Ao gosto de Cunha, votação da Reforma Política é modificada na Câmara

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Com novo relator, tema será debatido pelo Plenário; deputados criticaram o presidente da Casa de “ditador”, com “vontade imperial” e autor de “golpe”

Reunião do colegiado de líderes para discutir a pauta de votações

Jornal GGN – O primeiro dia marcado para debater a reforma política na Câmara dos Deputados foi de fracasso. A reunião que levaria o polêmico tema para a comissão especial foi cancelada e os líderes partidários decidiram que a reforma será votada pelo Plenário. O saldo foi resultado de divergências internas entre partidos, nas próprias bancadas e, inclusive, entre a Câmara e o Senado. Mas não seria diferente se Cunha não quisesse assim. 
 
“Suspender a sessão 10 minutos antes do início foi uma completa falta de respeito”, lamentou o ex-relator da reforma política, deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), sobre o cancelamento da votação e o fim da comissão especial. 
 
Sequer um relatório foi votado na segunda, por entrar em conflito com pontos de vista defendidos pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Até o próprio colega de Cunha, o então alçado para a função de relator, Marcelo Castro, caraterizou o presidente da Câmara de “autoritário e desrespeitoso”, depois de trocar os últimos quatro meses de discussão por um texto elaborado em cinco minutos.
 
O novo relator, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conduzirá as discussões que retornaram ao ponto de partida.
 
Além de Castro, deputados de diversos partidos criticaram as mudanças. O petista Henrique Fontana (RS) acusou Cunha de agir de forma ditatorial, de ter cometido um “golpe”. “Foi uma ação autoritária do presidente da Câmara que, de forma imperial, decidiu cancelar os trabalhos da comissão e usar a mão de ferro para impor a vontade dele”, disse Fontana.
 
Chico Alencar (PSOL-RJ) afirmou que prevaleceu “mais uma vez a vontade imperial do presidente Eduardo Cunha”, que teve a comissão “assassinada” e “esfaqueada”, com todo o trabalho “jogado no lixo”. “Jamais vimos uma comissão especial não concluir os seus trabalhos querendo discutir, querendo votar o relatório do Marcelo Castro. Essa votação final era uma obrigação regimental”, criticou.
 
Em resposta, Cunha atacou Fontana, afirmando que o deputado inviabilizou a reforma em legislaturas anteriores. “Ditatorial é colocar um único modelo, como Henrique Fontana foi relator no passado da reforma política e ditatorialmente colocou apenas aquilo que ele entendia que era a reforma. Jamais permitiu que outros modelos fossem votados. A razão pela qual a reforma política não saiu na legislatura passada foi única e exclusivamente culpa de Henrique Fontana”, acusou.
 
O presidente da Câmara disse que a decisão do fim da comissão especial não foi dele, mas dos líderes partidários. “A comissão especial tem uma representatividade que não expressa a proporcionalidade do Plenário, e o objetivo é que tudo seja votado”, afirmou.
 
O tucano Bruno Araújo (PE) comprou a argumentação de Cunha e disse que a maioria dos líderes concordaram com as mudanças. “Há a compreensão majoritária de que, regimentalmente, a não votação na comissão permite mais acordos ao longo do Plenário. Permite alguma chance de pontos negociados artigo a artigo. A votação na comissão levaria a outro tipo de procedimento que deixaria poucas alternativas de negociação no Plenário”, disse.
 
Diante das modificações definidas em cinco minutos de reunião, não ficou claro se outros temas, objeto de outras PECs que foram analisadas pela comissão especial e que tramitam em conjunto, serão discutidos pelo Plenário, e se valerá a regra da obstrução, trancando as demais pautas da Câmara.
 
“Houve o acordo de não haver obstrução velada, mas é óbvio que, pelo tensionamento do debate, haverá votações em que os partidos irão usar instrumentos como destaques para tentar detalhar ao máximo a matéria. Parece pouco provável que, na prática, não haja um processo de votação lenta”, concluiu o líder da Minoria, Bruno Araújo.
 
