A hipocrisia sobre as pedaladas, o crime que não houve, por Luís Nassif

Não é preciso detalhar o mundo de negócios escusos que se seguiu ao impeachment, a eleição de um alucinado defensor da tortura.

A absolvição de Dilma Rousseff, Guido Mantega e Luciano Coutinho só serve para duas coisas. A primeira, para desnudar ainda mais o caráter institucional nacional – o sistema que se articula em torno do Supremo Tribunal Federal, Congresso, órgãos de mídia. A segunda para mostrar por quê é impossível uma justiça de transição no país: não se viu nenhum pedido de desculpas dos principais culpados pelo golpe. A Folha ainda tentou justificar a absolvição sob o argumento de que houve uma amenização nos princípios da lei de improbidade.

Um exemplo nítido da hipocrisia nacional. Ontem, a colunista Miriam Leitão escreveu excelente artigo criticando a condescendência de Lula com os militares, fruto de uma justiça de transição jamais aplicada no país. Um dos pilares da justiça de transição é expor todos os crimes cometidos no período, para que não se esqueça, não se repita. Mas nenhum pio sobre o golpe das pedaladas, do qual ela foi uma das principais defensoras.

Nem se venha com o álibi da mudança da lei de improbidade, como colocou a Folha, para explicar a absolvição. Não houve o golpe das pedaladas. O Estado tinha uma conta corrente com bancos públicos. Quando estava superavitário, recebia juros; deficitário, pagava. Houve excesso de endividamento sim, para suprir necessidades do Bolsa Família. Mas a pedalada só ocorre quando não se respeita o princípio da anuidade fiscal – isto é, quando se deixa uma dívida para o ano seguinte. E isso não ocorreu.

Sabiam disso os Ministros do Supremo Tribunal Federal que aprovaram a abertura do processo de impeachment pela Câmara.

Toda a trama teve como acusador principal o procurador do Tribunal de Contas da União, Júlio Marcelo de Oliveira que, dias antes do depoimento na Comissão Processante do Impeachment, testemunhei almoçando com Marcos Lisboa em um restaurante de Brasilia. Lisboa foi um dos principais articuladores da operação, que resultou na fatídica Lei do Teto, uma excrescência que pretendia amarrar o orçamento público por 20 anos. Foi um período tão maluco, que Júlio Marcelo, até então um procurador inexpressivo foi alçado à condição de herói e se chegou ao ápice do ridículo com o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Contas o indicando para o Supremo Tribunal Federal. Durante as sessões do Senado, soube-se que Júlio Marcelo participara do movimento “Vem pra Rampa”, que visava incentivar ministros do TCU a rejeitarem as contas da gestão de Dilma. Terminado o show, voltou a ser o procurador inexpressivo.

A desmoralização na Justiça não ficou nisso. Para o Ministro Luís Roberto Barroso, o impeachment não ocorreu por conta das pedaladas, mas por falta de apoio político. Esqueceu-se de uma das responsabilidades centrais das constituições, presente desde o advento do nazismo, para impedir a repetição desses abusos, é impedir que maiorias eventuais empalmem o poder. Assim como é papel do Supremo ser contra majoritário – isto é, se opor aos movimentos de linchamento criados nas ruas. Para Barroso, ao contrário, o Supremo tinha que se abrir às vozes das ruas.

A rigor, o único Ministro a declarar claramente ser contra o impeachment, por não ver crime de responsabilidade, foi Marco Aurélio de Mello.

Não é preciso detalhar o mundo de negócios escusos que se seguiu ao impeachment, o desmonte de políticas sociais, a desmoralização da democracia, a eleição de um alucinado defensor da tortura. E, nesse período, uma pandemia que vitimou 700 mil pessoas porque, à frente do governo, estava a consequência maior dos atos avalizados pela mídia, pelo Congresso, pelo Supremo, por juristas tido como liberais, como Oscar Vilhena. E com o orçamento público arrebentado pelos exageros de Paulo Guedes, pelo tombo nos precatórios, sem que se ouvisse um pio do herói Julio Marcelo.

Definitivamente, é um país sem caráter.

