A mídia e a eleição de Tancredo, por Luis Nassif

O curioso na história é que, provavelmente, Gaspari já sabia, na época de todas as armações de militares contra Tancredo.

Tancredo Neves

Lendo o artigo de Elio Gaspari sobre a maneira como os militares tentaram boicotar a campanha de Tancredo Neves à presidência – “De Tancredo.Neves para Lula@PT”, , me veio à memória um episódio curioso.

Assumi a Secretaria de Redação da Folha quase por imposição. A coluna Dinheiro Vivo tinha pegado, tornara-se a mais lida da economia. Meu programa “Cash”, na TV Gazeta tinha boa penetração no mercado. Até que o então Secretário de Redação Caio Túlio me procurou com um recado curioso. Otávio Frias Filho estava sendo preparado para assumir a direção editorial, no lugar de Boris Casoy – colocado no cargo apenas para aliviar a barra da Folha com os militares. Eram novos tempos, a ditadura começava a se esgarçar, a Folha havia desfraldado a bandeira das diretas e era hora de interromper o interinato de Boris. 

Mas Otavinho impusera uma condição: que eu assumisse como Secretário de Redação. E, até então, eu jamais tivera sequer uma conversa pessoal com ele.

A coluna conseguira uma boa repercussão com ações em defesa dos mutuários e dos aposentados. Ponderei que minha ida para a Secretaria prejudicaria os trabalhos. Mas não houve jeito. Prometeram-me dois repórteres para ajudar no dia a dia da coluna. E impuseram a condição era a de que eu pedisse demissão da diretoria do Sindicato dos Jornalistas. Pouco antes, houve um acordo entre a esquerda independente e o PT para eleger a diretoria. Do lado independente fomos eu e o Joelmir Betting. Fui até o Sindicato e a diretoria recomendou que eu não pedisse demissão. Coloquei a questão para a Folha, que aceitou minha continuação no sindicato.

Meu cargo era de Secretário de Produção. Reunia-me toda manhã com pauteiros das editorias para discutir a edição do dia. E, nos finais de semana, revezava com o Caio Tulio – Secretário de Redação da noite – para fechar a edição.

No meu primeiro fechamento, falou mais alto a impetuosidade dos inexperientes. A candidatura de Tancredo Neves crescia, reduzindo as possibilidades das candidaturas de Paulo Maluf, o candidato de Golbery do Couto e Silva, cooptado pela colônia libanesa de São Paulo.

Aí, no sábado sai a edição da Veja com uma entrevista em Páginas Amarelas com o próprio Golbery, feita por Gaspari. Era a primeira vez que Golbery se expunha. Antes, todas suas mensagens eram transmitidas sem menção à fonte pelo próprio Gaspari, o grande porta-voz do grupo militar na mídia. Agora, com o regime fazendo água, o próprio Golbery saía das sombras para uma entrevista em on. Sem espaço para as matérias pró-Golbery, a única alternativa era o fato jornalístico da entrevista pessoal com o ”mago”.

Gaspari tinha uma extensa lista de serviços prestados à ditadura, como a divulgação das fotos da esposa de um dos principais senadores da oposição em um motel com outra liderança oposicionista, cena fotografada pelo SNI. E outra denúncia sobre a esposa de outgro senador de oposição, cleptomaníaca. Praticava um jogo pesado de defesa da ditadura e contra a oposição..

Decidi, então, por conta própria, sem consultar os Frias, rebater a entrevista. Pautei os repórteres, escrevi o texto final e as manchetes da página e da primeira página.

Lembrava como Gaspari fez a campanha pró-João Batista Figueiredo, apresentando-o como intelectual, tríplice coroado, grande matemático. A ilustração era um Golbery pequeno projetando uma enorme sombra, para ilustrar o título, que dizia que Golbery era muito menor que a sombra que projetava. Foi a manchete principal do jornal.

Na segunda-feira de manhã fui chamado à sala de Frias pai, na presença dele e de Frias, filho. Diria que, pela gravidade do episódio, ambos foram compreensivos. Me disseram que havia temas que, antes de entrar, eles teriam que ser consultados. Estavam cobertos de razão e me desculpei pela imprudência. Mas no domingo e na segunda o jornal foi inundado por telegramas de apoio.

