While my heart gently weeps, por Sérgio Saraiva

B.B.King, nascido em 16 de setembro de 1925 e falecido em 14 de maio de 2015. Duas informações irrelevantes, é inútil tentar reter o eterno entre dois marcos temporais. Onde e enquanto houver blues, ele estará entre nós.

 

Divino blues

 

O preto não entendia o que acontecia,

O preto só tocava e sorria.

O preto batia os dedos nas cordas

e tirava delas um som celestial.

O preto tocava do jeito que o diabo gosta,

do jeito que o mundo gosta.

O diabo escutou a música e subiu

para ver o que ouvia, o que havia.

O diabo ouviu, gostou e resolveu ficar,

feliz.

A Terra toda ficou feliz.

De repente, não existiam mais guerras,

só aquela música enchendo o planeta

do desejo de ser feliz.

 

O preto não entendia o que acontecia,

O preto só tocava e sorria.

 

O diabo se juntou com uma negra latina

do Mississippi, chamada Maria Magdalena.

O diabo passava o dia inteiro bêbado

dançando no cais da beira do rio.

Dava gosto ver aquele homem grandão,

ruivo, de cara vermelha

rindo feliz

como um bebê rosado

com a barriga cheia de leite.

Um mundo de bêbados se abraçava a ele.

Passavam-lhe a mão na bunda

e  ele dizia com a língua enrolada:

“Aí não! “.

O bafo de cerveja e enxofre assustava,

mas mais mal do que isso não fazia.

 

O preto não entendia o que acontecia,

O preto só tocava e sorria.

 

Deus entendia.

E não gostava do que via,

daquela quebra de hierarquia.

Aquilo começava nos domínios do demônio,

mas só Deus sabe onde acabaria.

Restabelecer a ordem então cabia.

Matou o preto.

Tomou uma guitarra emprestada com o Papa,

levou o preto pra tocar só para Ele,

no Céu.

 

O preto não entendia o que acontecia,

o preto só tocava e sorria.

 

O diabo acordou com o silêncio, mal humorado.

Abandonou Maria Magdalena e os filhos dela

e enfiou a cara no mundo,

arranjando encrencas por aonde ia.

Tudo voltou ao normal.

 

E, agora, eu estou aqui,

tentando inventar um blues

para distrair o capeta.

Mas nem preto eu sou,

e as coisas não têm andado muito fáceis,

ultimamente.

 

PS : para entregas em domicílio consulte a oficina de concertos gerais e poesia.

Redação

12 Comentários

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    1. Morreu o grande De Biquíni,

      Morreu o grande De Biquíni, daquela canção do Jota Quest:

      “Na madrugada a vitrola rolando um blues / Trocando de biquíni sem parar…”

      1. Thrill is gone

        “Thrill is gone”.

        Você, visivelmente, não tem como saber o que isso significa e nem o quanto está perdendo com isso.

        E, a bem da verdade, nem merece saber.

        1. Ei!

          Saraiva, você imaginou que eu quis denegrir B.B. King?

          Não pense isso, por favor. Ele é um monstro do blues.  Monstro na guitarra e na interpretação de voz. Os duetos dele com Eric Clapton são clássicos, entraram para a história.

          Só quis lembrar a confusão que se fazia, nos anos 90, quando tocava no rádio a canção do Jota Quest com aquele verso “na madrugada a vitrola rolando um blues, tocando BB King sem parar”, e muita gente confundia com “trocando de biquíni sem parar”.

          Enfim, fui me meter a piadista e acabei tendo que explicar a piada, o que é o fracasso.

           

          1. Fica frio.

            Parece cocaína, mas é só tristeza.

            PS.: não é o J.Quest, é o Grupo Brilho e a música “chiclete” é “Noite do Prazer”.

  1. The Beatles

    While My Guitar Gently Weeps, George Harrison in The Beatles, 1967/70, CD duplo. Não me lembro do nome do disco original. BB King tinha uma canção com nome semelhante? Ou você quis fazer um trocadilho?

  2. Chora, Lucille.

    Significativo que não haja foto de criança negra tocando guitarra, entre as fotos acima. É que os jovens negros americanos de muito tempo pra cá não se interessam mais pelos blues. Gostam de rap, e outras coisas. Com raríssimas exceções, blues é coisa de velhinhos, que vão morrendo como o grande BB King, agora, e o enorme John Lee Hooker, há 15 anos. O blues veio da escravidão, e os jovens não querem saber disso, embora o rhythm’n’blues, o soul, o funk e o rap venham  também do vovozinho. Mas o interessante nas culturas negras é que elas sempre se reinventam, pois quem fica parado é poste. Agora, só resta a Lucille chorar a falta do companheiro. Bye Bye BB!

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=OzGOg5cYW5w%5D

    1. Confesso que busquei.

      Quando busquei uma imagem para o post, digitei “garoto com guitarra”. Coloquei as que encontrei.

      Agora que você chamou me a atenção, voltei a pesquisar especificamente “garoto negro com guitarra”.

      Que coisa, várias imagens de Jimi Hendrix e a foto abaixo:

       

      Fotos não têm som, mas não me parece que estejam tocando blues. 

       

      1. Olha os garotos aqui.

        Sim, esses kids aí tocam rock: punk e metal. E são ótimos! A maioria dos garotos negros é do rap/música eletrônica. Mas tudo isso veio do blues, em alguma medida, e passou por Hendrix.

        No Brasil, algo semelhante ocorreu com o samba: hoje é coisa de brancos, com raras exceções. Se o Carnaval não fosse oficializado no país, haveria poucos negros às voltas com o samba. A garotada negra está no funk, no rap, na música eletrônica, principalmente.

        [video:https://www.youtube.com/watch?v=Kv7xuXdoaWA%5D

        [video:https://www.youtube.com/watch?v=g2M7Frp85Ck%5D

         

         

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