A história quando se repete, se repete como farsa: A segunda guerra das vacinas, por Frederico Firmo

O brutal Guedes propõe que não existam verbas carimbadas para a Saúde e Educação, alega que isto permitiria uma melhor administração. Há quem acredite.

A história quando se repete, se repete como farsa: A segunda guerra das vacinas.

por Frederico Firmo

A notícia de uma vacina pelo Butantã declarou uma  nova guerra das vacinas. Após o anúncio do Butantã, Bolsonaro prontamente mandou seu   Ministro da Ciência e Tecnologia encontrar uma vacina para chamar de sua. Segundo o astronauta a vacina desenvolvida em Ribeirão Preto teria  sido financiada pelo Governo Federal. A Faculdade de Medicina da USP Ribeirão Preto confirmou apenas que “a Versamune está sendo desenvolvida pela FMRP, Farmacore e PDS Biotechnology”.  A notícia dada de forma enviesada, tenta colocar um governo negacionista, que combateu as vacinas, desenvolveu um projeto de Cloroquina como financiador do desenvolvimento da vacina. Os jornais de forma acrítica  colocam como adendo à boa notícia do desenvolvimento de mais uma vacina,  o adjetivo, financiada pelo governo federal. O negacionista Bolsonaro agora tem uma vacina para alimentar sua guerra com  Dória.

Em qualquer um dos casos a  impropriedade da frase é dizer que a pesquisa foi financiada pelo Governo Federal ou Estadual. As pesquisas são financiadas através de verbas de Estado, definida por políticas de Estado e não de Governo. Estas verbas são reservadas constitucionalmente para desenvolvimento da Ciência e Tecnologia. Estas verbas foram reservadas exatamente para não ficarem dependentes de governantes transitórios ávidos por verbas para realização de políticas de governo. Este conceito de verbas de Estado vem sofrendo um ataque constante das administrações federais e estaduais além de  ataques do legislativo. Buscam brechas em legislações ou criam novas leis destruindo as políticas de estado para transformar verbas de saúde, educação e pesquisa em verbas de governo e ou emendas parlamentares. O brutal Guedes propõe que não existam verbas carimbadas para a  Saúde e Educação, alega que isto permitiria uma melhor administração. Há quem acredite.

O brutal Guedes propõe que não existam verbas carimbadas para a  Saúde e Educação, alega que isto permitiria uma melhor administração. Há quem acredite.

O marketing de Dória cria no imaginário popular a imagem de que seu governo investiu muito dinheiro na pesquisa ci

O marketing de Dória cria no imaginário popular a imagem de que seu governo investiu muito dinheiro na pesquisa científica em busca de uma nova vacina. Nada mais errado do que isto.  O Estado Brasileiro vem historicamente investindo em ciência através de instituições de Estado como a FAPESP , CNPq e Capes .

Em recente ato, Dória o agora anti-bolsonarista e portanto supostamente anti-negacionista, encaminhou projeto de lei para expropriar dinheiro das universidades e da FAPESP, Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo. Naquele momento Dória vestia o figurino neo liberal austero  argumentando a favor  do ajuste fiscal e contenção das despesas públicas. Não mencionou que estava violando a constituição do Estado, usando subterfúgios para surrupiar o orçamento definido  pela constituição do Estado para a FAPESP e Universidades. O estabelecimento de percentual constitucional é o que define o fomento a pesquisa e Universidades como políticas de estado e não de governo. Mas no país onde foi dado um golpe com o único objetivo de destruir todas as políticas de Estado, uma das ações prioritárias é incrustar nas leis mecanismos desta destruição. Assim foi com a PEC do orçamento ou com o PL 529/2020 de Dória.

Para isto Dória usou uma excrescência criada no governo neoliberal de FHC na época do Plano real, a DREM, A Desvinculação de Receita de Estados e Municípios. Este  é um mecanismo utilizado para retirar da receita um certo percentual liberando-o completamente para o Governo. Retirado este percentual  o valor da receita diminui assim como  os valores percentuais para Saúde, Educação, FAPESP e outros. O orçamento da Fapesp é 1% da arrecadação da receita tributária do Estado. Com este artifício Dória retiraria  cerca de 450 milhões da FAPESP.  Definitivamente a DREM sob roupagem de austeridade fiscal é um destes mecanismos utilizados para reservar dinheiro para o governo e emendas parlamentares.

Depois de muita luta da comunidade científica, Dória voltou atrás prometendo que não prejudicaria  a FAPESP e prometendo repor as verbas surrupiadas, mas nada ainda é certo.

