Mário de Andrade, um poeta futurista

Mário de Andrade, foto de Gilda de Moraes Rocha

Por Tamára Baranov – Rio Claro/SP

“Quando eu morrer quero ficar, não contem aos meus inimigos, sepultado em minha cidade, saudade. Meus pés enterrem na rua Aurora, no Paiçandu deixem meu sexo, na Lopes Chaves a cabeça esqueçam. No Pátio do Colégio afundem o meu coração paulistano: um coração vivo e um defunto bem juntos. Escondam no Correio o ouvido direito, o esquerdo nos Telégrafos, quero saber da vida alheia, sereia. O nariz guardem nos rosais, a língua no alto do Ipiranga para cantar a liberdade. Saudade…Os olhos lá no Jaraguá assistirão ao que há de vir, o joelho na Universidade, saudade…As mãos atirem por aí, que desvivam como viveram, as tripas atirem pro Diabo, que o espírito será de Deus. Adeus.”

Mário de Andrade (Mário Raul de Morais Andrade)
(São Paulo, 09 de outubro de 1893 – São Paulo, 25 de fevereiro de 1945)

De família rica e aristocrática, Mário de Andrade foi professor no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo. Na literatura começou escrevendo para jornais e revistas. Para Oswald de Andrade, depois de ler os originais de ‘Paulicéia Desvairada’, Mário era um poeta futurista. Junto com Oswald e outros intelectuais, Mário ajudou a preparar a Semana da Arte Moderna. ‘Amar, Verbo Intransitivo’, o seu primeiro romance, desmascara a hipocrisia da família paulistana. Em ‘Clã do Jabuti’ mostra a importância da pesquisa do folclore brasileiro que atinge o ponto alto em ‘Macunaíma’ onde recria mitos e lendas indígenas. Na música, seu ‘Ensaio Sobre a Música Brasileira’ influenciou vários artistas.

Mário produziu romances, poesia, contos, ensaios, crônicas e ainda arranjava tempo para escrever cartas e se correspondeu com muitos. E por meio dessas cartas influenciou poderosamente vários artistas, nas mais variadas áreas. Nas cartas que escrevia assumia o papel de professor. Na literatura, trocou cartas com os poetas Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Oswald de Andrade e Cecília Meirelles. Na música, com Villa-Lobos, Camargo Guarnieri, Francisco Mignone, Souza Lima. Na pintura, com Anita Malfatti, Lasar Segall, Tarsila do Amaral. Depois de sua morte, muitos dos que se corresponderam com ele publicaram as cartas recebidas. Já as cartas que recebeu foram arquivadas em pastas e guardadas num cofre no Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo e, em seu testamento, determinou que elas só poderiam ser abertas no ano do cinquentenário da sua morte.

Reza uma velha fofoca modernista que Anita Malfatti tentou seduzir Mário de Andrade. Anita escreveu-lhe uma carta falando claramente no assunto e não obteve resposta. Na correspondência de Anita Malfatti não foi possível encontrar a tal carta. Mas há outra, em que a pintora se desculpa e pede para que Mário rasgue a carta, por cavalheirismo. O escritor, ao que tudo indica, foi cavalheiro, pois não há sinal da carta apaixonada.

Apenas 50 anos após a morte do escritor a questão da sua sexualidade foi abordada em livro por Moacir Werneck de Castro, revelando que na sua roda de amigos não se suspeitava que Mário fosse homossexual, e assim que fosse casto ou que tivesse amores secretos. Somente, o seu amigo António Cândido falou diretamente sobre assunto: ‘O Mário de Andrade era um caso muito complicado, era um bissexual, provavelmente’. O episódio do rompimento de relações com Oswald de Andrade é hoje largamente citado: Oswald ironizou que Mário se ‘parecia com Oscar Wilde’ e referia-se a ele como ‘Miss São Paulo’. No entanto, persiste fortemente nos meios acadêmicos um silêncio sepulcral sobre o assunto. ( Fonte: Wikipédia)

http://www.youtube.com/watch?v=NNuWzcDoK1Q align:center]

[video:http://www.youtube.com/watch?v=p6-sL4y0dAY align:center

Redação

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  1. “Inspiração” e “Paisagem nº 1”, por Mário Andrade
    [video:http://www.youtube.com/watch?v=8tKb5LAetT4%5D    

    Inspiração *

     

     

    “Onde até na força do verão havia

    tempestades de ventos e frios de

    crudelíssimo inverno.”

    Fr. Luís de Sousa 1

     

    São Paulo! comoção de minha vida…

    Os meus amores são flores feitas de original!…

    Arlequinal!… Traje de losangos… Cinza e ouro…

    Luz e bruma… Forno e inverno morno…

    Elegâncias sutis sem escândalos, sem ciúmes…

    Perfumes de Paris… Arys! 2

    Bofetadas líricas no Trianon…3

     Algodoal!…

     

    São Paulo! comoção de minha vida…

    Galicismo 4  a berrar nos desertos da América!

      

     

    ________________________

     * Poema publicado em Pauliceia desvairada, 1922, e em Poesias, 1941.

     

     

          [video:http://youtu.be/tVydGfMZ71g%5D  

    Paisagem nº 1 **

     

    Minha Londres das neblinas finas!

    Pleno verão. Os dez mil milhões de rosas paulistanas.

    Há neve de perfumes no ar.

    Faz frio, muito frio…

    E a ironia das pernas das costureirinhas

    parecidas com bailarinas…

    O vento é como uma navalha

    nas mãos dum espanhol. Arlequinal!…

    Há duas horas queimou sol.

    daqui a duas horas queima sol.

     

    Passa um São Bobo, cantando, sob os plátanos,

    um tralalá… A guarda ‑cívica! Prisão!

    necessidade a prisão

    para que haja civilização?

     

    Meu coração sente ‑se muito triste…

    Enquanto o cinzento das ruas arrepiadas

    dialoga um lamento com o vento…

    Meu coração sente ‑se muito alegre!

    Este friozinho arrebitado

    dá uma vontade de sorrir!

    E sigo. E vou sentindo,

    à inquieta alacridade 14  da invernia,

    como um gosto de lágrimas na boca…

     

     _________________** Poema publicado em Pauliceia desvairada, 1922, e em Poesias, 1941.  

    Notas/Glossário

     

    1. “Onde até na força do verão havia tempestades de ventos e frios de crudelíssimo inverno” Fr. Luís de Sousa: fragmento destacado do capítulo V, da Vida de Arcebispo, obra de Frei Luís de Sousa, cronista português (1555 ‑1632), considerado um dos maiores escritores de língua portuguesa. na carta a Fernando Sabino, em 21 de março de 1942, Mário de Andrade inclui esse título entre as leituras fundamentais para a formação do intelectual.

     

    2. Arys: o texto, ao incorporar marca de perfume feminino do gosto da elite, atende à literatura de circunstância no projeto literário do modernista. Eis o anúncio na revista A Cigarra: “Un JOUR VIEndRA/ Perfume d’Arys o mais luxuoso/ adoptado pelas pessoas elegantes/ o mais captivante e penetrante./ […] ARYS, 3, rue de la Paix, Paris – em todas as perfumarias” (a. 6, no 125. São Paulo, 1o dez. 1919, p. 4).

     

    3. Trianon: restaurante e confeitaria frequentado pela alta burguesia e pela intelectualidade paulistana, no início do decênio de 1920; local de banquetes de homenagem e de encontros amorosos furtivos. no banquete oferecido a Menotti del Picchia, em 9 de janeiro de 1921, Oswald de Andrade ali discursou lançando o modernismo. Mário de Andrade focalizou o acontecimento, em março de 1921, em sua crônica “de São Paulo”, na série homônima na revista carioca Ilustração Brasileira.

     

    4. Galicismo: francesismo.

     

    14. Alacridade: alegria, vivacidade.

     

     

    Fonte: (disponível para download, clique abaixo)

    Andrade, Mário de, SELETA ORGANIZADA POR Telê Ancona Lopez e Tatiana Longo Figueiredo, “São Paulo, comoção de minha vida…”, , Editora UNESP e Imprensa Oficial do Estado: São Paulo, 2012.

    1. Mário de Andrade é estupendo.

      Mário de Andrade é estupendo. Adoro essas notas explicativas, toda leitura deveria tê-las. Estou tentando fazer o download…Obrigada Gilberto. 

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