Salvio Kotter
Salvio Kotter passou por formações bem variadas, como Administração de Empresas, Música Erudita, Grego Antigo e Latim. Publicou vários livros, de ficção e não-ficção e é editor da Kotter Editorial, especializada em literatura, filosofia e política.
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Ou o Brasil enfrenta o dilema militar, ou o dilema militar inviabiliza o Brasil, por Salvio Kotter

A profissionalização das Forças Armadas não é suficiente para mantê-las distantes de intervenções políticas, isso é uma preocupação

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Ou o Brasil enfrenta o dilema militar, ou o dilema militar inviabiliza o Brasil

por Salvio Kotter

Importância de Revelar Conspirações

Somos uma República Militar, instituída por um golpe de Estado, um golpe militar. Com isso, as tentativas de golpe e conspirações militares não são fenômenos novos na história brasileira; neste contexto, o processo de exposição é que é vital na construção de uma instituição militar alinhada com os valores democráticos. Revelar essas tramas é fundamental para distinguir os militares comprometidos com a lei e com a democracia e daqueles com tendências golpistas e antidemocráticas. Esse processo de diferenciação é essencial para prevenir a homogeneização dos membros das forças armadas, evitando que o estigma recaia sobre a instituição como um todo, o que representaria um mal a todos nós. Além disso, esta exposição evidenciará a necessidade de mudanças na doutrina militar, de modo a reforçar seu compromisso com a defesa das fronteiras, da democracia e da soberania nacional.

A Iniciativa de Integração de Lula

O expurgo e assassinato dos militares progressistas no arcabouço do golpe de 1964 acabou por criar, ao contrário da tradição militar brasileira de até então, um exército em que a ideologia de direita e extrema direita fosse quase unânime entre os fardados. Durante os primeiros governos Lula, houve um esforço significativo para promover a interação e o entendimento mútuo entre militares e civis. Através de cursos sobre direito internacional e conflitos armados, os militares receberam uma formação que transcendeu a instrução tradicional, oferecendo a eles uma perspectiva humana e estratégica muito mais abrangente. Esses cursos representaram uma oportunidade para que as Forças Armadas compreendessem e se adaptassem ao novo e complexo contexto global. Contudo, o sucesso inicial desse tipo de programa educacional perdeu impulso e restou abandonado ­– um reflexo das constantes mudanças de prioridades políticas e da falta de uma estratégia de longo prazo para a integração das Forças Armadas com a sociedade civil.

Profissionalização Não É Suficiente

A constatação de que a profissionalização das Forças Armadas por si só não é suficiente para mantê-las distantes de intervenções políticas é uma preocupação válida. A experiência dos governos do PT, em que ocorreu um investimento significativo na profissionalização militar, demonstrou que sem alterações na doutrina e na formação dos oficiais, as Forças Armadas podem persistir em comportamentos não alinhados com os ideais libertários e democráticos. Essa persistência sugere que a profissionalização deve ser acompanhada por uma reforma mais abrangente na cultura militar, incluindo sua doutrina e educação, a fim de garantir uma separação clara e firme entre as obrigações militares e a política.

Doutrina Militar em Foco

As Forças Armadas necessitam de uma doutrina defensiva que priorize a proteção do território nacional e dos cidadãos que nele vivem. Casos de interferência política por parte de militares erodem a confiança na instituição e desviam o foco de sua missão primária: a defesa nacional. Ao desenvolver uma doutrina centrada na legitimidade democrática e na defesa das liberdades civis, a instituição militar reafirma seu compromisso com o país e com os preceitos da Constituição. Esse caminho é essencial para assegurar que os princípios democráticos sejam a pedra angular da conduta militar.

Reformando a Formação Militar

Alterar a doutrina militar é apenas o início; a transformação deve se estender à formação dos oficiais, que precisa ter seu currículo ampliado. A educação militar deve fomentar uma compreensão aprofundada do papel dos militares em uma democracia, assim como valorizar a importância do Estado de direito e dos direitos humanos. Ao integrar esses princípios no currículo de formação dos oficiais, promove-se uma liderança militar informada, consciente e comprometida com os valores democráticos. Isso culmina em uma força armada que respeita a autonomia das instituições civis e se dedica exclusivamente ao seu papel constitucional de defesa.

Democratização Como Garantia de Estado de Direito

A democratização das Forças Armadas é uma etapa indispensável para assegurar o Estado de direito de qualquer país. É preciso conceber iniciativas que reforcem os vínculos dos militares com os valores democráticos, que respeitem a separação dos poderes e a soberania das decisões políticas pelas vias institucionais. A educação continuada, o debate sobre a ética militar em consonância com a sociedade e o compromisso com a missão defensiva do país são medidas que constroem uma relação saudável e respeitosa entre os militares e os civis, culminando em uma sociedade forte e segura.

Apesar da tentação, demonizar os militares não é solução.

Podem atirar as pedras, só evitem as mais pontudas, por favor.

Sálvio Kotter passou por formações bem variadas, como Administração de Empresas, Música Erudida, Grego Antigo e Latim. Publicou vários livros, de ficção e não-ficção e é editor da Kotter Editorial, especializada em literatura, filosofia e política.

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Salvio Kotter

Salvio Kotter passou por formações bem variadas, como Administração de Empresas, Música Erudita, Grego Antigo e Latim. Publicou vários livros, de ficção e não-ficção e é editor da Kotter Editorial, especializada em literatura, filosofia e política.

5 Comentários

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  1. Uma vez li um artigo de um americano que tinha uma teoria de que os militares americanos não se metiam em política pois estavam sempre ocupados em alguma guerra , México , Civil , 1@ Guerra , 2@ , Coreia , Vietnan , Iraque … devo ter esquecido alguma.
    No intervalo entre as guerras eles estudam a anterior e pensam a próxima.
    Estão sempre ocupados.

    Pode ser uma solução… 🙂

      1. considerando-se o que Nassif sempre fala a respeito dos efeitos disso em figuras como Augusto Heleno, não produziu o efeito esperado. Ademais, a terra arrasada que os EUA produzem mundo afora e o rastro de horrores indelével que o Brasil traçou no Haiti parecem deixar claro que não é uma boa solução.

  2. Militares brasileiros bem preparados existem, como é o caso do almirante Othon, mas são casos excepcionais. E a excepcionalidade denuncia a falência sistêmica na formação desse estrato. Ao menos enquanto não se reestrutura essa formação, seria desejável fazer o que sugere Leandro Fortes: mandar para a reserva os empedernidos que preservam os velhos viciados hábitos, mexer profundamente nas posições de comando aí colocando figuras alinhadas com profissionalismo e com uma visão mais atualizada da posição do Brasil no mundo.

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