A pandemia fez de Dória um ardente defensor do uso da ciência. O desenvolvimento da vacina pelo Butantã é o trunfo do momento e caiu como uma bomba em Brasília. O negacionista Bolsonaro se viu obrigado a encontrar em algum lugar do país um centro de pesquisa desenvolvendo vacinas  para chamar de seu.  Este súbito amor pela ciência não resiste à realidade.

Em agosto de 2018 uma previsão sombria indicava que os cortes no orçamento de 2019 podiam implicar em cortes de R$580 milhões para pesquisa. Na ocasião o presidente da SBPC, alertava: Cortes de bolsas Capes afetarão vacinas, energia, agricultura e até a economia.

Em setembro de 2019  uma reportagem no El pais anunciava as intenções do governo de fundir Capes e CNPq. Esta fusão tem potencial de devastar a estrutura de fomento a pesquisa e de criação de pesquisadores. Além de devastar todo o sistema de Pós-Graduação construído. Já na ocasião, pesquisas estavam sendo afetadas por cortes com o não pagamento de bolsas para  pesquisadores, pós-doutorandos, doutorandos, mestrandos etc…

Nesta mesma reportagem um pesquisador alertava que os cortes afetavam pesquisas da área da saúde e que um levantamento da ONU estima que, até 2050, 10 milhões de pessoas no mundo poderão morrer anualmente por conta de doenças resistentes a medicamentos, e a Organização Mundial da Saúde considera este problema uma das dez maiores ameaças à saúde pública mundial.

 Em fevereiro de 2020, as reportagens falavam em cortes de cerca de 7590 bolsas.

Na revista  Época 03/05/2020   a manchete era: Depois da Capes, governo corta bolsas também do CNPq: redução chega a 85% em certas áreas.

O Ministério da Ciência e Tecnologia alterou prioridades para concessão de bolsas de pós-graduação. E estabeleceu como prioridade, áreas de Tecnologia e Inovação, que por sinal jamais foram definidas com clareza. Por exemplo, a troca de prioridades implicou, segundo o presidente da Comissão de Pós-Graduação do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, em uma redução de 85% das bolsas. No mundo de hoje é impensável se fazer pesquisa tecnológica e inovação sem as contribuições da Física, assim como num mundo das redes e tecnologias sociais é impossível se avançar sem os conhecimentos das áreas humanas, como educação, sociologia, geografia , linguística, áreas literárias, artes etc…

Mas a visão do ministro é ou ignorante ou mal-intencionado. Se for a opção ignorante, ele compartilha a visão de senso comum de que pesquisa deve estar ligada diretamente a um produto tecnológico, se possível pronto para a venda. Se mal-intencionado, num país onde a maior parte da indústria é consumidora de tecnologia, o objetivo é transformar as universidades  em prestadoras de serviços e consultorias para empresas privadas. As  mudanças de prioridade deveriam ter sido objeto de um longo debate com a comunidade científica e deveriam, ao menos neste ministério, serem baseadas em estudos aprofundados e muita reflexão. Mas a mudança surgiu da cabeça leviana de alguns que ocupam cargos temporários no Ministério.

 Este Ministro com este histórico de perseguição ao desenvolvimento científico correu,  a mando de Bolsonaro, para encontrar laboratórios que a duras penas  vem desenvolvendo vacinas nas Universidades e Centros de Pesquisa, apesar dos cortes e dos ataques. Encontrou a Faculdade de Medicina da USP de  Ribeirão Preto. Os pesquisadores que desenvolveram a vacina  declararam  que o desenvolvimento poderia estar muito mais adiantado não fora os   cortes e falta de  verbas de pesquisa. Mas isto não incomodou o nobre Ministro que foi rápido ao  se apropriar dos resultados. Tão rápido quanto tão lento na defesa das verbas do seu próprio ministério. O histórico do astronauta não é nada bom.

 O desenvolvimento da vacina tanto do Butantã como de Ribeirão Preto são frutos  de muito tempo de pesquisa e muito conhecimento gerado e desenvolvido  com suporte da CAPES, CNPq e FAPESP. Este conhecimento foi gerado por pesquisadores , professores e centenas de bolsistas  de pós-graduação e graduação que além de se formar deram suas contribuições ao conhecimento.  Isto não foi nem nunca será projeto de um governo, quanto mais de um desgoverno. Ninguém deve se esquecer que o único projeto governamental voltado para a pandemia, foi o projeto de fábricas de Cloroquina.

Redação

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