Faixa de Gaza dividida, 4 mil crianças mortas e ONU enfraquecida: um mês do genocídio palestino

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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O governo israelense descartou um cessar-fogo, posição também mantida por Washington, alegando que um armistício poderia ajudar o Hamas

Protestos em todo o mundo pedem o fim do genocídio contra o povo palestino. Agência IPS

Um mês após o início da resposta de Israel aos ataques do Hamas, no último dia 7 de outubro, que vitimaram ao menos 1400 israelenses, as Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) continuam as suas atividades terrestres na Faixa de Gaza, na Palestina, e afirmam ter dividido o território do enclave palestino em duas partes e cercado a cidade de Gaza. 

Cerca de 370 palestinos são mortos todos os dias desde então, uma rotina sanguinária que se tornou consenso dizer que extrapola qualquer direito de defesa, a não ser para Israel e os Estados Unidos, e parcela da mídia Ocidental, o que tem gerado reações e protestos por todo o mundo.

Ao mesmo tempo, nesta segunda-feira (6), os chefes de 18 agências da Organização das Nações Unidas (ONU) apelaram para um cessar-fogo imediato da ofensiva de Israel à Faixa de Gaza, na Palestina, que já deixou mais de 10 mil mortos desde o início da atual escalada – sendo 4 mil crianças.

Cidades da Faixa de Gaza, sobretudo Gaza, foram convertidas em escombros. Centenas de pessoas seguem, vivas ou mortas, esperando por resgate. A população vive em emergência humanitária sem água potável e comida, convivendo com bombardeios incessantes e agora a presença de exércitos de ocupação.

A escritora palestina Heba Abu Nada, de 32 anos, morreu durante um ataque em Khan Yunis, na Faixa de Gaza, no dia 20 de outubro: mais do que militantes do Hamas, as IDF reduzem diariamente um povo a que as autoridades de Israel se referem como “selvagens”.

“Toda uma população está sitiada e atacada, sem acesso ao essencial para sobreviver, bombardeada nas suas casas, abrigos, hospitais e locais de culto”, disse a carta assinada pelos chefes da ONU. “Já se passaram 30 dias. Já chega. Isso deve parar agora”, apelam.

O Conselho de Segurança da ONU, presidido pelo Brasil durante o mês de outubro, depois de inúmeras sessões especiais e propostas de resolução de cessar-fogo não conseguiu aprovar nem uma, sendo que a proposta apresentada pelo Brasil foi a que mais se aproximou de ser oficializada, mas acabou vetada pelos Estados Unidos, que é contra o fim do massacre.

Para analistas internacionais, as Nações Unidas não passaram no teste de fogo e sofrem com a ingerência de países, o que demonstra a necessidade de ser reformada com o fim do pode de veto, por exemplo. Difícil com a ONU, pior sem ela, opinou o presidente Luís Inácio Lula da Silva, líder mundial que há alguns anos pede uma reforma na entidade máxima da diplomacia global.

Documentos revelaram que Israel chegou a propor o deslocamento de 2 milhões de palestinos para o Monte Sinai, localizado no Egito, liberando assim mais milhares de quilômetros de terra Palestina na Faixa de Gaza para a fome colonizadora da extrema direita israelense. Todavia, o Egito se colocou contra e a proposta desastrosa não foi adiante.

O episódio prova que para o governo de Israel, o Hamas se tornou uma boa desculpa para um projeto ainda mais ambicioso de varrer da região os palestinos.

Bombardeios não visam só o Hamas

Campos de refugiados, hospitais, comboios médicos e até ambulâncias foram bombardeados por Israel com a desculpa do “direito de defesa” e de que “terroristas usam civis como escudos”, sendo este “o preço da guerra”.

No entanto, a comunidade internacional tem cada vez mais visto a “defesa” israelense como um sanguinário processo de genocídio do povo palestino e uma desculpa para colonos invasores de terras palestinas expandirem seus domínios não apenas na região da Faixa de Gaza, como também na Cisjordânia.

Por outro lado, o Hamas mantém como reféns mais de 200 israelenses. O curioso é que nem mesmo com os reféns a opinião pública dentro de Israel tem apoiado as barbaridades cometidas pelo governo de extrema direita na Faixa de Gaza.

De acordo com pesquisa divulgada pelo jornal The New York Times no último dia 27 de outubro, a confiança da população de Israel no governo caiu para o nível mais baixo dos últimos 20 anos. Em particular, apenas 20,5% dos judeus israelitas e 7,5% dos árabes que vivem no país confiam na gestão liderada pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.