Luis Nassif

10 Comentários

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  1. “Júlio Marcelo da Costa” é um dos personagens mais encontradiços da História do Brasil, desde sempre. Sequer merece a pecha de oportunista, pois este, na minha visão, é aquele que procura uma oportunidade para se dar bem, e a versão brasileira desse tipo de caráter é aquele que, de repente, vê cair em seu colo a oportunidade. É aquele que presta um serviço inestimável (e, quase sempre, pontual) aos donos do país, os sabujos nativos do Binômio Bancos/Corporações, que, através de seus moleques-de-recados (políticos, no Executivo e Legislativo, e juízes dos tribunais superiores), opera correções de rumo na governança do país, que, como se sabe, vira e mexe cai nas mãos de dementes com estranhas inclinações para por em prática políticas públicas voltadas à distribuição de renda, ou, simplesmente, “desviando” verbas orçamentárias para beneficiar a população. Tanto aqueles que ascendem à ribalta da mídia, como Joaquim Barboza, quanto aqueles que permanecem nas coxias com visibilidade mínima, como Júlio Marcelo da Costa, são utilizados, entregam o serviço para o qual foram comissionados, e somem nos desvãos da História, alguns devidamente abonados, outros nem tanto, embora sempre saiam de cena mais prósperos do que estavam quando nela entraram. Alguns dão azar e caem em desgraça, tendo que assumir as consequências do que fizeram quando estas se tornam funestas a ponto de atingir a imagem (ou o bolso, ou as conveniências – atingir, em suma) dos sabujos nativos acima mencionados, e seus moleques de recado – o Binômio sai sempre incólume, já que nunca se mostra. Esses pequenos peixinhos perdem o benefício do anonimato – e só então descobrem que nunca o tiveram, e a comissão que lhes proporcionou a prosperidade se transforma em risco de vida. Seu sonho de consumo passa a ser o programa de proteção à testemunha.
    No mais, Nassif, a República Federativa da Hipocrisia segue em frente, cevando seus donos e exaurindo seu povo. Só o fato do relator do processo das pedaladas ter sido o Anastasia, praticante contumaz (anual, dir-se-ia) das pedaladas, já diz tudo. O parlamentar (de quem, graças a Deus, esqueci o nome) que disse, na cara do Lewandowski, que mesmo que Jesus Cristo descesse ao Congresso e depusesse a favor de Dilma Rousseff, ele não mudaria seu voto – algo que, na minha visão de leigo, contraria frontalmente a própria lógica do julgamento legal, o que deveria arrepiar todos os pelos e cabelos do eminente ministro, que ouviu impassível semelhante barbaridade, afinal, tratava-se, de fato, de um julgamento – também é demonstração cabal, peremptória, impérvia, do caráter dessa cadeia de depravados, que vai da elite sabuja aos seus moleques de recados, passando por todo um universo de classes médias heterogêneas mas totalmente idênticas em sua cupidez e insensibilidade. E o Binômio lá, distante, nadando de braçada, e rindo dessas nossas pequenas lutas intestinas. Impeachment consumado, e eles dão as costas e vão se ocupar de coisa mais importante.
    Definitivamente, é um país sem caráter? É um país em que a ideia de nação está ausente, em que ao povo só resta devorar-se mutuamente, e em que os heróis, além de não possuir nenhum caráter, tem como único objetivo unir-se aos vilões. Um país de cadeias, não de escolas. Bolsonaro, Cid, todos vão passar. Passar o bastão para outros, quero dizer. Prisão ou ostracismo, é a parte que a eles cabe desse latifúndio. Às vezes, no segundo caso, abonados. No primeiro, uma eventual e logo abafada queima de arquivo. Ficam só os sabujos nativos do Binômio, e seus moleques-de-recados, versão moderna da hereditariedade monárquica. De pai para filho, sobrinhos e netos incluídos. Sempre sequiosos e atentos para agradar seus donos.

  2. O veredito é romântico, não diz nada de prático, de mundo real. O Brasil é tão sem caráter quanto qualquer outro país do mundo. Países não cabem no mérito dos julgamentos individuais. Ler os livros de Balzac é aprender sobre a vasta corrupção da França no reinado de Luis Filipe, 1830-1848. Leis aprovadas na Assembléia Nacional mediante pagamento, juizes à venda, sentenças compradas, políticos tão corruptos que se podia comprá-los por dúzias. A Terceira República francesa, o regime que existiu entre 1871 e 1940, tinha um nível de venalidade e corrupção absolutamente escandaloso, o que ficou claro no Caso Dreyfuss, quando o exército se avacalhou por completo. A Quarta República desabou em 1958, porque sozinha não parava mais de pé, tamanho o nível de ineficácia política. Dilma Rousseff caiu porque era uma péssima política e seu governo provocou a maior recessão da história do Brasil, desde a Grande Depressão de 1930. Se Gilmar Mendes não tivesse impedido a posse do Lula como ministro-chefe da Casa Civil, com certeza não teria acontecido o impeachment, o que até Michel Temer reconheceu, mas só isso, porque o segundo governo Dilma já era um cadáver apodrecendo.

  3. Penso que a justiça é a principal culpada pela existência de constantes picaretas e oportunistas da lei, que se multiplicam e se diversificam por todos os segmentos do país.

    Sem contar com a banda podre e traiçoeira, que certamente se infiltra no poder judiciário, como também o faz em todas as esferas da vida pública e privada, ainda na parte boa e ética do judiciário existem muitas falhas, receios e adesões a um corporativismo danoso, viral e muito mais criminoso, que vergonhoso.

    Voltando ao ponto, eu entendo que quando tentam tirar proveito das brechas que identificaram na interpretação da lei, que lhes interessam distorcer o sentido, o fazem contando, no mínimo, com a mente preguiçosa de algumas competentes cabeças do judiciário,

    Impossível de imaginar que nenhuma das competentes e catedráticas cabeças existentes no universo do poder judiciário brasileiro, não tenha percebido a imensa distorção que se fazia na matéria prima do produto, que eles tão bem conhecem e dominam.

    Pode ser muito mais que apenas mentes preguiçosas, mas essa é uma possibilidade que só a instituição poderá decidir se quer ou não, internamente, se debruçar sobre esse vespeiro curador e restaurador.

    Porém, externamente, o Poder Judiciário precisa dar um basta, de um vez por todas, e criar e promover uma revisão geral, minuciosa e totalmente transparente e participativa, que tenha a colaboração ampla da sociedade e principalmente da comunidade jurídica brasileira, para identificar todas as redações que possam dar margens a outras no interpretações, sobre aquela lei, e criar todos os meios que ela não permita qualquer tentativa de distorção, de falsa interpretação ou que se consuma em um crime contra de responsabilidade a parte inocente, como foi feito com Dilma, com Jango, com Lula, com os irmãos Naves, com
    Luiz Carlos Cancellier Olivo, entre outros casos.

    Obs: Mais alguns exemplos, que mostram que a justiça brasileira continua comprando laranja madura nas beiras de estradas e nas redações midiáticas:

    https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&opi=89978449&url=https://claudiaseixas.adv.br/a-mascara-dos-numeros-e-a-face-da-falsa-justica-midiatica/&ved=2ahUKEwjXoLSK5PKAAxXQq5UCHVTOAwI4ChAWegQICRAB&usg=AOvVaw3QlMLc1g5GtIAEsOefKgJu
    https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&opi=89978449&url=https://www.metropoles.com/brasil/um-terror-inocentes-sao-presos-apos-erros-judiciais-em-goias%3Famp&ved=2ahUKEwjXoLSK5PKAAxXQq5UCHVTOAwI4ChAWegQIBxAB&usg=AOvVaw2llMnqOvVfc0jISiTYOyE9

    https://youtu.be/HcJFVt1bHwo

  4. Sim, somos um país sem caráter. Embora o STF tenha recomposto a justiça na condenação
    de Lula, na condenação política realizada pelo ex-juiz e pelos tribunais federais do
    Paraná, o famigerado TRF4. Que não foram punidos por fazer uso político, o tal do
    Lawfare, usando a toga.
    Isso levou a um colapso do país, com miséria, fome, pobre nos lixos, endividamento
    público e venda de jóias da nação como as melhores estatais do país. Foi um saque
    de ladrões após tomarem o poder.
    Não venderam apenas presentes em ouro e diamantes, venderem estatais bem mais caras
    ao país. E mentem absurdamente. Todos.