Comentei com eles que, de um lado, estavam cobertos de razão em relação à minha imprudência. Mas, de outro, o episódio comprovava que a Folha já fazia parte do primeiro time da imprensa, ombreando-se com Veja e o Jornal Nacional que, até então, eram absolutos como formadores de opinião na mídia.

De fato, a Folha iniciara sua caminhada com a campanha nas diretas que, nas décadas seguintes, a transformaria no mais influente veículo de mídia brasileiro. Agora, rompera definitivamente com o complexo de inferioridade em relação aos demais veículos.

O curioso na história é que, provavelmente, Gaspari já sabia, na época de todas as armações de militares contra Tancredo. De qualquer modo, quando a candidatura de Maluf expulsou Andreazza da parada, a própria revista aderiu à Nova República.

Corrigido às 20:00 do dia 24.0.2022, sobre o apoio de Golbery a Maluf, nao a Andreazza.

Luis Nassif

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Assinei a internet discada e sob DDD (não existia provedor em minha cidade) em 1999, levado por pelo menos 15 anos de bom jornalismo, acompanhado sempre com um dia de atraso, que era o tempo que levava até chegar a mim, no interior nordestino. Com a internet passei a ler imediatamente após a publicação. Fiz isso até 2009, quando a paciência se esgotou com o panfletarismo descarado da porta-voz do Tucanistão. Sobre Gaspari… sou mais Alexandre Garcia, muito mais honesto.

  2. O enigma militar é parte do mistério nacional. O seu colega jornalista italiano foi o coroinha. PHA ainda na ativa, espinafrava o dos chapéus semanalmente. Boa memória, quae sera tamen…

  3. O Revisionismo Histórico dos Lacaios não se aguenta. Já que a “vaca foi pro brejo” e TARCÍSIO e CAPITÃO ganharão no 1.o Turno, pra que vamos mudar o discurso farsante destes 92 anos?!! Morreremos abraçados à fraude que nos sustentou por quase 1 século. O Círculo Familiar do Ditador Assassino Fascista, em abjeto Nepotismo, que impunha a Cleptocracia desde 1930. Junto com o pária, outros como JANGO, Ivete e Alzira Vargas, Leonel Brizola,…endeusando o assassino de Estudantes e Advogados do Largo S. Francisco e sua Ditadura Fascista ou as Prisões Políticas, Paus de Arara e Cemitérios Clandestinos de Filinto Muller ou Deportações de Cidadãos Brasileiros para Crematórios Nazistas com as benções deste STF ou o assassinato do Major da Aeronaútica, quando se tentava matar Carlos Lacerda. Honremos o “Pai dos Pobres”, “Herói da Pátria”. Então o tal 1.o Ministro volta exigindo sua parte no Feudo da Cleptocracia. Sustentou o Lacaio Juscelino Kubscheck, o Nepotismo com Jango, agora chegou a sua vez. Uma Nova Política, um Novo Brasil, uma Redemocracia !! Não sem um outro golpe a passar a perna nos Brasileiros. Juremos a Luta intransigente por Diretas Já e depois juntamente com Nossos Comparsas desde 1930, vamos garantir o Feudo em Indiretas ao lado de José Sarney da UDN, da ARENA, do PFL, do Centrão. Ou seria uma coisa só. Uma vez comparsa sempre comparsa. Com Revisionisismo Histórico e Cleptocracia então seguimos construindo 92 anos de Latrina da Humanidade. Ou seria Paiseco ou seria Anão Diplomático ou seria Quintal dos Outros?? Pobre pais rico. 92 anos. GV.Dutra.GV.Tancredo.JK.Brizola.Jango.Tancredo.Itamar.Brizola.Aécio.ProjetodePoder. Mas de muito fácil explicação.

  4. A mídia e a “trancação.”Credo.Por eu.Aí q medo vou virar macaco,reparem o mesmo modus operando de Dilma pedalada,Lula ladrão e a nível internacional Putin demônio,conseguiram trancar todo mundo em casa por causa de uma “pandemia”de letalidade 2 por cento,Viva ao donos da imprensa mundial !!

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador