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A volta da Política (com P maiúsculo), por Fernanda Feil

A eleição do presidente Lula e a magnífica festa da posse (obrigada, Janja!) fortaleceram a imagem da democracia brasileira.  

Foto: Ricardo Stuckert

Blog: Democracia e Economia  – Desenvolvimento, Finanças e Política

A volta da Política (com P maiúsculo)

por Fernanda Feil

O presidente Lula tomou posse no dia primeiro de janeiro em uma festa particularmente relevante para a democracia. Não somente conseguiu vencer o golpismo reacionário e negacionista do antigo presidente, como recuperou a auto estima de um país que sofrera duros golpes institucionais, políticos e econômicos desde a segunda eleição da presidenta Dilma Rousseff, quando o PSDB decidiu questionar os resultados das urnas. O sucedido todos conhecemos: um golpe transvestido de impeachment, seguido pela maior recessão que o Brasil já enfrentou no pós guerra, a eleição de um extremista de direita e a pior conduta de um país frente aos novos desafios globais – nominalmente a Covid-19 e a crise climática.

A eleição do presidente Lula e a magnífica festa da posse (obrigada, Janja!) fortaleceram a imagem da democracia brasileira.  Passados o momento de júbilo inicial, merecido e necessário, devemos, no entanto, nos voltarmos para os enormes desafios que o novo governo enfrentará. Não me refiro aqui “somente” aos 33,1 milhões de pessoas passando fome no Brasil (apenas quatro entre 10 famílias no Brasil tem acesso pleno à alimentação, de acordo com dados da Oxfam); nem ao enorme endividamento das famílias, que atingiu 78,9% em dezembro (Agência ABCBrasil), dados que mostram a situação catastrófica que assola a população brasileira. Tampouco me refiro aos rombos das contas públicas no qual o saca trapo Paulo Guedes deixou o país, em uma situação de catástrofe total, sem orçamento para garantir a manutenção da máquina pública – quiçá o cumprimento dos compromissos constitucionais.

Ainda que esses sejam motivos suficientes para tornar desafiador o início de qualquer governo, os desafios do governo Lula e seu quadro de ministros e ministras serão muito maiores. A crise institucional, que se desenvolve enfraquecendo as instituições republicanas desde o impeachment da presidenta Rousseff atingiu limites sem precedentes. A reconstrução do país passará por todas as áreas do novo governo – não à toa, a equipe de transição por vezes se referiu ao legado do ex-presidente como “terra arrasada”. A reconstrução de importantes ministérios, que haviam sido extintos ou incorporados a outros – como o Planejamento e Orçamento, Fazenda, Desenvolvimento, Esportes, Cultura – e a criação de outros – como dos povos indígenas, gestão e inovação, entre outros – por si só é uma excelente iniciativa que já direciona o governo para o caminho certo – o de reconstrução.

O Brasil precisa ser reconstruído e os órgãos do Estado precisam estar à altura do desafio. O plano de ação do governo está sendo acordado, as propostas estão sendo levantadas e analisadas por um corpo político da melhor categoria, apoiado por um corpo técnico altamente gabaritado, comprometido com os ideais democráticos e desejoso de mudanças para promover o crescimento com igualdade social e compromisso ambiental.

Em meio a tantos desafios, uma semana após a festa da democracia, ocorreu uma tentativa torpe de golpe de Estado. Terroristas revestidos de patriotas invadiram as casas dos três poderes da república e fizeram na prática o que o antigo presidente tentou fazer por quatro anos: tentaram destruir os símbolos da república, os símbolos da democracia. Foi um ataque covarde, sem sombra de dúvidas. Mas foi também um ataque orquestrado por um grupo de pessoas vivendo em um transe coletivo – uma catarse paranoica. E mais grave – foi um ataque que teve apoio das forças armadas, apoio do secretário de segurança do Distrito Federal – o Bolsonarista Anderson Torres, que no dia estava em viagem aos Estados Unidos. O resultado foram repórteres feridos, um policial machucado, a destruição de importantes obras de arte que fazem parte da história do país, cujo valor é incalculável, a depredação dos prédios dos três poderes do Brasil – STF, Palácio do Planalto e Congresso Nacional.

Foram cenas deploráveis. Não há palavras para descrever a barbárie que foi esse ataque ao Brasil – ataque às instituições públicas. Em épocas obscuras, como a que espero estarmos superando, a política é com frequência demonizada. A leniência de autoridades públicas com posturas pouco republicanas e anti democráticas ao longo dos últimos quatro anos não pode continuar.

Nesse sentido, o governo do presidente Lula começou muito bem. Atores chaves, políticos influentes, representam a frente ampla e democrática que se formou em volta do presidente Lula para derrotar o obscurantismo e as forças anti-democráticas. A intervenção federal no Distrito Federal foi uma medida correta. O apoio de todos os governadores, do Congresso Nacional e do judiciário é um importante gesto que fortalece o Estado Democrático de Direito.

Essa união representa a necessidade de reconstrução da política pública, do Estado enquanto formulador de política pública e indutor do processo de desenvolvimento, agora sustentável.

Espera-se muito do novo governo, espera-se muito do presidente Lula. Espera-se muito de cada um dos ministros e ministras escolhidos. Mas tenho a convicção que, de forma geral, começamos bem preparados para a reconstrução do país e para consolidar os valores democráticos. Que os ventos da mudança sigam soprando a favor da democracia brasileira, pois só através do reconhecimento de nossa diversidade cultural e racial, do respeito aos valores humanitários o país poderá voltar a crescer e ser exemplo para o mundo por sua capacidade de combater a desigualdade social e proteger o meio ambiente. 

Fernanda Feil – economista, pesquisadora de Pós Doc da UFF e do Finde

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O Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE) congrega pesquisadores de universidades e de outras instituições de pesquisa e ensino, interessados em discutir questões acadêmicas relacionadas ao avanço do processo de financeirização e seus impactos sobre o desenvolvimento socioeconômico das economias modernas. Twitter: @Finde_UFF

Grupo de Estudos de Economia e Política (GEEP) do IESP/UERJ é formado por cientistas políticos e economistas. O grupo objetiva estimular o diálogo e interação entre Economia e Política, tanto na formulação teórica quanto na análise da realidade do Brasil e de outros países. Twitter: @Geep_iesp

O Núcleo de Estudos em Economia e Sociedade Brasileira (NEB) desenvolve estudos e pesquisas sobre economia brasileira, em seus diversos aspectos (histórico, político, macroeconômico, setorial, regional e internacional), sob a perspectiva da heterodoxia. O NEB compreende como heterodoxas as abordagens que rejeitam a hipótese segundo a qual o livre mercado proporciona a melhor forma possível de organização da economia e da sociedade.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].

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