  5. TEXTO NASSIF LAVOU MINHA ALMA, POIS EU TENHO CARÁTER E SOU UM CIDADÃO BRASILEIRO ESQUERDISTA, ATIVISTA E DE OPINIÃO ABERTA E CLARA. FOI GOLPE E DILMA FOI MENOSPREZADA ATÉ DENTRO DO PT, PARTIDO DELA, DO LULA, MEU E DE MILHARES DE BRASILEIROS E BRASILEIRAS.

  6. O objetivo dos golpistas em 2016 nunca foi aplicar o rigor da Lei ou reforçar o sistema constitucional. O que eles queriam (muitos deles ainda querem) era tirar a maioria da população da arena política criando uma imensa classe de subcidadão sem qualquer poder político. A única democracia que aqueles vagabundos no parlamento, na imprensa, nas igrejas evangélicas, nas Forças Armadas e no judiciário reconhecem é a do dinheiro. Eles sonham com um país comandado por 2% da população benefício de 10% da população. Todos os demais seriam tratados como sub-humanos. Isso explica inclusive o genocídio pandenico e a maneira asquerosa como ele foi legitimado pelo sistema de justiça e sepultado pela mídia (que aliás já está dando indícios que pretende salvar Bolsonaro para que ele possa disputar a próxima eleição ou ajudar a eleger um presidente tão ou mais bestial do que ele mesmo).

  7. O impeachment contra D. Rousseff, baseado em falsas acusações, representa a reação das beurocracias oligárquicas contra quaisquer passos em direção a uma democracia real e ao progresso social.
    O objectivo era aumentar a concentração de renda, o poder dos poucos, a pobreza da maioria e uma democracia fictícia (na verdade um regime escravagista e racista), na qual qualquer política progressista é bloqueada, bem como qualquer desenvolvimento industrial. O arcabouco fiscal, entre outros, é hoje um instrumento eficaz para manter um elevado indice de Gini e a intocabilidade dos poderosos e nao eleitos.
    O teatro coreográfico dos incompetentes propagandistas das verdaideras e mais sofisticadas fake news, da Globo à Folha, como parte da estratégia de escravização, tem sido patético como sempre.
    Por último, mas não menos importante, os honrados membros do Congresso en radiodifusão mundial, durante a votação prejudicial do impeachment, pareciam ser uma espécie de membros colonizados de um hospício.
    A ironia da história é que o sucessor aparentemente fascista iniciou uma guerra contra poderosos burocratas da oligarquia, em nome do populismo indígeno e por isso também teve de ser removido.

  8. Dilma, nao caiu pelas pedaladas.
    Derubaram Dilma, pelas sobrevivencia, com Dilma no poder a engenharia pesada foi destruida, a mectron, os estaleiros…e que Dilma nao fez nada….
    Quando a lava jato chegou a agricultura e bancos retiraram ela, por sobrevivencia.

    Nao existiria lava jato e a destruida da economia sem Dilma.

    Dilma aprovou todas as leis mas sem noçao. Como bem falava o andre motta araujo.

    Dilma nao envocou com governo americano o contrata que deixava a empresa estatal fora de processo ao contrario deixou tudo solto, nao moveu uma palha,
    Chegou ao absurdo de deixar rodrigo janot solto, fechando parceria com o governo americano, totalmente ilegal,
    Dilma ficou vendo tudo ser destruida. Mas o poder real tirou ela num ato de despreço inventou uma coisa qualquer.

    Presidente Dilma, nao fez o que manda um Presidente, ou seja defender suas empresa e trabalhadores, ao contrario ficou do alto da montanha.

    Deu no que Deu, tiraram ela o lula..o resto ‘ e historia.

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