Vídeos circulam nas redes sociais mostrando a polícia israelense coibindo de forma agressiva protestos contra o governo e o massacre a civis palestinos praticados pelas IDF. Inclusive judeus ortodoxos que se opõem a Netanyahu têm sido alvos de violência policial durante protestos pacíficos.

Cessar-fogo descartado

O governo Netanyahu segue descartando um cessar-fogo. Esta posição é também partilhada pelos Estados Unidos, cujo Secretário de Estado, Antony Blinken, destacou que uma eventual cessação das hostilidades poderia ajudar o Hamas a recuperar e reagrupar as suas forças.

Do total de vítimas neste mês de genocídio, 4 mil são crianças e outras 2.550 mulheres. Da mesma forma, dezenas de milhares de palestinos ficaram feridos em consequência dos bombardeios.

Segundo a ONU, um total de 451 caminhões com carregamentos humanitários entraram em Gaza desde 21 de Outubro, pela Passagem de Rafa, no Egito, que voltou a ser fechada neste final de semana para a saída de refugiados.

Para a ONU, há indícios de crimes de guerra cometidos por Israel e também os que apontam para crime de genocídio, dada as características generalizadas da matança israelense longe de justificar defesa ou quaisquer cuidados com a população civil. Gaza e outras cidades foram convertidas em escombros.

Dez dias após o início das hostilidades, a ONU confirmou que a força aérea do exército de ocupação israelense continuou a atacar o sul da Faixa de Gaza, exatamente para onde estão se dirigindo os refugiados que escapam das incursões anteriores de Tel Aviv.

Blinken no Oriente Médio

Durante esta segunda-feira (6), o chefe da diplomacia da Casa Branca teve um encontro em Ancara com o seu homólogo turco, Hakan Fidan, para abordar a atual escalada palestino-israelense.

A visita foi marcada por diversas manifestações no interior da Turquia, incluindo um protesto perto da base aérea norte-americana de Incirlik, que terminou com a intervenção de unidades da polícia de choque.

Nos dias anteriores, Blinken manteve reuniões com os líderes de Israel, Jordânia, Iraque e Cisjordânia, onde conversou com o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas. 

Entre outras questões, o diplomata reiterou o compromisso de Washington em fornecer apoio humanitário a Gaza, bem como em trabalhar para a criação de um Estado palestino.

Uma criança morre a cada 10 minutos

Entretanto, segundo dados da Agência das Nações Unidas para os Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA), em média a cada 10 minutos uma criança morre e dois menores ficam feridos durante a guerra.

Entre os que condenam os ataques judaicos a Gaza, a Ajuda Médica para os Palestinos (MAP, na sigla em inglês), uma organização sem fins lucrativos com sede em Londres, confirma que que o número de mortes no enclave palestino ultrapassou os 10 mil em quase um mês. 

Autoridades de Israel questionam os números, mas para o MAP os números são reais e não chegam a surpreender diante do “bombardeio indiscriminado de Israel contra casas, hospitais, campos de refugiados e escolas”.

Líbano e o Hezbollah

Uma das preocupações vigentes é de uma escalada regional do conflito passando a envolver o Líbano e um de seus principais movimentos, o Hezbollah, acusado por Israel e os Estados Unidos de armar, treinar e financiar o Hamas. O grupo libanês nega as acusações. Escaramuças ocorrem no sul do Líbano desde o último dia 7 de outubro, com Israel e o Hezbollah trocando ataques.

Neste domingo (5) das Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) atacaram veículos não militares no sul do Líbano e mataram quatro civis. O primeiro-ministro do país árabe, Najib Mikati, declarou que se trata de “um crime hediondo” que “não ficará impune”.

O líder do Hezbollah, Sayyed Hasan Nasrallah, por sua vez, concedeu nesta sexta-feira (3) o seu primeiro discurso após quase um mês do início dos bombardeios, cerco e invasão da Faixa de Gaza e Cisjordânia, na Palestina, por Israel, ato contínuo e em resposta ao ataque terrorista do grupo Hamas, no último dia 7 de outubro.

Milhares de pessoas reuniram-se na capital do Líbano, Beirute, para ouvir o discurso bastante aguardado. Nasrallah exigiu “isolar Israel de tudo”, ao mesmo tempo que apelou aos árabes para pararem de fornecer petróleo ao país.

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Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

1 Comentário

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  1. O Netanyahu e o Biden, entre outros Warmongers, seriam contra ou a favor do cessar-fogo, caso tivessem entes queridos entre os reféns capturados pelo Hamas?

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