Por enquanto, o que está definido é que o projeto da reforma política será votado por grupo de artigos, prevalecendo a primeira opção que tiver o voto favorável de 308 deputados, de acordo com os temas, elencados a seguir:
 
1. Sistema eleitoral para eleição de deputados: proporcional com lista; distrital misto; distritão; e distritão misto;
2. Financiamento de campanhas: público e privado extensivo a pessoa jurídica; público e privado restrito a pessoa física; e público;
3. Fim ou não da reeleição;
4. Tempo de mandato de cargos eletivos;
5. Coincidência de mandatos: 2 anos para o próximo ano; 6 anos para o próximo ano; 2 anos para 2020;
6. Cota para as mulheres;
7. Fim das coligações;
8. Cláusula de barreira;
9. Outros temas independentes: voto obrigatório e data da posse presidencial.
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

14 Comentários

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  1. Se o governo tivesse comunicação

    era hora para um porta-voz dar umas alfinetadas no Cunha, afinal a Câmara representa o povo que é contra financiamento privado de campanha e contra o voto-distrital. Mas a Dilma, por se achar muito republicana, vai obrigar todo o executivo a ficar caladinho e deixar nosso novo imperador reinando mais um pouco sem ser perturbado.

  2. Jean Wyllys no Facebook
    Os

    Jean Wyllys no Facebook

    Os desmandos do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, passaram dos limites!

    Estava agendada para agora (a partir das 18h) a sessão da Comissão de Reforma Política que votaria o relatório do deputado Marcelo Castro (PMDB) – este relatório embora não seja aquilo que nós do PSOL e organizações da sociedade civil como OAB, CNBB, MCCE e outras de igual relevância queremos é, contudo, fruto de exaustivas discussões, audiências públicas e oitivas realizadas pela comissão especial ao longo dos últimos meses.

    Eis que, a caminho do plenário onde se realizaria a sessão, sou surpreendido com a informação de que esta fora cancelada por decisão de Eduardo Cunha, que não está contente com o relatório do deputado Marcelo Castro.

    Segundo informações que circulam pelos corredores da Câmara, Cunha reuniu, na residência oficial do presidente, um grupo reduzido de deputados aliados seus e, com estes, decidiu que o relatório de Castro não seria votado na comissão especial, mas, sim, no Plenário da Câmara amanhã. As mesmas informações antecipam que Cunha destituirá Marcelo Castro da função de relator e nomeará Rodrigo Maia (DEM-RJ), seu aliado, o novo relator da matéria em plenário.

    Cunha já tinha humilhado o deputado Marcelo Castro antes em entrevista a O Globo, tratando-o como um qualquer sem condições de produzir o relatório que ele, Cunha, desejava. Castro se calou diante da humilhação.

    Eduardo Cunha deseja a todo custo aprovar o sistema eleitoral batizado aqui de “distritão”, que é o pior dos sistemas possíveis, em vigor apenas no Afeganistão. APENAS NO AFEGANISTÃO! Trata-se de um sistema em que é eleito apenas quem tem dinheiro e popularidade prévia: se aprovado, o parlamento ficará mais cheio de pastores fundamentalistas e comerciantes da fé, empresários ricos, apresentadores de programas sensacionalistas de tevê e rádio e jogadores de futebol do que já está no momento; além disso, se aprovado, qualquer governo terá que lidar com um varejo de deputados defendendo interesses privados que só poderá ser vencido mediante “mensalões” e outros esquemas hoje repudiados pela mídia em suas investidas contra o governo do PT. Já pensaram nesse horror?! Os partidos desaparecerão, as ideologias políticas idem e os movimentos sociais não terão qualquer chance de eleger representantes!

