

(*) Edição em Português: “ Em busca de um final feliz”, Ed . Novo Conceito, 2013.