    Ou seja, o que Cunha propõe – com a complacente cobertura de boa parte da mídia de propriedade privada – é uma contra-reforma política que apenas colocará mais raposas (organizações empresariais, banqueiros, especuladores financeiros, porta-vozes das indústrias farmacêutica, automobilística, de bebidas e armamentista e do agronegócio, empreiteiras e construtoras) livres no galinheiro.

    https://m.facebook.com/jean.wyllys/posts/890422891005719

    1. Ele é dono do Congresso

      Ele é dono do Congresso..,.,…os demais deputados são a ele suboordinado e se tremem de medo do títere.,..ai vc tem o Gilmar Dantas na outra ponta segurando um processo para o comparsa aprovar a reforma politica e continuar recebendo financiamento das empresas que o abastecem e vice-versa…

      1. Sim. Todos sabem o que o

        Sim. Todos sabem o que o Cunha fez no verão passado. As coisas só não saem da gaveta porque existe um conluio, um jogo de cena hipócrita entre imprensa e oposição para enganar os teleguados. Está funcionando.

        Ele, Cunha, é um arrecadador desde os tempos de PC Farias…. Financiou campanhas de deputados de outros Estados e de outros partidos, inclusive…

        É uma informação relevante identificar quem vai demonstrar no voto lealdade a ele, Cunha.

        É claro que ele(s) está(o) empurrando tudo para o Senado e, depois, para um possível veto da Presidência. O tempo é fator fundamental.

        Enquanto isso a imprensa e a oposição fazem a guerra de comunicação para desgastar mais e mais esse governo mudo…

         

  3. As atitudes de Eduardo Cunha

    Nassif, você que é um jornalista sério e experimentado, que “destino” vislumbra para Eduardo Cunha? Até quando teremos de aguentar esse sujeito na presidência da Câmara? Ou só a morte poderá removê-lo? Pena que nunca peguei uma arma nas mãos e, em um mês, completarei 73 anos de idade. Velha demais para tornar-me assassina. Não é que esteja incentivando seu assassinato, mas que Eduardo Cunha está extrapolando todos os limites, ah, isso está.

    1. É uma opção

      Mas também não tenho mais idade para essas aventuras, mas quem sabe alguém compre essa ideia. Mas a outra possibilidade – que é a melhor, é a dupla Janot/Zavascki processa-lo, julga-lo, e ele perder o mandato.

  4. Inadiável

    A Reforma política é inadiável. Com o voto distrital (misto) as campanhas políticas ficarão muitíssimo mais baratas.

    O que não se percebe é que o custo das campanhas políticas quem paga somos nós. Pior, é o custo Brasil, que nos obriga a ter uma das maiores cargas tributárias do planeta.

    Cada deputado para ser eleito precisa de oito milhões para financiar sua campanha, no mínimo. E tem muitos candidatos que nem são eleitos, dinheiro que é investido (desperdiçado) neles, e o país é quem paga.

    Com o voto distrital, cada partido teria um unico candidato, as perdas seriam muito menores. Menos gastos para os financiadores de campanha, menos gastos para os partidos, menos gastos para o país, que de economia em economia ficaria mais longe de um ajuste fiscal. Ajuste fiscal que é a guilhotina dos nossos empregos, dos seus empregos também.

    Partidos nanicos seriam incentivados a crescerem, ou sumirem. Partidos como o PSOL por ezemplo, por que existem há tanto tempo e não crescem? O voto distrital daria uma decisão nestes casos.

    O que a esquerda deveria estar lutando, não é contra o que é inevitável, e sim estar tentando encaixar o voto distrital misto no sistema, para que mativesse algo de pluralidade. Ser sonhático nestas horas não resolve. Vão-se os anéis mas ficam os dedos.

    Ou então, para aqueles que são contra o voto distrital (misto)  deixem como está, e de ajuste em ajuste o país quebrará e veremos a oposição assumir competamente o poder nas próximas eleições, aí provavelmente farão reformas muito piores do que esta.  Acho que não é isto que queremos.

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